Angola insinua que há interesses estrangeiros por trás dos activistas

Manuel Vicente leu mensagem de Eduardo dos Santos, que faltou à abertura do ano parlamentar por “indisponibilidade momentânea”.

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Presidente não fez o discurso devido a "indisponibilidade momentânea" Enric Vives-Rubio

O Governo de Angola deu a entender, esta quinta-feira, que por trás dos activistas detidos desde Junho em Luanda haverá interesses estrangeiros. Sem qualquer menção directa aos 15 acusados de preparação de golpe de Estado e atentado contra o Presidente José Eduardo dos Santos, o seu vice disse que “há entidades estrangeiras interessadas em instalar o caos e a desordem nalguns países” africanos, mas – acrescentou no mesmo parágrafo – “os angolanos nunca vão ceder diante de quem quer que seja”.

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O Governo de Angola deu a entender, esta quinta-feira, que por trás dos activistas detidos desde Junho em Luanda haverá interesses estrangeiros. Sem qualquer menção directa aos 15 acusados de preparação de golpe de Estado e atentado contra o Presidente José Eduardo dos Santos, o seu vice disse que “há entidades estrangeiras interessadas em instalar o caos e a desordem nalguns países” africanos, mas – acrescentou no mesmo parágrafo – “os angolanos nunca vão ceder diante de quem quer que seja”.

Num discurso de Eduardo dos Santos lido pelo vice-Presidente Manuel Vicente, devido a “indisponibilidade momentânea” do chefe de Estado, procuram acentuar-se diferenças entre a situação de Angola e o “caos” e “desordem” noutros países do continente. “Não vale a pena procurarmos atalhos para chegar ao poder político, violando a Constituição e a Lei e provocando a desordem como está a ocorrer em alguns países africanos.”

“Há entidades estrangeiras interessadas em instalar o caos e a desordem nalguns países do nosso continente para provocar a queda de partidos políticos ou de dirigentes com os quais não simpatizam. Os angolanos nunca vão ceder diante de quem quer que seja, sempre que se tratar da defesa dos seus interesses essenciais e vitais”, é dito noutra passagem do discurso sobre o Estado da Nação, que tradicionalmente marca a abertura da sessão legislativa da Assembleia Nacional, após as férias parlamentares.

Na mensagem lida pelo número dois do Governo de Luanda é dito que a situação política no país “é estável” e que “as entidades competentes estão vigilantes e têm tomado as providências necessárias para se evitarem e repararem todos os actos que significam abusos de poder, violação dos direitos humanos ou do ordenamento jurídico estabelecido”.

Falando em nome de Eduardo dos Santos – a ausência foi justificada pelo presidente da Assembleia, Fernando da Piedade “Nandó”, com uma “indisposição – o vice declarou também que o poder angolano regista com satisfação que, “na generalidade”, os “preceitos institucionais e da lei” são cumpridos pelas instituições, pela sociedade e pelos cidadãos – também aqui numa aparente alusão, por contraste, aos activistas anti-regime, entre eles Luaty Beirão, em greve de fome desde 21 de Setembro.

Manuel Vicente declarou igualmente aos deputados – perante convidados e representantes do corpo diplomático – que Angola é um dos estados africanos mais respeitados a nível internacional. “Foi eleita como Membro Não Permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas para o período 2015-2016, preside a Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos, sendo um parceiro fundamental para a construção da paz nesta tão perturbada região do Continente e igualmente preside ao Comité Consultivo Permanente da ONU para a Segurança na África Central", lembrou.

Reestruturação da Sonangol
Num discurso em que as questões económicas tiveram lugar de relevo, o vice-Presidente anunciou que o executivo criou uma comissão para estudar a reestruturação da petrolífera Sonangol – maior empresa do país, por ele dirigida durante 13 anos, até 2012 – e do sector dos petróleos.

A decisão é comunicada quatro meses depois de ter sido tornado público um documento interno da empresa, assinado pelo actual presidente, Francisco de Lemos, onde se criticam vertentes da actividade da petrolífera durante a liderança de Vicente.

No discurso lido pelo vice-Presidente afirma-se que a crise provocada pela quebra do preço do barril de crude nos mercados internacionais levou a uma “subida generalizada de preços, incluindo o preço da moeda nacional face ao dólar norte-americano” e teve efeitos “no rendimento disponível da grande generalidade da população, que sofreu uma quebra apreciável”.

Manuel Vicente afirmou que apesar da redução de recursos e da despesa pública, o Estado continua a assegurar o essencial dos serviços públicos e dos serviços sociais. Uma das vertentes destacadas a este nível foi a reintegração socioeconómica que disse ter já abrangido 112 mil ex-militares.

O número de antigos combatentes que pertenciam às forças do Governo do MPLA (Movimento para a Libertação de Angola) e do antigo movimento rebelde UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) que não foram integrados nas Forças Armadas, após o fim da guerra civil, em 2002, foi calculado em 230 mil. Somando as famílias totalizam cerca de 600 mil pessoas, disse.

O número dois do Governo anunciou também a revisão em baixa da previsão de crescimento do Produto Interno Bruto dos 6,6% previstos no Orçamento de Estado para quatro por cento. Recentemente, o FMI-Fundo Monetário Internacional reviu em baixa a sua previsão de crescimento de Angola de 4.5% para 3.5% em 2015. E diagnosticou que a recuperação só ocorrerá em 2017.

“Todas as economias têm ciclos altos e baixos. A boa notícia é que não haverá recessão, mas apenas uma ligeira desaceleração”, leu também Manuel Vicente. A previsão do executivo angolano é de um aumento da captação do investimento privado estrangeiro de cerca de 10 mil milhões de dólares, nos próximos dois anos.