Destituição de Dilma? Mercados reagem com optimismo e cautela
A frase de um investidor resume por que é que, num primeiro momento, os mercados celebraram a perspectiva do impeachment: é preciso que alguma coisa aconteça para o Brasil sair da crise.
Na quinta-feira, enquanto o pedido de destituição contra a Presidente Dilma Rousseff era lido no plenário da Câmara dos Deputados, formalizando o início de um processo raro e de consequências imprevisíveis, e o Brasil se perguntava o que iria sobrar do país ou da sua democracia quando tudo chegasse ao fim (“O Brasil declara guerra a si próprio” é o título de um editorial da Bloomberg), pelo menos um sector reagiu com euforia à notícia: o mercado financeiro. A Bolsa de Valores de São Paulo fechou com a maior subida registada em um mês e o real – que este ano sofreu uma queda de 30% – alcançou a sua maior valorização face ao dólar em mais de quatro semanas.
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Na quinta-feira, enquanto o pedido de destituição contra a Presidente Dilma Rousseff era lido no plenário da Câmara dos Deputados, formalizando o início de um processo raro e de consequências imprevisíveis, e o Brasil se perguntava o que iria sobrar do país ou da sua democracia quando tudo chegasse ao fim (“O Brasil declara guerra a si próprio” é o título de um editorial da Bloomberg), pelo menos um sector reagiu com euforia à notícia: o mercado financeiro. A Bolsa de Valores de São Paulo fechou com a maior subida registada em um mês e o real – que este ano sofreu uma queda de 30% – alcançou a sua maior valorização face ao dólar em mais de quatro semanas.
O alívio dos mercados – uma boa notícia para uma economia que enfrenta a sua pior recessão em duas décadas – não deve ser lido como uma celebração do possível afastamento da Presidente. Investidores e economistas concordam que o optimismo se deve sobretudo à perspectiva de que o processo de impeachment (o Brasil usa a palavra inglesa para destituição), qualquer que seja o seu desfecho, poderá pôr fim ao impasse político em que o país se encontra mergulhado desde o início do ano, quando Dilma Rousseff assumiu o seu segundo mandato.
A crise política está a alimentar a crise económica, paralisando o Governo e desviando o foco necessário para implementar medidas que retirem o país da recessão. Como o norte-americano James Gulbrandsen, director da gestora financeira NCH Capital na América Latina, explicava ontem ao jornal O Globo, “o investidor quer simplesmente que alguma coisa aconteça para, enfim, acabar com essa crise”. Segundo Gulbrandsen, existem duas saídas para o processo de impeachment e qualquer uma delas agradaria aos mercados: a saída de Dilma e a sua substituição (prevista na Constituição) pelo vice-presidente Michel Temer, do PMDB, que há cerca de um mês apresentou o seu próprio plano de reformas económicas, uma espécie de pacto nacional contra a crise; ou a sobrevivência de Dilma Rousseff, com um mandato reforçado e, portanto, com mais capacidade para produzir alianças políticas.
Segundo a revista The Economist, o pedido de impeachment aumenta as possibilidades de sobrevivência de Rousseff, e não o contrário. O timing de Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados que decidiu accionar o processo, não deixou margem para dúvidas de que foi motivado por vingança pessoal, o que lhe retira alguma legitimidade, pelo menos em termos de opinião pública. E se o partido de Dilma se tem demonstrado dividido na sua relação com o Governo, o processo do impeachment deverá unificá-lo na defesa da Presidente.
O Eurasia Group, uma firma de consultoria, avalia que Dilma Rousseff tem uma vantagem de 60% ou mais de manter o seu mandato dada a falta de consenso no Congresso para a sua saída. O Globo noticiou esta sexta-feira que a Presidente tem uma maioria parlamentar confortável para afundar o processo de impeachment, que será submetido a aprovação na Câmara dos Deputados. Dilma precisa de 172 votos e tem pelo menos 258, diz o jornal carioca, com base em consultas que fez aos líderes dos maiores partidos com representação parlamentar.
Apesar do optimismo inicial do mercado financeiro, o consenso entre economistas é que ele não deve durar muito tempo, até porque um longo processo de destituição promete colocar as necessárias medidas de contenção do défice em espera, aumentar a incerteza, e aprofundar a recessão. O calendário parlamentar joga contra uma resolução rápida do processo: o Congresso fecha para férias dentro de duas semanas e só retoma os trabalhos em Fevereiro.
As férias podem ser suspensas ou reduzidas para acelerar o processo, mas para isso os presidentes dos dois fóruns legislativos no Congresso, Eduardo Cunha (Câmara dos Deputados) e Renan Calheiros (Senado), têm de dar o seu acordo. O Governo quer acelerar o processo e defende a suspensão das férias parlamentares. “No que depender do PT, não vai ter folga, não terá Natal, não terá Ano Novo até resolver essa situação”, disse o líder da bancada do PT na Câmara dos Deputados, Sibá Machado. Mas a oposição está dividida. O prolongamento do processo pode ser mau para o Brasil, mas bom para mobilizar a opinião pública em torno do impeachment.