“Acabar com a austeridade” já, mas tentar défice abaixo de 3% no final do ano

A partir de 1 de Janeiro muitos portugueses vão sentir um aumento do seu rendimento disponível. Em relação ao que isso significa para os resultados orçamentais no final, as opiniões dividem-se.

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Mário Centeno será o ministro das Finanças de António Costa Nuno Ferreira Santos

Sob forte pressão de Bruxelas, umas das primeiras prioridades do Governo de António Costa vai ser a de apresentar uma proposta de Orçamento do Estado (OE) que, em simultâneo, cumpra a promessa de “acabar com a austeridade” e garanta que o limite de 3% para o défice imposto pelas regras europeias seja cumprido. Uma tarefa repleta de incertezas e riscos.

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Sob forte pressão de Bruxelas, umas das primeiras prioridades do Governo de António Costa vai ser a de apresentar uma proposta de Orçamento do Estado (OE) que, em simultâneo, cumpra a promessa de “acabar com a austeridade” e garanta que o limite de 3% para o défice imposto pelas regras europeias seja cumprido. Uma tarefa repleta de incertezas e riscos.

Para muitos portugueses — e também para as finanças públicas —, os efeitos vão ser sentidos quase de imediato. Logo no arranque do próximo ano, mesmo antes do novo orçamento entrar em vigor, os funcionários públicos vão assistir a uma aceleração da reversão dos cortes salariais que ainda estiveram em vigor em 2015. No primeiro trimestre será reposto 25% do corte, no segundo 50%, no terceiro 75% e, finalmente, nos últimos três meses do ano o salário será já recebido por inteiro. Esta reversão é feita de forma mais rápida do que aquilo que estava previsto pelo governo da coligação, que apontava para uma reversão de 25% no ano todo.

No que diz respeito ao IRS, a maioria dos portugueses irá sentir, logo em Janeiro, o efeito da eliminação de metade da sobretaxa ainda em vigor em 2015 (passa de 3,5% para 1,75%). Esta medida conduzirá à diminuição da retenção na fonte que é feita pelo empregador, o que significa que o salário líquido irá aumentar. Também neste caso, a redução da sobretaxa é feita de forma mais rápida do que o previsto.

Para os aposentados voltará a ser aplicada a fórmula de actualização prevista na lei, que esteve nos últimos cinco anos congelada. Os aumentos deverão ser muito moderados (em torno de 0,3%), aplicando-se a quem tem uma pensão inferior a 628 euros.

Estas três medidas avançam antes da proposta de OE ser aprovada, uma vez que os respectivos diplomas já foram entregues pelos partidos da maioria de esquerda e deverão ser discutidos e aprovados na Assembleia da República já esta semana, garantindo que as medidas entram em vigor logo no arranque de 2016, seja qual for a data de aprovação do OE.

Para apresentar a proposta de Orçamento do Estado na Assembleia da República e, ao mesmo tempo, a entregar às autoridades europeias (que têm vindo a revelar uma impaciência crescente em relação ao atraso), o novo governo dispõe por lei de 90 dias após a sua tomada de posse.

No entanto, até para começar o seu mandato passando sinais positivos a Bruxelas, o Executivo vai querer ser bastante mais rápido do que isso. Mário Centeno, o economista escolhido por Costa para liderar o Ministério das Finanças, já disse que não vai usar todo esse prazo, apoiando-se no facto de, nos programas eleitoral e de governo, o PS já ter feito cálculos de impactos orçamentais e económicos, o que pode acelerar o processo.

Ainda assim, na proposta de OE estarão ainda mais medidas com impacto significativo nas contas públicas e nas contas dos portugueses. Depois de nas primeiras semanas do ano se viver em regime de duodécimos, quando o OE entrar em vigor o IVA da restauração deverá passar de 23% para 13%, a TSU dos trabalhadores com salários abaixo de 600 euros irá baixar 1,33 pontos percentuais, a sobretaxa de IRS cairá ainda mais por força do efeito da subida do salário mínimo e várias prestações sociais, como o abono de família, serão colocadas de novo aos níveis de 2011.

O Governo pretende ainda avançar com um aumento do número de escalões de IRS, numa medida em sentido inverso à que foi adoptada por Vítor Gaspar em 2013, quando anunciou um “enorme aumento de impostos”. Como isso será feito, ainda está em discussão, sendo certamente uma das tarefas mais complexas da elaboração do OE.

Perante todas estas medidas com impacto directo negativo no orçamento, e incertezas relacionadas com a evolução da economia europeia ou as necessidades de recapitalização da banca, surgem as dúvidas em relação ao que irá acontecer ao valor do défice público no próximo ano.

De acordo com as contas do PS, feitas tendo como base as previsões da Comissão Europeia, a meta do défice para 2016 fica em 2,8%, cumprindo o limite imposto pelas regras orçamentais da UE. Isto significa que o impacto esperado com as medidas adoptadas é nulo, uma vez que a Comissão Europeia, num cenário de políticas inalteradas, está também à espera de um défice de 2,8%.

A explicação dada pelo PS está no facto de também haver medidas com impacto orçamental directo positivo. É o caso da suspensão da descida planeada no IRS (que já não é compensada com a descida da TSU) e do imposto sobre sucessões, para além de medidas de redução da despesa.

E há também a convicção, por parte do PS, sustentada no modelo económico que serviu de base aos programas eleitoral e de governo, de que o aumento do rendimento disponível dos portugueses terá um efeito positivo na actividade económica que acabará por gerar também impactos orçamentais positivos ao nível da receita fiscal.

Ainda assim, e isso já foi assumido por Mário Centeno, o que o orçamento do novo governo fará é apostar num ritmo bastante mais lento de consolidação orçamental durante o próximo ano do que aquele que está previsto no programa de estabilidade português entregue em Abril a Bruxelas. Depois de um défice próximo de 3% em 2015 — que já terá de ser o novo Executivo a garantir nas últimas semanas do ano —, o governo PS aponta para 2,8% em 2016, um valor que é um ponto percentual mais alto que os 1,8% desejados pelo anterior governo.

Os 2,8% de défice nominal cumprem o limite imposto pelas regras orçamentais europeias, mas, por se basearem largamente na retoma da economia, não devem garantir que o défice estrutural recue 0,5 pontos percentuais, como as regras europeias também exigem.

Explicar à Comissão e aos seus parceiros do Eurogrupo aquilo que leva a apresentar estes valores será, para Mário Centeno, uma das tarefas mais difíceis do início do seu mandato.

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