Luta de cidadãos contra “mamarracho” da Granja chega ao Ministério Público

Com a “iminência” da construção da passagem pedonal superior na estação de Gaia, cidadãos recorreram aos tribunais. Autarquia prometeu lutar pela solução em túnel, mas IP parece levar a melhor

Foto
Paulo Pimenta Passagem de nível será suprimida e substituída por passagem superior

Sentindo que a empreitada de construção de uma passagem pedonal superior na estação da Granja está “iminente” – e depois de a “via amigável” ter sido esgotada –, um grupo de cidadãos apresentou uma queixa ao Ministério Público, com a Infra-estruturas de Portugal como principal visada, pedindo que a justiça trave uma obra envolta em “ilegalidades” que “esmaga” o bairro da Granja, em Vila Nova de Gaia. Foi também apresentada uma queixa ao Provedor da Justiça Europeu, com o argumento de mau uso de fundos comunitários.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Sentindo que a empreitada de construção de uma passagem pedonal superior na estação da Granja está “iminente” – e depois de a “via amigável” ter sido esgotada –, um grupo de cidadãos apresentou uma queixa ao Ministério Público, com a Infra-estruturas de Portugal como principal visada, pedindo que a justiça trave uma obra envolta em “ilegalidades” que “esmaga” o bairro da Granja, em Vila Nova de Gaia. Foi também apresentada uma queixa ao Provedor da Justiça Europeu, com o argumento de mau uso de fundos comunitários.

O “mamarracho” com mais de dez metros de altura, que está a ser feito na Marinha Grande, estará praticamente pronto, diz Vasco Sousa, um dos autores da acção intentada pelo Grupo Informal Cidadãos da Praia da Granja, que em breve será transformado em associação. E o impacto na paisagem e vida dos moradores será enorme. No local, estão já em construção “muros de quatro metros em frente a algumas casas, que ficam sem visibilidade”. A mobilidade da população da zona, maioritariamente envelhecida, ficará comprometida. Quem usa bicicletas ou trotinetas terá dificuldades acrescidas.

Vasco Sousa teme que os elevadores previstos para a estrutura tenham o mesmo fim de todos os outros que conhece em geografias próximas do mar: “Ficam danificados e nunca estão disponíveis. Veja-se o caso de Espinho, onde o elevador está sempre avariado. Na prática, as pessoas vão perder mobilidade.”

Ao Ministério Público, este grupo de cidadãos pede que seja declarada a nulidade de todo o processo. E apresenta vários argumentos. Segundo a acusação, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) fica mal na fotografia por ter dispensado a avaliação de impacto ambiental argumentando que a anterior, referente a uma obra de 2010 e que previa uma passagem da linha férrea em túnel e não em altura, era válida. Em falta, acrescentam, está o período obrigatório de discussão pública – já que a realizada se referiu também ao projecto de 2010.

Deve ainda ser “declarada a nulidade” da adjudicação da obra, já realizada pela Infra-estruturas de Portugal, uma vez que esta fere o PDM de Vila Nova de Gaia. Por esse facto, acrescenta a queixa, entende-se que a IP tem agido com “dolo, devendo-lhe ser imputadas as respectivas responsabilidades criminais”.

Em relação à Câmara de Gaia, diz o grupo de cidadãos, defende que esta seja “obrigada a praticar as medidas necessárias para fazer cessar a agressão legal, já do seu conhecimento e perpetrada pela IP pelo facto de a obra violar o PDM e a Lei [por não cumprir o período de auscultação pública]”.

Autarquia mudou de opinião

Quando o PÚBLICO noticiou este caso, em Maio de 2021, Eduardo Vítor Rodrigues considerava a solução da IP “boa do ponto de vista da engenharia, da acessibilidade para todos” e considerava que a solução em túnel é algo que “já não se usa”. Mas o presidente da Câmara de Gaia já admitiu publicamente ter mudado a sua avaliação: “Acho que é mais vantajosa a passagem inferior e comprometo-me a lutar por ela”, prometeu. O PÚBLICO tentou saber quais as diligências da autarquia nesse sentido, mas a autarquia não respondeu. Também a IP preferiu não prestar declarações.

Com 60 a 70 pessoas activas, a futura associação de Cidadãos da Praia da Granja promete continuar a bater-se por outro desfecho para esta história. Mas não esconde a desilusão de ver um processo cívico ser ignorado numa espécie de luta de David contra Golias. “Há um desequilíbrio total entre um movimento de cidadãos e uma organização como a IP. Fala-se muito da intervenção do cidadão e nós tivemo-la. Mas isto desilude.”