Metro de Lisboa pede anulação de sentença que obriga a repor pensões

Transportadora pública acusa tribunal de decidir de forma “ligeira” e “despropositada” e rejeita pagar os 440 mil euros a que foi condenada. Complementos de reforma suspensos eram pagos a seis mil pessoas

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Reformados da Metro de Lisboa tem realizado acções de luta para contestar a medida José Maria Ferreira

A empresa apresenta uma extensa lista de argumentos para não devolver o dinheiro aos reformados, que, à semelhança de outras 200 pessoas na mesma situação, têm como advogado neste processo António Garcia Pereira. Os autores da acção reclamavam que fossem repostos os valores suspensos a partir de 1 de Janeiro de 2014 e pagas indemnizações por danos morais num total de 60 mil euros. Uma exigência a que o tribunal anuiu, apesar de a medida, inscrita no Orçamento do Estado do ano passado, ter sido declarada constitucional, embora sem unanimidade, pelos juízes do Palácio Ratton.

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A empresa apresenta uma extensa lista de argumentos para não devolver o dinheiro aos reformados, que, à semelhança de outras 200 pessoas na mesma situação, têm como advogado neste processo António Garcia Pereira. Os autores da acção reclamavam que fossem repostos os valores suspensos a partir de 1 de Janeiro de 2014 e pagas indemnizações por danos morais num total de 60 mil euros. Uma exigência a que o tribunal anuiu, apesar de a medida, inscrita no Orçamento do Estado do ano passado, ter sido declarada constitucional, embora sem unanimidade, pelos juízes do Palácio Ratton.

Um dos pontos da sentença que a Metro de Lisboa critica é o facto de o juiz se ter suportado no fim do programa de assistência financeira para decidir pela reposição dos complementos, já que entendeu que foi o facto de o país estar sob a chancela da troika que levou o Tribunal Constitucional a dar luz verde à medida. Para a empresa, o fim do programa “por si só não pode alterar o rigor que os órgãos de soberania devem ter na gestão dos dinheiros públicos, pelo que se trata de uma fundamentação destituída de qualquer sentido de gestão”.

A transportadora pública acusa o tribunal de dar como provados factos “de forma genérica e abstracta”, nomeadamente os que dizem respeito aos danos morais invocados pelos queixosos. E, por isso, recusa-se a pagar os 60 mil euros reclamados a este nível, já que entende que se considerou “que todos os 24 autores sofreram consequências psicossomáticas de igual tipo e grau equivalente”, embora alguns possam “não ter sofrido desses problemas ou ter sofrido apenas de alguns e porventura em graus diferentes”.

Ainda no que se refere aos danos morais, a empresa defende que não há lugar a indemnização porque se limitou “com boa fé” a cumprir uma regra imposta pelo Governo. “A obrigação de indemnizar pressupõe (...) um comportamento culposo”, afirma.

Empresa só quer devolver um ano de complementos
Há outros factos dados como provados pelo tribunal que a Metro de Lisboa contesta, como a redução de 60% nos rendimentos que os queixosos alegam ter sofrido com a suspensão dos complementos de reforma, argumentando que o tribunal não tinha acesso a todos os dados que lhe permitissem corroborar esta tese. “Conhecer da constitucionalidade dos actos concretos implica necessariamente o conhecimento da situação concreta de cada um dos autores”, considera a empresa, que critica ainda o facto de a sentença “ignorar” que os reformados continuam a receber uma pensão através da Segurança Social e de os complementos que lhes eram atribuídos não corresponderem à carreira contributiva.

Entre outros argumentos, a transportadora usa alguns mais relacionados com o procedimento seguido pelos ex-trabalhadores, acusando-os de terem fixado um valor para a acção (30.001 euros) e de terem pago uma taxa de justiça que não corresponde aos montantes reclamados. A Metro de Lisboa chega, aliás, a exigir que esta taxa, no valor de 612 euros, seja cobrada não como um todo, mas a cada um dos queixosos.

A transportadora termina o recurso com a ilação de que, a ser condenada, só terá de pagar os complementos relativos a 2014. Isto porque entende que o juiz se limitou a analisar a legalidade da norma que constava no Orçamento do Estado para esse ano (artigo 75.º) e não no que foi inscrito no mesmo documento em 2015 (artigo 78.º). “Neste momento, a suspensão do pagamento dos complementos de pensão é feita com base no disposto no artigo 78.º (...), sendo que a constitucionalidade desta norma não foi suscitada nem está em causa nos presentes autos”. E, por isso, a empresa considera a decisão de devolver estas verbas “nula”.

Quando muito, diz a Metro de Lisboa, “a condenação não poderá ultrapassar o montante correspondente a 12 meses de complemento de reforma por cada um dos autores, o que perfaz a quantia total de 255.305,64 euros”, lê-se no recurso. Ou seja, menos 123 mil euros do que o valor que o tribunal entende que deve ser reposto.

Garcia Pereira, que está neste momento a preparar a 11.ª acção a contestar a suspensão dos complementos de reforma, explicou ao PÚBLICO que os queixosos “vão fazer agora as contra-alegações ao recurso apresentado pela Metro de Lisboa”. Relativamente aos outros casos que o advogado está a acompanhar, as sentenças ainda não são conhecidas.

Há muitas centenas de ex-trabalhadores da empresa (e também da Carris, que foi igualmente afectada pela medida) que estão a ser apoiados pelos sindicatos na contestação judicial. No total, quando a suspensão foi decidida, em prol do equilíbrio financeiro destas transportadoras públicas, mais de 5600 pessoas recebiam estas verbas e havia ainda 3400 futuros beneficiários.

Chegou a haver uma aproximação entre o Governo e a UGT para mitigar estes cortes, mas, até agora, não é conhecida nenhuma solução. A Metro de Lisboa e a Carris, que só podem voltar a pagar suplementos quando derem lucros durante três anos, gastavam quase 25 milhões de euros anualmente com estes complementos.