Bloco pressiona Governo para saber se há russos sancionados pela UE com activos em Portugal

Em perguntas feitas ao executivo, os bloquistas questionam ainda “quantos dos indivíduos identificados” nas sanções europeias acederam ao regime de “vistos gold” ou de Residente Não Habitual e quantos desses cidadãos russos estão registados na Zona Franca da Madeira

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BE sempre criticou o regime dos "vistos gold"

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O Bloco de Esquerda fez entrar na tarde desta sexta-feira um conjunto de perguntas direccionadas ao Governo sobre várias dúvidas que subsistem quanto aos activos detidos em Portugal por cidadãos russos.

As perguntas assinadas pela deputada Mariana Mortágua e pelo líder parlamentar Pedro Filipe Soares começam por questionar o executivo socialista sobre se “já fez o cruzamento entre os nomes da lista de sanções oficiais da União Europeia e os detentores de activos em Portugal” e sobre “quais os nomes identificados e qual a natureza e o montante dos activos associados”.

“Quantos dos indivíduos identificados acederam ao regime de ‘vistos gold’ ou do Residente Não Habitual? Quais os seus nomes e os investimentos associados?”, pergunta a parlamentar do Bloco. Note-se que a lista dos beneficiários do regime de “vistos gold” não é pública.

Os deputados do BE querem ainda saber “quantos dos indivíduos identificados, e entidades a si associadas de forma directa ou indirecta, estão registados na Zona Franca da Madeira” e “quais os seus nomes”.

Por fim, Mortágua questiona também “que outros indivíduos ou entidades pertencentes ou ligados à oligarquia russa foram identificados através dos seus negócios e/ou detenção de bens em território português”, bem como “quantos acederam aos regimes de “vistos gold’ e Residentes Não Habituais e quantos estão associados a entidades na Zona Franca da Madeira”.

Estas perguntas dirigidas ao executivo liderado por António Costa, remetidas aos ministros dos Negócios Estrangeiros, das Finanças e da Economia e da Transição Digital, surgem depois de, esta sexta-feira, o PÚBLICO ter escrito que o Governo continua sem revelar se algum dos cerca de 400 cidadãos russos incluídos na lista de sanções aprovada pela UE é beneficiário do regime de autorização de residência para actividade de investimento (ARI) em Portugal, os chamados “vistos gold”.

E depois de na quinta-feira o ministro de Estado e dos negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, ter dito na reunião da comissão permanente da Assembleia da República que os cidadãos de nacionalidade russa residentes em Portugal ou beneficiários de “vistos gold” que sejam sancionados por Bruxelas ficarão “sujeitos à limitação de movimentos em Portugal e ao congelamento de activos financeiros”.

Ao PÚBLICO, a deputada Mariana Mortágua sustenta que “a imposição de sanções é dos instrumentos mais eficazes para atingir o regime de Vladimir Putin”. “Podem ser económicas, ou sanções que atinjam directamente a oligarquia russa com fortuna fora da Rússia”, prossegue.

Mortágua lamenta a demora entre o anúncio e a imposição das sanções e lembra que o hiato entre uma coisa e outra deu “tempo à oligarquia russa para transferir o seu património”.

A parlamentar bloquista nota que a Suíça já anunciou que não congelará as contas de cidadãos russos, não permitindo apenas que estes não façam novos depósitos, e que Itália negociou isenções às sanções para “continuar a exportar bens de luxo para a Rússia”. E conclui que o “regime de sanções anunciado de forma tão entusiástica e tão forte começa a ser uma manta de retalhos”.

Em concreto sobre as questões feitas ao Governo, Mariana Mortágua pretende esclarecer três dúvidas essenciais: “É preciso saber qual a permeabilidade da economia portuguesa relativamente a estes bens; garantir que toda essa elite financeira russa é identificada e os seus bens são congelados; e é importante compreender que mecanismos legais trouxeram esta oligarquia até aqui.”

“O Reino Unido acabou com os ‘vistos gold’ e nós devíamos fazer o mesmo”, remata.

Esta sexta-feira, a Lusa avançou, com base em dados fornecidos pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que o investimento com origem na Rússia captado pelo programa de “vistos gold” ascende, num período de nove anos, a um total superior a 277,8 milhões de euros (o proveniente da Ucrânia totaliza 32,5 milhões de euros).

Entre Outubro de 2012 e Janeiro de 2022, 431 cidadãos russos beneficiaram do regime de “vistos gold”, fazendo da Rússia o quinto país com mais beneficiários do regime de autorização de residência para actividade de investimento (ARI).

Nas perguntas feitas ao Governo, o partido liderado por Catarina Martins refere que “a necessidade de impor sanções exemplares à oligarquia russa requer exigência, transparência e escrutínio total, e não a hipocrisia que alimenta a escalada militar mas que protege os interesses financeiros que, directa ou indirectamente, suportam Vladimir Putin”.

Na última reunião da comissão permanente do Parlamento, Catarina Martins defendeu a retirada dos “vistos gold” aos oligarcas russos em Portugal.