Sofrimento não acaba com fim da pandemia, avisa coordenador do gabinete de crise da covid-19 da ordem dos psicólogos

Tiago Pereira diz que neste processo de sequelas psicológicas relacionadas com a pandemia, as mulheres são um dos grupos mais vulneráveis. A seguir são os jovens.

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Tiago Lopes/Arquivo

A pandemia de covid-19, pode estar perto do fim, mas vai continuar a causar sofrimento e os problemas psicológicos permanecerão durante muito tempo, alerta o psicólogo Tiago Pereira. Dois anos depois do início da pandemia, quando as restrições estão de novo a ser aliviadas, e que especialistas admitem que o fim da pandemia está próximo, o coordenador do gabinete de crise covid-19 da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) avisa: não se julgue que tudo volta ao normal com o fim da pandemia. Nesta quarta-feira, passam dois anos sobre a primeira morte por covid-19 em Portugal.

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A pandemia de covid-19, pode estar perto do fim, mas vai continuar a causar sofrimento e os problemas psicológicos permanecerão durante muito tempo, alerta o psicólogo Tiago Pereira. Dois anos depois do início da pandemia, quando as restrições estão de novo a ser aliviadas, e que especialistas admitem que o fim da pandemia está próximo, o coordenador do gabinete de crise covid-19 da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) avisa: não se julgue que tudo volta ao normal com o fim da pandemia. Nesta quarta-feira, passam dois anos sobre a primeira morte por covid-19 em Portugal.

As consequências da pandemia não terminam quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarar o fim da pandemia”, afirma o responsável, acrescentando que depois virão os “lutos não resolvidos”. E contextualiza: “Estivemos numa crise muito significativa e as energias vão-se esgotando. A capacidade de adaptação não é ilimitada. Foi muito tempo a viver em incerteza.”

Tiago Pereira salienta que neste processo de sequelas psicológicas relacionadas com a pandemia, as mulheres são um dos grupos mais vulneráveis, porque mais expostas a factores de risco. E os jovens também, acrescenta, explicando que muitos viram interrompido o percurso natural de viver com os pais e depois tornarem-se autónomos, engrossando hoje os números da geração “nem-nem” — nem a estudar nem a trabalhar, que em 2018 representavam 12% dos jovens portugueses.

O responsável insiste na necessidade de não se pensar que com o fim da pandemia “será tudo um mar de rosas” nem que todos os problemas se resolvem. “Terminando a pandemia mantém-se algum tipo de sofrimento” e esse “fim” tem de ser muito bem explicado, porque “o pior que pode acontecer é dizer que acabou tudo sem uma certeza científica disso”, alerta o responsável, dizendo que já com a vacinação se criou a ilusão de que tudo terminaria, o que não aconteceu.

“Fomos capazes de resistir durante dois anos de pandemia, estamos a ser desafiados na capacidade de nos adaptar e temos de estar preparados para alterações”, continua o psicólogo, salientando como factor “muito positivo” o nível de confiança dos portugueses nas instituições, o que foi demonstrado na grande adesão às vacinas.

Confiança nas instituições

Ana Patrícia Hilário, socióloga, investigadora auxiliar no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, concorda. Esta adesão deve-se em primeiro lugar “ao elevado grau de confiança nas instituições de saúde e nos profissionais de saúde”, diz. E reforça que a confiança nas instituições é baseada em dados quantitativos. Portugal é dos países com mais confiança nas instituições de saúde e nos profissionais de saúde.

A socióloga, que integra um projecto de âmbito europeu, que começou antes do surgimento do novo coronavírus, sobre a hesitação perante a vacina (projeto VAX.TRUST), seja o adiamento seja a recusa. Além de Portugal fazem parte a Finlândia, Bélgica, Polónia, República Checa, Itália e Reino Unido. “A Comissão Europeia já tinha (antes da covid-19) esta preocupação com a recusa da vacinação”, pelo que surge a proposta de um projecto para tentar compreender melhor o processo, contextualiza. “O que sabemos é que Portugal já tem uma taxa de cobertura vacinal de cerca de 90%, com imunidade de grupo para várias doenças. E sucedeu o mesmo com a covid-19”, acrescenta.

Ana Hilário salienta que para estes resultados, e para a confiança nas instituições, há razões históricas. “As gerações mais velhas lembram-se de como era antes de se iniciar a vacinação em Portugal. Recordam-se de doenças como sarampo, tuberculose, e percebem as consequências, que incluem a morte”, aponta.

E essa confiança nas instituições está aliada a outra característica da sociedade portuguesa, “de coesão para o bem comum”, continua. “Somos mais ‘familiaristas’ do que individualistas, ao contrário de países como o Reino Unido. Esta coesão quando existem crises tem a ver com uma cultura própria”, salienta.

Apesar de a socióloga admitir que as pessoas sentem “algum peso” em relação à duração da pandemia, também aponta que os portugueses se têm adaptado e que têm sido uma “sociedade muito resiliente”, que quer levar “isto a bom porto”, o que se sente na forte adesão às vacinas. “É normal a adaptação, mas tem a ver com características históricas em que somos adaptáveis. Quando nos mudam as regras adaptamo-nos, a História mostra-nos isso, Portugal sempre foi um país rural e na ruralidade há sempre grande adaptabilidade”, conclui.