Bruxelas avança com propostas para reduzir dois terços da procura de gás russo até ao fim do ano
“A Europa tem quantidades suficientes de gás para as semanas de Inverno que ainda restam”, sublinha a comissária europeia com a pasta da Energia, Kadri Simson.
A Comissão Europeia acredita que, até ao final deste ano, os 27 estarão em condições de reduzir em dois terços a sua procura de gás natural importado da Rússia, através de uma diversificação das suas fontes de abastecimento e dos seus fornecedores, e da substituição do combustível fóssil utilizado no aquecimento e na produção de energia por gases renováveis.
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A Comissão Europeia acredita que, até ao final deste ano, os 27 estarão em condições de reduzir em dois terços a sua procura de gás natural importado da Rússia, através de uma diversificação das suas fontes de abastecimento e dos seus fornecedores, e da substituição do combustível fóssil utilizado no aquecimento e na produção de energia por gases renováveis.
“A guerra de Putin na Ucrânia veio demonstrar a urgência de resolver as nossas vulnerabilidades e acelerar a nossa transição para as energias limpas. Ficou perfeitamente claro que somos demasiados dependentes da Rússia para satisfazer as nossas necessidades energéticas”, lamentou o vice-presidente executivo da Comissão Europeia e responsável pela pasta da Acção Climática, Frans Timmermans, salientando que não se pode falar em mercado livre quando existe um actor estatal a manipular o abastecimento com objectivos geopolíticos.
No entanto, a União Europeia (UE) tem capacidade para reagir imediatamente à pressão. “Não será fácil, mas podemos reduzir já este ano as importações de gás natural proveniente da Rússia em dois terços”, garantiu Timmermans, que apresentou um plano para a substituição de 100 mil milhões de metros cúbicos de gás natural da Rússia, ou seja quase 70% do volume que foi importado em 2021, até ao final deste ano.
“É possível, se estivermos disponíveis para ir mais longe e mais depressa do que até agora” na diversificação do abastecimento, com mais gases renováveis e principalmente mais gás natural liquefeito (GNL), e no aumento da produção e importação de hidrogénio verde, explicou o vice-presidente executivo da Comissão.
Numa conferência de imprensa no final da reunião do colégio de comissários, em Estrasburgo, Timmermans revelou os cálculos da Comissão. “Com mais importações de GNL, podemos substituir 60 mil milhões de metros cúbicos de gás natural russo nos próximos doze meses. Com a duplicação da produção sustentável de biometano, podemos substituir mais 18 mil milhões de metros cúbicos, utilizando a Política Agrícola Comum para ajudar os agricultores a converterem-se em produtores de energia”, disse.
As outras duas medidas passam pela substituição do gás natural por gases renováveis, e pelo aumento da produção e importação de hidrogénio verde — que terá de ser combinado com o desenvolvimento da infra-estrutura de armazenamento e distribuição (as interconexões que Portugal há muito reclama) para que todos os Estados-membros possam ter acesso garantido a este combustível. “Vinte milhões de toneladas de hidrogénio verde podem substituir 50 mil milhões de metros cúbicos de gás russo”, observou Timmermans.
De acordo com o vice-presidente executivo da Comissão, seria possível ir ainda mais longe, com a instalação de “muitos milhões de painéis fotovoltaicos nos telhados” e a duplicação da instalação de bombas de calor. “No fim deste ano, quase 25% da produção de energia da UE pode ser solar”, estimou.
Estas medidas imediatas são apenas a primeira etapa do plano mais vasto que visa tornar a Europa completamente independente das exportações de energia da Rússia até 2030, que Comissão Europeia apresentou esta terça-feira pela Comissão Europeia para ser discutido pelos chefes de Estado e governo da UE numa reunião informal do Conselho Europeu, na quinta e sexta-feira, em Versalhes.
A Rússia é o principal fornecedor de combustíveis fósseis à UE: além de 45% do gás natural (os 27 importam 90% do gás que consomem), 45% das importações de carvão e 25% das importações de petróleo são provenientes do país governado por Vladimir Putin.
O plano para quebrar essa dependência da Rússia passou agora a ter uma dimensão geopolítica e de segurança que não tinha quando começou a ser preparado. O programa RePowerEU enquadra-se na estratégia de transição energética da UE para cumprir a sua meta de redução até 55% das emissões de CO2 até 2030 — que passa pela promoção da eficiência energética dos edifícios e unidades industriais, da produção de energias renováveis e resolução de estrangulamentos nas infra-estruturas de distribuição e armazenamento a nível europeu.
Segundo as contas de Frans Timmermans, com a implementação da estratégia “Fit for 55”, a UE reduzirá o seu consumo anual de gás em 30% antes do fim desta década., “Isso são menos 100 mil milhões de metros cúbicos de gás por ano que não vamos precisar de utilizar”, referiu.
Abastecimento está garantido
No actual quadro de instabilidade e subida de preços, e receios de escassez de combustíveis, a comissária europeia com a pasta da Energia, Kadri Simson, garantiu que o bloco dispõe de reservas de gás natural suficientes para ultrapassar a temporada do frio sem correr riscos de ruptura no abastecimento por causa da guerra na Ucrânia.
Ainda assim, já foram desenhados planos de planos de contingência para o caso de ocorrer uma interrupção parcial ou total do fornecimento de gás natural (ou ainda de petróleo) por parte da Rússia. Essa será uma decisão de Vladimir Putin e não dos parceiros europeus: os dois membros da Comissão repetiram esta terça-feira que não está por enquanto nos planos de Bruxelas avançar com um embargo ou proibição das importações de hidrocarbonetos da Rússia, como fizeram alguns dos seus parceiros internacionais.
“A Europa tem quantidades suficientes de gás para as semanas de Inverno que ainda restam, mas precisamos de reconstituir as nossas reservas urgentemente para o próximo ano”, afirmou a comissária da Energia, que apontou como objectivo o preenchimento de pelo menos 90% da capacidade de armazenamento até ao próximo dia 1 de Outubro.
Segundo Kadri Simson, o executivo avançará já em Abril uma proposta legislativa para assegurar que os Estados-membros preenchem as suas reservas até atingir os 90% de capacidade e também para identificar as unidades de armazenamento como “infra-estruturas críticas” da UE. Essa é uma medida cautelar, uma vez que algumas destas unidades estão nas mãos de entidades russas como a Gazprom, que de acordo com números avançados pelo Financial Times estão actualmente abaixo dos 20% da sua capacidade.
Os dois membros da Comissão disseram ainda que Bruxelas está disponível para apoiar a aquisição conjunta de gás natural pelos Estados-membros.