Nós como árvores
Na semana em que começou a Primavera e a água voltou a cair do céu, aqui fica um belo livro que nos compara às árvores.
Maria Gianferrari queria escrever um livro sobre árvores que juntasse ciência e poesia. Acabou por criar um texto que é uma verdadeira carta de amor a esses seres que se erguem da terra, estendem os braços para o sol e enlaçam as raízes no subsolo.
A verdade faz-nos mais fortes
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Maria Gianferrari queria escrever um livro sobre árvores que juntasse ciência e poesia. Acabou por criar um texto que é uma verdadeira carta de amor a esses seres que se erguem da terra, estendem os braços para o sol e enlaçam as raízes no subsolo.
Sê Uma Árvore é um convite à contemplação da natureza e de nós próprios. A comparação entre os ramos e os nossos braços; as raízes, “deixa as tuas raízes emaranharem-se no solo para te segurarem”; o tronco, “que te dá forma”; a copa, “que conduz o teu alimento”; a casca, a nossa pele, “protege o teu interior, apesar de morta no exterior”; as várias camadas de borne (parte interna da casca das árvores), “que transporta os nutrientes, ajudando-te a ficar cada vez maior e mais alto”; o cerne, “forte como osso, para te sustentar”. Por fim, a medula, “a guardiã dos nutrientes desde o princípio dos teus dias”.
Depois de todas estas observações e comparações, diz-nos a autora: “Olha para ti: ramos e folhas em cima, raízes em baixo e o tronco no meio. És uma árvore.” Para a seguir lembrar que não estamos sós. “És uma árvore entre muitas.”
A analogia prossegue com a comunicação, partilha, protecção e ajuda que as árvores mantêm entre si e de como são “abrigo e casa de aves, mamíferos e insectos”.
Gianferrari lembra ainda como uma árvore, tal como nós, fica vulnerável longe do seu habitat natural. “Mas, juntas numa floresta, as árvores são fortes.” Para concluir: “Uma família, uma comunidade, um país, um universo. Há que chegue para todos.”
Pensamento final: “Sê uma árvore. Porque, juntos, somos uma floresta.”
Vegetariana e fascinada com o que se passa debaixo da terra, longe dos nossos olhos, chama “Wood Wide Web” às trocas de energia, informação e nutrientes que ocorrem nas florestas, jardins ou em qualquer lugar onde existam árvores.
Cresceu em Keene, New Hampshire (EUA), e a família tinha uma casa numa fazenda, com uma garagem-celeiro virada para o monte Monadnock. Brincadeiras no campo fazem parte das suas memórias mais recuadas e felizes: “Podem dizer que eu sou louca, mas continuo a adorar o cheiro pungente do esterco de vaca e de galinha. Eu costumava brincar lá fora o dia inteiro, subia às árvores, apanhava sapos, observava pássaros e fazia buracos na terra, para encontrar argila.”
Agora, vive em Massachusetts. Além de árvores, gosta muito de cães, protagonistas de vários dos seus livros. Neste, teve a sorte de ser acompanhada pela já bastante premiada ilustradora Felicita Sala, de origem italiana, mas que cresceu na Austrália.
Desenhar memórias
Apesar de formada em Filosofia, Felicita tinha o desejo de “viver como artista”, mas pensou durante muito tempo que não seria possível. Até que voltou para a Europa e se apercebeu da qualidade artística de muitos livros ilustrados e decidiu que esse era um caminho possível. Foi. Já vive outra vez em Itália.
Numa conversa divulgada no YouTube pela Toadstool Bookshop, conta que demorou uns meses a terminar este livro. “Não queria que fosse todo verde e castanho”, já que é logo o que se imagina quando se pensa em árvores. Investigou, procurou a maior variedade possível de árvores e fez por espelhar o que o texto sugeria: “O vento, as sementes, as raízes, a terra.” Recorreu também às suas memórias australianas.
Como é hábito, usou aguarelas e lápis de cor. “Não sei muito bem o que estou a fazer até estar feito. Gosto de improvisar. O tronco [da imagem da capa] foi pintado em aguarela, mas depois desenhei por cima com lápis de cor.” Criou várias camadas (“layers”) até chegar ao efeito que lhe agradou. E a nós também.
Uma das árvores que acha mais impressionantes está reproduzida aqui, “a árvore azul”. E gostou muito de pôr crianças a trepar os ramos “com roupas coloridas, como se fossem confetti”.
Os pinheiros altos são as suas árvores favoritas porque a fazem recuar à infância, já que existem bastantes nos parques das cidades italianas. Algumas árvores australianas, “de pele macia, a fazer lembrar a pele humana”, também a encantam. São uma espécie de eucaliptos, a que retira as folhas e cheira, sempre que as encontra. Para recordar a família e dela se sentir mais perto.
“Juntos somos uma floresta.” Sejamos então.