Nas profundezas de Hugo Canoilas vemos o quão maravilhosos são os outros seres
Em Moldada na Escuridão, no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, em Lisboa, Hugo Canoilas convida-nos a entrar num mundo povoado de objecto-seres, esculturas-pinturas, formas que replicam medusas, águas-vivas, seres marinhos lumíneos. Colocando-nos num tempo em que o fluxo da vida na Terra se fazia sem os seres humanos.
Nas últimas páginas de A Condição Humana, depois de tecer um diagnóstico pouco optimista da era moderna, Hannah Arendt afirma que “os homens persistem em fabricar, fazer e construir, embora estas faculdades se limitem cada vez mais aos talentos do artista”. É este facto que assoma ao espírito logo que entramos na exposição Moldada na Escuridão de Hugo Canoilas (Lisboa, 1977), com a curadoria de Rita Fabiana, no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, em Lisboa. No interior da galeria está escuro. Não se vê nada, com excepção de coisas colocadas no chão, iluminadas por focos de luz. Os visitantes param, observam, comentam espantados. Nas palavras da curadora, no texto do catálogo, aquelas coisas são “formas vivas, híbridas e estranhas”, “animais fantasmáticos e espectrais que habitam finalmente o nosso presente, tornados visíveis pela tecnologia”. Entretanto, os nossos olhos já se habituaram à escuridão e as criaturas são, afinal, feitas de vidro, resina acrílica, têxteis. Algumas estão em receptáculos, quais poças ou conchas abertas. E todas pedem que abandonemos a posição vertical do corpo, convidando-nos a uma horizontalidade. Afinal, há algo na exposição que replica um lugar que podemos explorar com o corpo todo: um oceano imaginado, anterior aos humanos, precisamente aquele onde o artista moldou as suas formas.