Investigadores olham para crise sísmica em São Jorge como laboratório vivo
“É uma oportunidade única que estamos a viver”, adianta o investigador João Fontiela, da Universidade de Évora, que se deslocou a São Jorge. “Sem entrar em alarmismos, todos os cenários são possíveis”, conclui Rui Fernandes, da Universidade da Beira Interior.
Com todos os “cenários em cima da mesa”, investigadores portugueses consideram a ilha de São Jorge um laboratório vivo em tempo real para estudar uma crise caracterizada por milhares de sismos.
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Com todos os “cenários em cima da mesa”, investigadores portugueses consideram a ilha de São Jorge um laboratório vivo em tempo real para estudar uma crise caracterizada por milhares de sismos.
“É uma oportunidade única que estamos a viver”, adiantou este sábado João Fontiela, investigador do Instituto de Ciências da Terra da Universidade de Évora, que se deslocou à ilha de São Jorge, no Grupo Central dos Açores, para instalar 15 estações sísmicas do Instituto Dom Luiz.
João Fontiela disse que este trabalho no terreno, no concelho das Velas, onde se têm registado os epicentros dos milhares de sismos já registados desde 19 de Março, não consiste na “monitorização à hora da crise”, uma função que é desempenhada pelo Centro de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos Açores (CIVISA) e pelo IPMA.
“O que queremos adquirir é quantidade e qualidade de dados para nos permitir estudar estes fenómenos e tentar compreender o processo geológico subjacente a esta crise”, adiantou o especialista, ao considerar que, associado a isso, é possível fazer um raio-X à ilha em termos geológicos.
De acordo com João Fontiela, o que está a acontecer em São Jorge há cerca de uma semana é um “aparecimento súbito de sismos que não são padrão na ilha nesta zona”, ao nível da sua frequência. “Anualmente São Jorge tem poucos sismos e agora estamos a falar de milhares”, salientou o sismólogo, para quem a actual crise pode eventualmente durar meses.
João Fontiela apontou o exemplo da crise de 1964, que terá durado cerca de dois anos, e que, com o “reaparecimento de actividade sísmica fora do padrão”, culminou com uma erupção.
Rui Fernandes, outro investigador que também se deslocou a São Jorge, admitiu que, “sem entrar em alarmismos, todos os cenários são possíveis”.
“Os sinais de risco aumentaram significativamente em relação há um mês, mas daí não podemos extrapolar o que vai acontecer num futuro mais próximo”, salientou o cientista da Universidade da Beira Interior e do Colaboratório para as Geociências (C4G), que reúne várias instituições desta área.
Nos últimos dias Rui Fernandes esteve a instalar no concelho das Velas estações de GPS, que têm “capacidade de medir a posição com milímetros de margem de erro”.
“O objectivo é ver se à superfície verificamos quaisquer movimentos relativos que reflectem o que se está a passar”, explicou o investigador, ao assegurar à Lusa que, neste momento, a deformação não é significativa.
“Se não tivéssemos esta crise, diria que nada estava a acontecer à superfície”, salientou Rui Fernandes, ao explicar que, se o magma começar a subir, verifica-se, em regra, uma “deformação à superfície”.
A crise sismovulcânica em São Jorge iniciou-se às 16h05 de dia 19, tendo o sismo mais energético ocorrido nesse mesmo dia às 18h41 com uma magnitude de 3,3, na escala de Richter.
Na quarta-feira, o CIVISA elevou o nível de alerta vulcânico na ilha de São Jorge para V4 (de um total de cinco), o que significa “possibilidade real de erupção”.
Segundo os dados provisórios dos Censos 2021, a ilha de São Jorge tem 8373 habitantes, dos quais 4936 no concelho das Velas e 3437 no concelho da Calheta.