Putin ameaça congelar bens ou nacionalizar empresas que saiam da Rússia
Kremlin vai permitir à justiça russa nomear gestores estatais para firmas com mais de 25% de capital estrangeiro que aderiram ao êxodo empresarial.
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Moscovo ameaçou nesta quinta-feira as empresas estrangeiras que ou ficam na Rússia ou podem ser obrigadas a entregar as chaves.
“A respeito daqueles que planeiam encerrar actividades, temos de agir de forma determinada”, disse o Presidente Vladimir Putin, durante uma reunião com o governo russo. Centenas de empresas anunciaram a suspensão das actividades deste país desde que começou a invasão da Ucrânia.
“De modo algum podemos permitir que se prejudique os fornecedores locais. É necessário introduzir gestão externa e depois transferir estas empresas para aqueles que efectivamente querem trabalhar”, prosseguiu Putin, segundo relata o Financial Times.
O líder do Kremlin acredita, aliás, que “nem é preciso actuar de forma arbitrária”. “Há suficientes instrumentos legais e de mercado; encontraremos soluções legais”, completou.
Putin aconselhou, porém, a que se respeitem os direitos dos investidores estrangeiros que quiserem ficar e que se proteja quem continuar a trabalhar na Rússia. Admitindo que as sanções tiveram impacto, mostrou-se confiante num ajustamento da economia russa ao longo do tempo. E asseverou que a Rússia teria sido alvo de sanções mesmo sem guerra na Ucrânia, garantindo ainda que o país continuaria a satisfazer as suas obrigações contratuais no fornecimento de energia, noticia o mesmo jornal inglês.
Mais suspensões do que saídas
O mundo das marcas dá conta de um “êxodo” de empresas internacionais da Rússia. A lista compilada pela escola de gestão de Yale (EUA) é actualizada a cada hora e já tem mais de 300 nomes, mas mostra que poucas são as que já decidiram sair mesmo do país.
Entre as que se vão embora estão consultoras como Deloitte, Accenture, KPMG. O grupo Kering, dono de um império de artigos de luxo, mandou apenas fechar as lojas. No entanto, a maior parte dos nomes dessa lista optou por suspender total ou parcialmente a actividade, seja comercial ou produtiva.
Para Moscovo, no entanto, trata-se tudo de retaliações económicas às quais tem de responder. O ministério da Economia já terá esboçado orientações para um diploma que permitirá à Rússia assumir o controlo temporário de empresas em que mais de 25% do capital esteja em mãos estrangeiras e que se recusam a trabalhar.
Segundo esta proposta, noticiada pela agência Bloomberg, o Estado russo entraria a pedido das próprias empresas: os administradores representativos de capital detido por russos pediriam a um tribunal a nomeação de gestores externos, o tribunal poderia então congelar as acções detidas por estrangeiros, como medida para preservação da propriedade dos activos e protecção dos trabalhadores.
Os gestores externos poderiam ser do banco de fomento russo, o VEB.RF (detido pelo Estado), segundo fonte do ministério russo da Economia citada por aquela agência.
Os donos dessas empresas teriam então cinco dias para retomar a actividade ou optar por outra saída, como vender as acções. O ministério da Economia sugere, por isso, que a prioridade é convencer os estrangeiros a vender activos e não tanto a nacionalização. Ainda que sublinhe que “o objectivo desta lei é encorajar as organizações sob controlo estrangeiro a manterem as suas actividades no território da Federação Russa.”
Mas o ex-presidente da Rússia Dmitri Medvedev deu indicações de que o cenário mais extremo também está em cima da mesa. “O governo russo já está a trabalhar em medidas que incluem a falência e a nacionalização de activos” de empresas estrangeiras que forçaram a sua saída, garantiu Medvedev, numa mensagem publicada na rede social russa VK.
"Decisão estúpida"
Medvedev considera o êxodo empresarial uma “decisão estúpida”, acusando os “russófobos de mente fechada” de não se preocuparem com as consequências. “Pessoas na Europa e na Rússia podem perder os seus empregos e o rendimento por decisões estúpidas contrárias ao senso comum”, lê-se na longa mensagem em que promete: “Responderemos a isso de forma dura.”
Medvedev invocou ainda a vontade russa de impor ao Ocidente “sanções simétricas” às que estão a ser impostas à economia russa e considerou “justa e objectiva” a intervenção legislativa que permitirá a Moscovo tomar conta dos activos que venham a ser abandonados por “gestores em pânico” e que “cedem às pressões” de governos ocidentais.
No texto que termina com uma saudação irónica a uma das empresas que suspenderam a sua actividade ("Olá, McDonald's"), Medvedev argumenta ainda que quem sair agora “vai demorar muito tempo” a regressar ao mercado russo. “Afinal, costeletas e pãezinhos, e de excelente qualidade, produzimos e sabemos fazer.”
Também há quem fique
Na lista de Yale, há pelo menos uma empresa com ligações portuguesas. Trata-se da Farfetch, referida como uma das que suspenderam o envio de encomendas. Entre empresas que fecharam, suspenderam a actividade/vendas ou travaram novos investimentos, a lista inclui multinacionais muito conhecidas, como Ikea, Renault, Philip Morris, Puma, Rolls Royce, Scania, LVMH, Lego ou Levi Strauss, Alcoa, Apple ou BlackRock e JP Morgan. Isto, além de muitos outros nomes que têm vindo a público, incluindo sectores tão diversos como a tecnologia e electrónica de consumo, o petróleo/a energia e os serviços financeiros.
Mas Yale também fez uma lista com algumas dezenas de empresas que se mantêm na Rússia e que apresentam “uma exposição significativa”. São disso exemplo os hotéis Accor, Marriott e Intercontinental, a Haliburton, a Herbalife, a Pirelli, a Schlumberger, o Citi, a Cloudflare, a Ferragamo e a Subway, para nomear apenas alguns.
A Burger King, grande rival da McDonald's no fast food, ainda constava desta segunda lista, mas por volta das 17h em Portugal continental soube-se que esta multinacional decidiu travar o apoio empresarial aos 800 franchisados que tem na Rússia.