Rússia usou armas de fragmentação em Kharkiv, diz perito da Human Rights Watch
Cidade considerada tradicionalmente próxima de Moscovo e com uma maioria de falantes de russo foi alvo de ataque em zonas civis, densamente povoadas.
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O Exército russo usou explosivos de fragmentação, que matam indiscriminadamente, em zonas residenciais densamente povoadas em Kharkiv, segundo a Human Rights Watch. Isto aconteceu um dia depois de as tropas russas entrarem na cidade, num ataque repelido pelas forças ucranianas.
O uso de explosivos de fragmentação é especialmente problemático porque não só não é possível prever o que atingem, como deixam muitos pequenos explosivos normalmente não detonam logo, mantendo-se nos locais e representando um perigo especial para civis muito depois até dos disparos.
Mark Hiznay, vice-director do departamento de armas da Human Rights Watch, declarou ao jornal norte-americano The Washington Post que segundo as imagens que viu do ataque a Kharkiv, cidade de quase um milhão e meio de habitantes, o Exército russo usou rockets Smerch com munições de fragmentação. “Este ataque mostra claramente a natureza inerentemente indiscriminada das munições de fragmentação, e deve ser condenado inequivocamente”, disse.
O uso deste tipo de armas é consistente com alguns relatos do local. Olga, citada pelo Financial Times, conta como ouviu rockets a cair perto de si quando estava numa mercearia. “Comecei a ver estilhaços a voar”, descreveu. “Pensei que tinham abatido um avião, foi ensurdecedor.”
“Os russos rodearam Kharkiv e estão a bombardear tudo”, disse Sasha Grinshpun, que fugiu da cidade mas manteve contacto com amigos e familiares apanhados no bombardeamento. Com um atraso em chegar a Kiev e a dificuldade dos militares em tomar cidades como Kharkiv, a segunda maior da Ucrânia, temia-se que a estratégia fosse de cercar os locais e de intensificar os ataques, aumentando o risco de vítimas civis. A cidade de Kharkiv tinha repelido, na véspera, um ataque russo significativo.
Esta segunda-feira, a comissária dos Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet, disse que morreram pelo menos 102 civis desde o início da invasão na quinta-feira passada, e que 304 ficaram feridos, embora o número real seja consideravelmente mais alto”, declarou.
Já na véspera a Amnistia Internacional apontava o facto de ataques indiscriminados da Rússia terem atingido hospitais e infra-estruturas que devem ser poupadas segundo o direito internacional humanitário. O Crisis Evidence Lab da organização de defesa dos direitos humanos analisou com provas digitais três ataques logo nas primeiras horas da invasão e detectaram o uso de mísseis balísticos e outras armas de longo alcance em zonas densamente povoadas.
A Amnistia criticou o Governo russo por alegar, falsamente, que apenas usa armas de precisão. “Alguns destes ataques podem ser crimes de guerra”, disse a secretária-geral da AI, Agnès Callamard.
Quanto ao ataque de Kharkiv, o uso das munições de fragmentação e a ferocidade do ataque é especialmente difícil de aceitar por alguns porque a cidade, em que predominam os falantes de russo, era considerada mais próxima de Moscovo. “Esta é uma região em que se fala russo”, disse um médico que não quis ser citado, depois de contar que não conseguiu salvar uma rapariga de 17 anos atingida por um estilhaço. “Toda esta situação parece irreal, parece que estamos a sonhar.”
“O inimigo russo está a disparar contra zonas residenciais de Kharkiv, onde não há infra-estrutura importante, não há posições das Forças Armadas que pudessem ter como alvo”, disse o responsável pela administração estatal da cidade, Oleh Sinehubov, citado pelo Washington Post. Estes ataques são “crimes de guerra”.
“A situação é difícil, mas Kharkiv está a aguentar-se”, disse pelo seu lado o presidente da câmara da cidade, Ihor Terekhov.