Grécia começa a retirar refugiados e migrantes da "miséria humana" de Idomeni
Número de chegadas às ilhas gregas desceu de forma significativa nos últimos dias, devido ao acordo entre a União Europeia e a Turquia. Milhares continuam na fronteira com a Macedónia à espera que a fronteira seja reaberta.
As condições de vida degradantes no campo improvisado de Idomeni, na fronteira entre a Grécia e a Macedónia, e o acordo assinado entre a União Europeia e a Turquia começam a deixar centenas de pessoas sem outra alternativa que não seja a de aceitarem um recuo para zonas mais afastadas da porta de entrada em direcção a países como a Alemanha. Nas últimas horas, cerca de 400 migrantes e refugiados aceitaram ser levados para centros de acolhimento noutros pontos da Grécia, mas muitos continuam a jurar que só vão sair dali se for para seguirem na direcção oposta, acreditando ainda que a Macedónia voltará a abrir a sua fronteira.
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As condições de vida degradantes no campo improvisado de Idomeni, na fronteira entre a Grécia e a Macedónia, e o acordo assinado entre a União Europeia e a Turquia começam a deixar centenas de pessoas sem outra alternativa que não seja a de aceitarem um recuo para zonas mais afastadas da porta de entrada em direcção a países como a Alemanha. Nas últimas horas, cerca de 400 migrantes e refugiados aceitaram ser levados para centros de acolhimento noutros pontos da Grécia, mas muitos continuam a jurar que só vão sair dali se for para seguirem na direcção oposta, acreditando ainda que a Macedónia voltará a abrir a sua fronteira.
"Não há nada para fazer aqui. As crianças ficam doentes. A situação é má, há dois dias que faz muito vento e às vezes chove", disse à agência AFP Janger Hassan, de 29 anos, um curdo iraquiano que chegou à fronteira entre a Grécia e a Macedónia há um mês com a mulher e os filhos.
Tal como Hassan, muitos outros sentem que estão num beco sem saída – em Idomeni passam noites em condições deploráveis; à sua frente têm as portas fechadas da Macedónia; e quando olham para trás o melhor que encontram é uma espera de meses ou anos em centros de acolhimento na Grécia, sem poderem recomeçar as suas vidas nos sítios que desejam ou nos países de origem, principalmente os que fugiram à sangrenta guerra na Síria.
Mas, ao contrário de Hassan, muitos outros garantem que não arredam pé de Idomeni, precisamente pelas mesmas razões – se nenhuma solução é aceitável, vão continuar a pedir que a Macedónia reabra a fronteira e os deixe seguir em frente.
Abu Ahmed, de 55 anos, está em Idomeni com os três filhos. A mulher conseguiu chegar à Alemanha, mas Ahmed teme nunca mais voltar a vê-la. "A minha mulher foi diagnosticada com cancro, está em Estugarda. Chegou lá antes de mim e dos nossos três filhos. Agora estamos presos aqui e não sei se voltarei a vê-la. As crianças ainda não sabem que ela está doente", disse Abu Ahmed à correspondente do canal Al-Jazira.
O campo de Idomeni era um pequeno local de passagem para cerca de 500 pessoas antes de a Macedónia ter fechado as portas, no início de Março, mas depois disso foi-se transformando numa pequena cidade com mais de 11.000 habitantes, onde há cafés e barbearias, mas acima de tudo tendas enterradas em lama e expostas à chuva, ao vento e ao frio.
Nenhuma das pessoas que estão em Idomeni pode ser reenviada para a Turquia ao abrigo do acordo com a União Europeia, porque esse pacto só entrou em vigor no domingo passado e elas já estavam na Grécia antes disso. O problema é que muitas pessoas não querem desistir no final de uma viagem longa e perigosa, com as portas da Europa à sua frente.
Pessoas como a iraquiana Fatima Ahmed, que vive no campo de Idomeni com três filhos e que tem outro, de 13 anos, já na Alemanha. "As pessoas que perderam a esperança ou que já não têm dinheiro talvez aceitem ir embora. Mas eu tenho esperança de que algo de bom vai acontecer amanhã ou ainda hoje", disse Fatima Ahmed à AFP.
Mas o jogo das vontades, dos pedidos e das exigências está cada vez mais frágil para o lado dos refugiados e dos migrantes. O acordo entre a União Europeia e a Turquia – que é muito criticado por várias organizações humanitárias, entre as quais a Agência das Nações Unidas para os Refugiados – tem conseguido travar a chegada de um grande número de pessoas às ilhas gregas através da Turquia.
A meio da semana, na quarta-feira, e pela primeira vez em muitos meses, não chegou um único migrante ou refugiado às ilhas do Mar Egeu. Um dia depois foram 161 e sexta-feira 78, números muito distantes dos cerca de 10.000 que chegavam diariamente às ilhas gregas em meados de Outubro no ano passado. É uma das consequências mais visíveis da entrada em vigor do acordo entre a União Europeia e a Turquia, que determina o regresso a este país dos que entraram na Grécia desde domingo passado.
Por um dia, não houve refugiados a chegar às ilhas gregas do Egeu
"A partir de segunda-feira, os esforços de evacuação [do campo de Idomeni] vão ser intensificados", anunciou na quinta-feira a agência grega que coordena a resposta à chegada de migrantes e refugiados, pela voz de um dos seus coordenadores, Giorgios Kyritsis. As autoridades da Grécia dizem que estão a trabalhar para acomodar mais 30.000 pessoas nos centros de acolhimento que já existem.
Mas o fecho da fronteira pela Macedónia e o acordo entre a União Europeia e a Turquia tem muitas outras consequências – não só o impacto nas condições de vida em Idomeni mas também a pressão sobre as autoridades da Grécia e as agências das Nações Unidas e outras organizações humanitárias que estão no terreno.
"Idomeni não foi planeado para ser um campo com todas as condições. A fronteira [com a Macedónia] foi encerrada de forma unilateral, e todos nós, incluindo as autoridades gregas, vimo-nos forçados a lidar com as consequências caóticas dessa decisão", disse um porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, Babar Baloch, ao Financial Times. No Twitter, Baloch descreveu o campo de Idomeni como "uma demonstração da miséria humana".
Para agravar ainda mais a situação em Idomeni, a informação é pouca, confusa e não chega a toda a gente. Mesmo os que pensam em sair não sabem muito bem o que fazer quando chegarem aos centros de acolhimento, mesmo com a garantia de que não serão enviados para a Turquia.
"As pessoas dizem-nos coisas diferentes todos os dias. Até os funcionários das Nações Unidas parecem estar confusos. Ninguém sabe o que nos vai acontecer", disse Riyadh Khadir, um curdo da minoria yazidi, de 23 anos, ao repórter do Financial Times. Khadir diz que até admite sair de Idomeni e ir para um centro de acolhimento, mas antes disso têm de lhe prometer que conseguirá chegar à Alemanha, onde já está um dos seus irmãos – um outro irmão e o seu pai foram mortos pelos jihadistas do Estado Islâmico em finais de 2014, diz o jovem, que respondeu às questões sobre os planos que tem para os próximos tempos com uma pergunta: "Se isto tivesse acontecido à tua família e se tivesses conseguido fugir, e se depois as pessoas te dissessem para voltares para trás, o que é que responderias?"