O exercício aumenta o apetite?
Melhorar o que se come antes e após o treino é prioritário, tendo sempre em conta que treinos de baixa intensidade sem um estímulo final, ou treinos feitos a temperaturas muito baixas são sempre os mais “perigosos” quanto a um efeito pernicioso no apetite.
Esta é uma questão complexa e que depende de muitos factores, mas que de modo muito pragmático pode ser resumido da seguinte forma: grande parte das vezes não aumenta o apetite; e mesmo nas circunstâncias em que pode aumentar é sempre melhor do que continuar sedentário.
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Esta é uma questão complexa e que depende de muitos factores, mas que de modo muito pragmático pode ser resumido da seguinte forma: grande parte das vezes não aumenta o apetite; e mesmo nas circunstâncias em que pode aumentar é sempre melhor do que continuar sedentário.
Feita a sinopse, podemos então detalhar quais os factores que podem determinar o efeito do exercício físico no apetite.
Em primeiro lugar a intensidade do mesmo. Quando falamos do efeito agudo (30 a 60 minutos) após um exercício mais intenso (acima dos 60% VO2 máx), o apetite tende a diminuir e algumas hormonas envolvidas na regulação do apetite também se modificam favoravelmente, com o aumento das mais “saciantes” (PYY, GLP-1, PP) e uma diminuição ou manutenção das mais “esfomeantes” (Grelina).
A maior produção de lactato, reflexo da maior demanda metabólica e energética também exerce um papel positivo na supressão do apetite em resposta ao treino. Este papel positivo do exercício no apetite, ocorre quer em indivíduos com peso normal quer naqueles com excesso de peso e obesidade e apesar de grande parte dos trabalhos ter sido feito em homens, parece que as mulheres exibem respostas semelhantes no que ao efeito supressor do exercício no apetite diz respeito.
Uma vez que estes efeitos são visíveis em treinos mais intensos (mais “cardio”) do que com treino de força (“musculação”), pode ser uma boa ideia terminar um treino de musculação “padrão” com um circuito/desafio/WOD de modo a conseguir ter o melhor dos dois mundos na gestão da massa gorda/massa muscular/apetite. A prática de exercício físico de forma crónica tem igualmente o benefício de melhorar a regulação do apetite a longo prazo. Indivíduos com elevados níveis de atividade física possuem uma melhor sensibilidade do sistema de controlo do apetite compensando melhor a nível alimentar a ingestão de alimentos excessivamente calóricos.
A temperatura à qual é realizado o exercício é outro factor importante na regulação ao apetite. A evidência demonstra que a exposição ao frio tende a aumentar a ingestão calórica, enquanto a exposição ao calor tende a diminuí-la devido a alterações nas concentrações de hormonas envolvidas na regulação do apetite e saciedade. Uma das situações mais comuns que reflecte na prática esta situação é o aumento do apetite após um treino de natação (em água fria), existindo um trabalho que verificou um aumento de 44% (350 kcal) na ingestão calórica após 45 min de hidrobike quando esta foi realizada a 20ºC em comparação com quem realizou esse treino a 33ºC.
Ou seja, esta diminuição da temperatura corporal durante e após o exercício pode não ser a melhor amiga da manutenção do apetite e sendo certo que o benefício intrínseco da prática de exercício está lá presente, correr na rua em dias mais frios ou nadar numa piscina com água fria, pode gerar uma resposta compensatória na alimentação não muito favorável à gestão do peso.
Passando do contexto da investigação científica para a forma como cada pessoa faz a gestão do exercício e apetite no seu quotidiano, fica claro que existem muito mais benefícios na existência de treino regular, mesmo que tal não conduza à diminuição do apetite/emagrecimento por ser totalmente compensado pela alimentação. Ou seja, é melhor treinar diariamente e ingerir essas 300-600 kcal adicionais não havendo reflexo na massa gorda, do que manter esse balanço energético em modo “sedentário”.
Para alguém que tenha começado a treinar recentemente e sinta que a prática de exercício aumentou o apetite, há sempre uma análise a fazer. Qual o tipo de treino, a que horas está a ser feito, o que está a ser ingerido antes e depois e em que momento esse aumento do apetite se manifesta. A partir daí, existe uma série de mudanças que podem ser feitas no sentido de atenuar esse aumento do apetite e não existir uma sobrecompensação alimentar das calorias gastas no treino.
Um padrão que se repete variadas vezes é o de pessoas que treinam ao final da tarde após um dia de trabalho não lanchando devidamente, fazendo com que após o treino, o jantar seja caótico ao nível das quantidades ingeridas. Eventualmente, antes de começarem a treinar estariam já em casa nesse final de tarde a petiscar qualquer coisa antes de jantar o que faria com que não se notasse tanto esse apetite voraz ao final do dia.
Nestes casos e em muitos outros semelhantes, o treino é o menos culpado e aquele que deve a todo o custo ser mantido. Melhorar o que se come antes e após o treino é prioritário, tendo sempre em conta que treinos de baixa intensidade sem um estímulo final, ou treinos feitos a temperaturas muito baixas são sempre os mais “perigosos” quanto a um efeito pernicioso no apetite. Saber disso à partida e controlar essas variáveis é fundamental pois o único mau treino foi aquele que não aconteceu.