Também há saúde mental em Erasmus
De todas as histórias que ouvi, nem uma única pessoa me disse que se sentiu assim, é sempre só a diversão, o conhecer novas pessoas, a oportunidade de viajar. Nunca é o sentir-se sozinho ao início, as saudades de casa, o medo de que tudo corra mal.
Sempre quis fazer Erasmus, achava interessante e uma oportunidade fantástica para aprender noutro país. Finalmente cheguei ao meu último ano da licenciatura e decidi ir para a linda cidade de Siena, em Itália. Os meus pais ficaram entusiasmados com a decisão, sempre tive o incentivo deles para sair de casa e explorar o mundo à minha volta. Acho que nunca estive tão entusiasmada para algo.
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Sempre quis fazer Erasmus, achava interessante e uma oportunidade fantástica para aprender noutro país. Finalmente cheguei ao meu último ano da licenciatura e decidi ir para a linda cidade de Siena, em Itália. Os meus pais ficaram entusiasmados com a decisão, sempre tive o incentivo deles para sair de casa e explorar o mundo à minha volta. Acho que nunca estive tão entusiasmada para algo.
Mas à medida que o dia de partir ficava mais perto, começava a ponderar se tinha tomado a decisão certa, estava assustada por ir mudar-me temporariamente para outro país, longe de tudo e todos que conheço. Ia ser uma realidade completamente diferente daquela a que estou habituada e comecei a ficar assustada, tive que me esforçar para esconder isso das pessoas.
Depois chegou o dia e estava indecisa sobre o que sentir. Felicidade? Nervosismo? Quando aterrei, descobri. Senti medo, ansiedade, nervosismo, arrependimento. Não sei se foi só a mim que aconteceu, mas nunca me tinha sentido desta forma e não gostei. Tive que respirar fundo muitas vezes para não chorar. Devo dizer que me senti um pouco ridícula, sendo que a decisão de vir tinha sido apenas minha.
Todos estes sentimentos negativos não me deixavam ver o que me rodeava, e comecei a pensar se estava apenas a complicar tudo porque via a minha outra colega à vontade com tudo, com uma confiança que naqueles momentos invejei mais do que tudo. E, em cima de tudo isto, só conseguia pensar que se permitisse que todos estes sentimentos se apoderassem de mim iria sentir-me sempre mal e colocar-me numa posição difícil. Foi um desafio à minha saúde mental. E o pensamento de vergonha em pedir ajuda se realmente viesse a precisar? Seria a rapariga ridícula que ficou com medo de ter vindo de Erasmus, a parva que já é maior e vacinada e tem medo de ficar longe dos pais, longe de tudo que gosta e a faz sentir ela própria? Mas não, ridículo é eu achar que pedir ajuda para lidar com a minha saúde mental é vergonhoso.
Não é suposto sentir vergonha quando me sinto vulnerável e quando sinto que todo o meu mundo vai desabar só porque não consegui fazer uma coisa igual a tantos outros que conheço. Tive que puxar por mim própria, escondida no meu silêncio, e dizer-me para não ter medo e que as coisas vão correr bem se der uma verdadeira oportunidade a esta experiência. Custa-me mesmo muito estar longe de casa, mas já ajuda bastante falar praticamente todos os dias com os meus amigos, a minha família e o meu namorado, que têm sido um apoio fantástico. E um bom livro também ajuda sempre.
Sei que parece que um dia acordei e deixei de estar com medo, mas não, isso tinha eu gostado. Continuo com medo que nada corra como eu quero, que um dia pense demasiado nas saudades que tenho e comece a chorar. E custou sentir-me assim porque não vejo mais ninguém a dizer que uma das coisas marcantes do Erasmus foi, primeiro que tudo, o desafio à saúde mental.
Observo quem veio comigo para Siena e vejo muito do que senti, alguém que nos primeiros dias só sentia aventura e divertimento e, literalmente de um dia para o outro, foi-se abaixo. E sei que não são só saudades de casa. Os sinais e as acções dizem muito, o não comer diz muito, as longas horas de silêncio gritam, a falta de vontade para tudo e a cara de profunda tristeza. E o que fazer? Já disse que senti o mesmo, mas sei que não significa nada porque, na verdade, nunca ninguém se consegue sentir exactamente como nós. Só tenho quase a certeza de que há algo de vergonha nos sentimentos — ninguém quer admitir que se sente assim, especialmente em Erasmus. De todas as histórias que ouvi, nem uma única pessoa me disse que se sentiu assim, é sempre só a diversão, o conhecer novas pessoas, a oportunidade de viajar. Nunca é o sentir-se sozinho ao início, as saudades de casa, o medo de que tudo corra mal.
Mas não me interpretem mal, o Erasmus é realmente tudo de bom que disse anteriormente, mas também é mais do que isso. E ainda, claro, nem todos somos iguais, nem todos temos que ter saudades de casa ou o nervosismo de estar numa etapa nova. Mas também não é só sorrisos e memórias boas porque, sejamos sinceros, nunca nada corre 100% bem. Se assim fosse, o mundo seria perfeito.