Covid-19: número de mortes no mundo será três vezes superior ao registado e o dobro em Portugal
Estudo corrige número de mortes por covid-19 estimando que mais de 18 milhões de pessoas morreram em todo o mundo, bem mais do que as quase seis milhões de vítimas mortais registadas até fina de 2021. No caso de Portugal, cientistas sugerem que morreram mais de 40 mil pessoas no período em que se contaram oficialmente 19 mil óbitos.
A covid-19 terá provocado 18,2 milhões de mortes no mundo até 31 de Dezembro, cerca de três vezes mais do que os números oficiais, estima um estudo publicado esta sexta-feira na revista científica The Lancet. No cálculo apresentado para Portugal, em vez de 19 mil óbitos registados, os investigadores referem que, afinal, podem ter morrido mais de 40 mil pessoas (de 38 mil a um máximo de 42 mil, de acordo com o intervalo de confiança de 95%).
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A covid-19 terá provocado 18,2 milhões de mortes no mundo até 31 de Dezembro, cerca de três vezes mais do que os números oficiais, estima um estudo publicado esta sexta-feira na revista científica The Lancet. No cálculo apresentado para Portugal, em vez de 19 mil óbitos registados, os investigadores referem que, afinal, podem ter morrido mais de 40 mil pessoas (de 38 mil a um máximo de 42 mil, de acordo com o intervalo de confiança de 95%).
“Apesar de terem sido reportadas, entre 1 de Janeiro de 2020 e 31 de Dezembro de 2021, um total de 5,94 milhões de mortes, estimamos que 18,2 milhões morreram em todo o mundo devido à pandemia de covid-19 - medida pelo excesso de mortalidade – durante esse período”, adianta a investigação já revista por pares.
Em relação a Portugal, actualmente contam-se já mais de 21 mil mortes. Porém, no período analisado neste estudo, o número oficial de óbitos não chegava ainda às 20 mil mortes. O trabalho corrige este número duplicando-o. Assim, a equipa de cientistas fala num excesso de mortalidade que ultrapassa as 40 mil mortes.
A taxa de mortalidade reportada em Portugal situava-se nas 94,8 mortes por 100 mil habitantes (em todo o mundo é de 39,2 e na região da Europa Ocidental de 94,7). Porém, mais uma vez corrigidos estes dados oficiais para as estimativas apresentadas neste trabalho de investigação, o estimado excesso da taxa de mortalidade é de 202 mortes por 100 mil habitantes (no mundo terá sido de 120 e na Europa Ocidental de 140). Portugal surge assim acima da média mundial e da Europa ocidental nos dois indicadores (mortalidade estimada e excesso de morte por 100.ooo habitantes), mas há países a nível mundial em situação muito pior. Na região da Europa Ocidental foram registadas 796 mil mortes, mas a equipa de investigadores estima um excesso de mortalidade que ultrapassa um milhão de vítimas.
Sete países com metade das mortes
A investigação avança ainda que as taxas de mortes em excesso variaram amplamente entre regiões, embora o número de óbitos resultantes da pandemia tenha sido muito maior particularmente no Sul da Ásia e na África subsariana do que os registos oficiais indicam. “Estima-se que o excesso de mortalidade seja de 120 mortes por 100.000 habitantes em todo o mundo e que 21 países tenham taxas de mais de 300 mortes em excesso por 100.000 habitantes”, adiantam os especialistas.
As maiores taxas estimadas de mortes em excesso registaram-se na América Latina (512 mortes por 100.000 habitantes), Europa Oriental (345 mortes), Europa Central (316), África subsariana do Sul (309) e América Latina Central (274). Em sentido contrário, os dados publicados na The Lancet indicam que alguns países tiveram menos mortes do que o esperado com base nas tendências de mortalidade em anos anteriores, caso da Islândia (48 mortes a menos por 100.000), a Austrália (38 mortes) e Singapura (16).
Ao nível dos países, o maior número estimado de mortes em excesso ocorreu na Índia (4,1 milhões), EUA (1,1 milhão), Rússia (1,1 milhão), México (798 mil), Brasil (792 mil), Indonésia (736 mil) e Paquistão (664 mil).
“Esses sete países podem ter sido responsáveis por mais da metade das mortes em excesso globais causadas pela pandemia durante o período de 24 meses”, refere. A distinção entre os óbitos causados directamente pela covid-19 e aqueles que ocorreram como resultado indirecto da pandemia é crucial, salientam os autores da investigação.
O verdadeiro número de mortes
O comunicado de imprensa avança que “as grandes diferenças entre o excesso de mortes e os registos oficiais podem ser o resultado de um subdiagnóstico devido à falta de testes e a problemas com a comunicação de dados de mortes”. “Até à data, apenas 36 países divulgaram dados sobre a causa de morte para 2020. À medida que os dados de mais países fiquem disponíveis, será possível determinar melhor quantas mortes em excesso foram devidas directamente à covid-19 e quantas ocorreram como resultado indirecto da pandemia ou das respostas à mesma.”
“Entender o verdadeiro número de mortes da pandemia é vital para uma tomada de decisão eficaz em saúde pública. Estudos de vários países, incluindo a Suécia e os Países Baixos, sugerem que a covid-19 foi a causa directa da maioria das mortes em excesso, mas actualmente não temos dados suficientes para a maioria dos locais”, adiantou Haidong Wang, do Institute for Health Metrics and Evaluation e autor principal do estudo.
O excesso de mortes – a diferença entre o número de mortes registadas por todas as causas e o número esperado com base nas tendências do passado – é uma medida-chave do verdadeiro número de mortes da pandemia, explica o comunicado sobre o trabalho, que nota também que, “embora tenha havido várias tentativas para estimar o excesso de mortalidade da covid-19, a maioria tem sido limitada no âmbito geográfico pela disponibilidade de dados”. Este estudo tenta reparar essa lacuna e “fornece as primeiras estimativas revistas por pares de mortes em excesso devido à pandemia a nível mundial e para 191 países e territórios (e 252 locais subnacionais, tais como Estados e províncias) entre 1 de Janeiro de 2020, e 31 de Dezembro de 2021”.
A equipa refere ainda que os dados semanais ou mensais sobre mortes por todas as causas em 2021, 2020, e até 11 anos anteriores foram obtidos para 74 países e 266 Estados e províncias através de pesquisas nos websites de governos, na Base de Dados Mundial da Mortalidade, na Base de Dados da Mortalidade Humana, e no Gabinete Europeu de Estatística. “Os dados foram utilizados em modelos para estimar o excesso de mortalidade devido à pandemia da covid-19, incluindo para locais sem comunicação semanal ou mensal de dados sobre a morte.”
Os autores admitem que o estudo tem várias limitações. “Foi utilizado um modelo estatístico para prever o excesso de mortes em países que não reportaram dados semanais ou mensais sobre mortes por todas as causas”, afirmam, salientando a necessidade de medições mais precisas nestes locais. Por outro lado, os autores explicam que “as estimativas de mortes em excesso foram calculadas apenas para o período completo do estudo, e não por semana ou mês, devido a atrasos e inconsistências na comunicação de dados de mortes covid-19 que poderiam alterar drasticamente as estimativas”.
Os actuais dados oficiais referem que a covid-19 provocou já mais de seis milhões de mortes em todo o mundo desde o início da pandemia, segundo o mais recente balanço da agência France-Presse. A doença é provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, detectado no final de 2019 em Wuhan, cidade do centro da China. A variante Ómicron, que se dissemina e sofre mutações rapidamente, tornou-se dominante no mundo desde que foi detectada pela primeira vez, em Novembro, na África do Sul.