Curdos anunciam aliança contra o Estado Islâmico e dizem ser alternativa a Assad
Moscovo aumenta ofensiva aérea e abre caminho a forças pró-governamentais na Síria. Sem uma oposição moderada forte, Ocidente continua sem saber o que fazer a Assad.
Esta nova coligação, autodesignada Forças Democráticas da Síria, é composta por elementos do Exército Livre da Síria e lealistas da Coligação Nacional Síria, a formação oposicionista no exílio, vista pelo Ocidente como a principal alternativa política a Assad. “O objectivo actual, em termos práticos, é confrontar o Daesh [designação árabe do Estado Islâmico], dado que é o primeiro inimigo”, lê-se no comunicado das milícias. “Mas o objectivo é também construir uma Síria democrática no futuro”, anuncia a recém-criada aliança.
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Esta nova coligação, autodesignada Forças Democráticas da Síria, é composta por elementos do Exército Livre da Síria e lealistas da Coligação Nacional Síria, a formação oposicionista no exílio, vista pelo Ocidente como a principal alternativa política a Assad. “O objectivo actual, em termos práticos, é confrontar o Daesh [designação árabe do Estado Islâmico], dado que é o primeiro inimigo”, lê-se no comunicado das milícias. “Mas o objectivo é também construir uma Síria democrática no futuro”, anuncia a recém-criada aliança.
Em termos militares, esta nova coligação pode ser a resposta aos anseios do Ocidente, inconformado com a ideia de que a resistência moderada na Síria se tornou inviável com o evoluir do conflito. O Exército Livre, apoiado e equipado pelos Estados Unidos, foi perdendo gradualmente importância em face dos grupos e alianças jihadistas, melhor financiados, organizados e eficazes.
Os curdos aliaram-se a Assad no combate aos jihadistas em alguns pontos do Leste do país, mas combateram também lado-a-lado com as organizações árabes da nova aliança no Norte. Foram os cerca de 50 mil combatentes das YPG, com o apoio aéreo da coligação liderada pelos Estados Unidos, que reconquistaram Kobani e Tel-Abyad aos extremistas. Estão agora às portas de Raqqa, o bastião do Estado Islâmico. E podem passar à ofensiva.
A coligação de curdos, árabes e cristãos assírios pode beneficiar da nova estratégia norte-americana para a Síria. Washington desistiu de treinar grupos inteiros de rebeldes moderados no estrangeiro – uma táctica que se revelou um fiasco – e decidiu em vez disso apoiar comandantes da sua confiança. Segundo o porta-voz de um dos grupos da nova aliança, o apoio norte-americano já foi negociado. “Disseram-nos que as novas armas estão a caminho”, disse à Reuters Abu Muazz, representante de um grupo com algumas centenas de combatentes que tenta libertar Raqqa do domínio do Estado Islâmico.
Rússia aumenta ataques
Moscovo aumentou expressivamente a sua ofensiva aérea na Síria nos últimos dias e deixou a porta aberta para que forças aliadas a Assad recuperem parte do território que o Presidente sírio perdeu nos últimos meses. Os caças russos fizeram 55 ataques entre domingo e esta segunda-feira, segundo o Kremlin, que se somam às dezenas do fim-de-semana – mais de 60 por dia, segundo o The New York Times. Mais do que o dobro das 25 ofensivas diárias da última semana.
As bombas russas têm permitido novos avanços das forças do regime, que nesta segunda-feira conquistaram duas vilas nos arredores de Hama, uma das poucas capitais de província ainda no poder de Damasco, e aproximavam-se com perigo de Khan Cheikhoun, nos arredores de Idlib, ponto estratégico na auto-estrada que liga a capital síria a Aleppo. Em Latakia, bastião alauita de Assad, grupos pró-governamentais recuperaram cinco aldeias e afastaram o cerco rebelde à região.
Os principais alvos dos bombardeamentos russos são Homs, Hama, Latakia e Idlib, tudo grandes territórios no Noroeste do país e zonas em que o regime está ameaçado ou pode avançar com perigo contra grupos insurgentes. São conhecidas poucas, se algumas, posições do autoproclamado Estado Islâmico nestas regiões, embora os meios de informação estatais na Rússia defendam que o grupo é o único alvo dos caças. Apenas uma fracção das ofensivas russas atingiu Raqqa.
A força rebelde mais fustigada pelos caças de Moscovo é a coligação Exército da Reconquista. Trata-se de uma aliança de grupos radicais islamistas a que pertence o poderoso braço da Al-Qaeda na Síria, a Frente al-Nusra. Mas há também unidades do fragmentado Exército Livre da Síria entre os alvos das bombas russas.
Vladimir Putin afirma que o seu objectivo é “estabilizar o Governo legítimo e criar condições para um compromisso político”. Estados Unidos e União Europeia censuram-no. Os ministros europeus dos Negócios Estrangeiros reforçaram as suas críticas nesta segunda-feira a partir do Luxemburrgo, onde se reuniram pela primeira vez desde o início da campanha aérea de Moscovo na Síria.
Os ministros criticaram os ataques a forças rebeldes moderadas e exigiram o fim dos bombardeamentos. “Os recentes ataques militares russos são fonte de grande consternação e devem terminar rapidamente”, anunciaram em comunicado. “A intensificação militar arrisca-se a prolongar o conflito, a minar o processo político, agravar a situação humanitária e a aumentar a radicalização.”
Mas, do Luxemburgo, não saiu nenhuma posição consensual sobre o destino de Assad na Síria. A ofensiva de Moscovo em nome do Presidente sírio obriga o Ocidente a tomar uma posição sobre o seu futuro. Países como a Alemanha e Espanha, por exemplo, admitem agora que Bashar al-Assad faça parte de um processo de transição política. Algo que é defendido também pelo Kremlin. O Reino Unido é menos assertivo, mas deixa a porta aberta à data de saída do Presidente. A França, no entanto, opõe-se por completo à ideia de que o ditador possa fazer parte de uma transição na Síria.
A intervenção de Moscovo, para além de evidenciar as incertezas no Ocidente sobre os caminhos para o fim do conflito, revela que, sem uma oposição moderada com força no terreno, há pouca margem de manobra para que Washington e Bruxelas exijam a saída imediata de Assad. “Todos os grandes opositores de Assad estão mortos, na cadeia ou no exílio”, disse um diplomata europeu à Reuters. “E ninguém quer mais uma Líbia.”