O “caso Sócrates” e o PÚBLICO
Não considero que tenha havido da parte da jornalista violação do Código Deontológico ou das normas consagradas no Livro de Estilo do PÚBLICO
Do leitor José Augusto Rocha e que invoca a condição de advogado recebi a seguinte queixa:
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Do leitor José Augusto Rocha e que invoca a condição de advogado recebi a seguinte queixa:
“Arrogo-me a qualidade de leitor do Público desde o seu n.º1, colaborador em alguns artigos de opinião e, no mais, congratulo-me pelo jornal de referência e posição de rigor e imparcialidade que é seu estatuto e prática.
Mas nem sempre a razão impura de um ou outro jornalista é timbre dessa distinção.
Assim aconteceu na edição de hoje, dia 25-09-15, em relação à notícia subscrita pela jornalista Mariana Oliveira e outra, titulada “Nove arguidos do caso Sócrates conseguem acesso total ao processo”.
A notícia em causa está inquinada de uma obsessão anti Sócrates, que já vem de longe, e, até, já experienciou uma reclamação antiga minha na coluna do provedor do leitor.
1. É totalmente inaceitável que a jornalista em causa refira que “vários magistrados ouvidos pelo Público consideram, contudo essa interpretação incorrecta…”, a “…interpretação segundo a qual estariam a ser violados os direitos das defesas”.
A invocação da existência de “vários magistrados ouvidos”, sem a menção da sua identificação, citados de forma anónima e secretamente avulsa, fere o princípio basilar do “ Livro de Estilo” do Público, no duplo princípio da publicidade e do contraditório e descaracteriza o rigor do conteúdo do Acórdão da Relação, relegando-o para a prateleira de coisas menores e apagamento da relevância jurídica que o seu mérito e considerações doutrinais amplamente justificam.
2. A intencionalidade da aversão ao legítimo exercício dos direitos de defesa de José Sócrates está bem patente e reforça-se ainda com a expressão “…os advogados do ex-primeiro ministro reagiram a esta decisão através de mais uma conferência de imprensa …” (…)
3. A coroar toda a respiração hostil da notícia, atente-se na expressão do próprio título “conseguem”. Basta ler ou ter o conhecimento mínimo do Acórdão para se compreender e alcançar, de forma simples e objectiva, que o seu conteúdo afirma valores essenciais constitutivos do princípio da presunção de inocência de um arguido, princípio de matriz constitucional e, no caso, brutalmente massacrado, desde Abril do corrente ano, no âmbito do inquérito. Princípios como este, não se “conseguem”, afirmam-se e reafirmam-se e o seu respeito, no começo de todas as coisas é um imperativo de afirmação que a todos se impõe. …A jornalista em questão parece desconhecer o significado axiológico dos valores constitutivos de um Estado de Direito e condescende em que esses valores axiomáticos, infringidos no caso, possam, como que a título de favor, serem duvidosamente “conseguidos.” (…)”
Comentário da jornalista, Mariana Oliveira:
“Ao contrário do que parece acontecer com o queixoso, que tem uma opinião bem marcada na defesa do Eng. José Sócrates, nada me move nem contra nem a favor do ex-primeiro-ministro. Sou jornalista e tento acompanhar com isenção e imparcialidade este processo.
Recuso-me, contudo, a fazer de ‘pé de microfone’ seja da defesa, seja da acusação, procurando, por isso, esclarecer os leitores sobre a substância dos argumentos invocados de parte a parte. Por isso mesmo, nesta notícia recorri a alguns magistrados judiciais, para tentar esclarecer se a “consequência automática” que os defensores retiravam da decisão da Relação (a libertação do cliente e dos restantes arguidos em prisão domiciliária) era consensual e previsível - era esse o esclarecimento e não o que alega o Dr. José Augusto Rocha, que fala de uma “ interpretação segundo a qual estariam a ser violados os direitos das defesas”, frase essa que não existe no meu texto.
Um esclarecimento que penso da maior relevância para o caso, já que os advogados chegaram a prever a libertação do cliente naquele fim-de-semana, o que não veio a acontecer.
Sob o anonimato dos magistrados referidos, foi essa a condição imposta pelos mesmos, face ao dever de reserva a que estão obrigados. No fundo não queriam ficar associados a um caso em concreto, quando apenas se pronunciaram sobre uma questão jurídica que poderia estar associada a este ou a outro processo qualquer. (…)
Abstenho-me de comentar as restantes questões levantadas já que me parecem objectivamente incorrectas. O termo “conseguem” foi colocado para se perceber que a decisão resultava de uma exigência da defesa, já que no título não coube a referência ao Tribunal da Relação. O “mais” é factual e transmitia de uma forma simples a ideia que a defesa já optou antes por reagir através de conferências de imprensa.
Não creio, por isso, ter violado qualquer norma deontológica ou do Livro de Estilo, mas fico a aguardar a sua reflexão.
Resta-me concluir que considero que o leitor está no uso da sua liberdade de expressão, um direito que muito prezo, e que felizmente lhe permite, por diversas vezes e em diferentes contextos, assumir a defesa do Eng. José Sócrates. (…)”
Comentário do provedor: Creio que colocar em confronto o teor da queixa apresentada pelo leitor José Augusto Rocha e o da resposta da jornalista Madalena Oliveira é suficiente para dirimir a questão. Da minha parte acrescento que, efectivamente, não considero que tenha havido da parte da jornalista violação do Código Deontológico ou das normas consagradas no Livro de Estilo do PÚBLICO.
“Malditas sondagens”
A classificação de “malditas” nem é minha. Retomo-a do Editorial do PÚBLICO de anteontem. E refiro-a a propósito de duas queixas apresentadas pelos leitores Fernando de Albuquerque e Fernando Cardoso Rodrigues. O primeiro diz: “Gostaria de saber antecipadamente ao resultado eleitoral do dia 4 próximo qual vai ser a atitude do jornal se os resultados forem muito diferentes dos publicados. O meu pedido prende-se com uma razão muito simples: Considero que sondagens com esta ficha técnica são de uma grande falta de seriedade e espero sempre do seu jornal a informação mais séria”.
Como o leitor compreenderá, os outros comentários que tece, não os poderei transcrever em dia de votos. Registo, contudo, o pedido que faz: “Espero um pedido de desculpas público caso a realidade confirme que erraram”. De alguma maneira, o PÚBLICO, no seu editorial de anteontem já previne essa situação. E, por isso, escreve: “Aconteça o que acontecer, no domingo os estudos de opinião também vão estar na berlinda”. Eu diria, também, vão a votos. E eu vou estar atento, como me pede o leitor.
Por sua vez, o leitor Fernando Cardoso Rodrigues escreve: “Várias vezes já ‘protestei’ pelo uso de estrangeirismos, mas desta vez a coisa vai muito além dum mero descuido ou ‘vaidade pacóvia’ de jornalista. Refiro-me ao ‘tracking poll diário’.” (…) Como o leitor facilmente perceberá a expressão não é do jornalista Nuno Ribeiro. Por isso não vale a pena invectivá-lo. E continua Fernando Cardoso Rodrigues: “A moda de sondagens diárias já é abominável, mas isto de usar linguagem para que imensa gente desconhece o seu significado, só pode ser intencional porque condicionante! E, embora fora do que aqui me traz hoje, ainda por cima, os ‘empates técnicos’ já se converteram em vitórias robustas no Reino Unido e na Grécia, não é verdade?”
Pois é, prezado leitor, estes estrangeirismos são inevitáveis. E talvez encubram mais do que a “infracção” linguística. Veremos.