Polícia Judiciária volta a fazer buscas na casa da mulher de João Rendeiro

Os factos em investigação são susceptíveis de integrar a prática dos crimes de branqueamento e de descaminho e estão relacionados com fundos que se suspeita terem sido retirados do Banco Privado Português (BPP) e com as obras de arte apreendidas.

Foto
João Rendeiro continua detido, na África do Sul, a aguardar os desenvolvimentos do seu processo de extradição LUSA/Luis Miguel Fonseca

A Polícia Judiciária (PJ) tem uma lista de oito buscas, cinco domiciliárias, duas não domiciliárias e uma a escritório de advogado, nas zonas de Lisboa, Aveiro e Porto para fazer esta terça-feira, segundo informa em comunicado.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A Polícia Judiciária (PJ) tem uma lista de oito buscas, cinco domiciliárias, duas não domiciliárias e uma a escritório de advogado, nas zonas de Lisboa, Aveiro e Porto para fazer esta terça-feira, segundo informa em comunicado.

O apartamento onde Maria de Jesus Rendeiro se encontra em prisão domiciliária, assim como uma moradia do casal, ambos na Quinta Patino, em Cascais, voltaram a estar entre os alvos das buscas. Já não é a primeira vez que a PJ se desloca ao local.

Estas buscas, segundo o comunicado da PJ, decorrem no âmbito da Operação D'Arte Asas III, um inquérito dirigido pelo Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP). As buscas são supervisionadas por dois magistrados do Ministério Público, com a coadjuvação da Polícia Judiciária, através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção.

De acordo com a PJ, os factos em investigação são susceptíveis de integrar a prática dos crimes de branqueamento e de descaminho, relacionados com fundos que se suspeita terem sido retirados do Banco Privado Português (BPP), assim como com as obras de arte apreendidas a João Rendeiro no âmbito do processo no qual se encontra condenado.

Estas diligências foram ordenadas na sequência das buscas realizadas no dia 3 de Novembro de 2021 com vista à recolha de prova complementar, assim como à recuperação de produto do crime.

Recorde-se que a PJ já recuperou três das 10 obras que tinham sido alvo de descaminho e que estavam apreendidas por ordem judicial desde 2010.

Em Novembro do ano passado, a PJ terá recuperado uma pequena estatueta a representar a “Nossa Senhora com o Menino ao Colo”, que alegadamente pode valer 10 mil euros, no apartamento do motorista do ex-banqueiro, na Quinta Patino, em Cascais. Maria Jesus Rendeiro tem o usufruto deste apartamento durante 15 anos.

Também no dia 21 de Janeiro, a PJ anunciou a recuperação de outra obra: o quadro intitulado “Piaski”, do artista Frank Stella, que se encontrava em exposição numa galeria de arte em Bruxelas, e que tinha sido vendido por João Rendeiro em Março de 2021, pelo valor de 126.274,99 euros, através de uma leiloeira de Nova Iorque.

E foi em Fevereiro que localizou e apreendeu uma escultura de autor desconhecido, denominada Venezianischer Mohr (mouro veneziano), que se encontrava num armazém em Alcabideche, Cascais, após uma busca levada a cabo naquele local, no dia 1 de Fevereiro.

É neste processo que Maria de Jesus Rendeiro responde pelo facto de estarem ainda em falta 10 das 124 obras de arte arrestadas ao marido em Outubro de 2010, e das quais era fiel depositária.

Motivo que levou a juíza Tânia Loureiro Gomes ­- que condenou João Rendeiro a dez anos de prisão efectiva, por crimes de fraude fiscal, abuso de confiança e branqueamento de capitais, num processo em que está em causa a apropriação indevida de mais de 31 milhões de euros do BPP - a condená-la a pagar uma multa de 1020 euros, por não ter esclarecido o tribunal sobre o paradeiro das obras em falta, alegando não ter condições psicológicas para o fazer. A mulher do ex-banqueiro chegou a chorar em tribunal.

É também neste processo que Florêncio de Almeida, presidente da Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL), e o filho deste - com o mesmo nome - que foi seu motorista durante décadas, são suspeitos de terem ajudado o ex-presidente do BPP a esconder a fortuna.

No caso da família de Florêncio de Almeida, ao que o PÚBLICO apurou, o Ministério Público suspeita de que o apartamento na Quinta Patino, em Cascais, comprado pelo motorista por 1,1 milhões de euros, é na verdade do próprio banqueiro. Como já foi noticiado pela SIC, em Dezembro de 2020 o filho do presidente da ANTRAL assinou um contrato-promessa para dar, por um período de 15 anos, o usufruto do apartamento à mulher de João Rendeiro por pouco mais de 200 mil euros.

A forma como motorista de João Rendeiro obteve o dinheiro para comprar o luxuoso apartamento na Quinta Patino também é curiosa. A história começa em 2015 quando o pai, que é o presidente da ANTRAL, comprou todos os imóveis herdados por João Rendeiro depois da morte dos pais deste: duas casas em Lisboa e dois terrenos no concelho de Murtosa.

Uma dessas casas que o patrão da ANTRAL, alegadamente, adquiriu e que fica em Campo de Ourique, em Lisboa, terá rendido a Rendeiro pouco mais de meio milhão de euros. O MP quer saber se o patrão da ANTRAL pagou efectivamente o valor ou se o dinheiro era na realidade do ex-banqueiro e foi um negócio simulado.

Três anos depois, no dia 11 Setembro de 2018, o casal Florêncio Almeida e Dolores Correia doou essa casa ao filho, Florêncio Correia de Almeida, que no dia seguinte a vendeu a uma empresa denominada Turtle Quotidian por 1,4 milhões de euros.

Foi esse valor que o filho do presidente da ANTRAL usou para comprar o tal apartamento na Quinta Patino e mais uma propriedade no Alentejo, em Alcáçovas, que também já foi alvo das buscas da PJ em Novembro do ano passado.

Já João Rendeiro continua detido na África do Sul, onde aguarda pelo início do julgamento, marcado para Junho, onde vai ser decidido se é ou não extraditado para Portugal.