Guerra Colonial: chorar como homens crescidos

Na exposição A Guerra Guardada, até 20 de Março, no Museu do Aljube, em Lisboa, as antropólogas Maria José Lobo Antunes e Inês Ponte resgatam imagens da guerra colonial que permanecem ainda muito escondidas nos álbuns de fotografia de veteranos do ultramar. Relato de Paulo Faria sobre uma visita ao Museu, onde reviu uma fotografia que conhece há muito.

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Como foi possível esta guerra ter demorado tanto tempo a sair dos álbuns de fotografias metidos nas gavetas de tantas casas portuguesas? Museu do Aljube

Como é possível esta história ainda me comover assim, se já a sei de cor e salteado? Ouvi-a da boca do furriel Gamito, camarada de armas do meu pai. Transformei-a, dei-lhe contornos de ficção, inscrevi-a no meu primeiro romance. O furriel Gamito indispôs-se comigo por causa do modo como alterei a narrativa dele. Expliquei-lhe as minhas razões. Fizemos as pazes. Ele contou a mesma história à minha mulher, quando fomos a casa dele almoçar. Viajei duas vezes até Moçambique em busca do Vítor, a criança desta história. Não o encontrei. Descrevi essa busca no meu segundo romance. Passaram-se alguns anos. E agora entro na sala de exposições do piso 4 do Museu do Aljube, encontro aqui a Maria José Lobo Antunes, que faz as honras da casa, e, a certa altura, ela diz-me: “Esta história já tu conheces.” E eu vejo na parede a fotografia que também já conhecia, Moçambique, 1967, e é mais forte do que eu, estendo o braço para o menino mulato na imagem, o Vítor, vestido com o uniforme em miniatura de soldado português e, com a ponta dos dedos, afago-lhe o rosto. Como é possível esta fotografia tocar-me ainda desta maneira?

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Como é possível esta história ainda me comover assim, se já a sei de cor e salteado? Ouvi-a da boca do furriel Gamito, camarada de armas do meu pai. Transformei-a, dei-lhe contornos de ficção, inscrevi-a no meu primeiro romance. O furriel Gamito indispôs-se comigo por causa do modo como alterei a narrativa dele. Expliquei-lhe as minhas razões. Fizemos as pazes. Ele contou a mesma história à minha mulher, quando fomos a casa dele almoçar. Viajei duas vezes até Moçambique em busca do Vítor, a criança desta história. Não o encontrei. Descrevi essa busca no meu segundo romance. Passaram-se alguns anos. E agora entro na sala de exposições do piso 4 do Museu do Aljube, encontro aqui a Maria José Lobo Antunes, que faz as honras da casa, e, a certa altura, ela diz-me: “Esta história já tu conheces.” E eu vejo na parede a fotografia que também já conhecia, Moçambique, 1967, e é mais forte do que eu, estendo o braço para o menino mulato na imagem, o Vítor, vestido com o uniforme em miniatura de soldado português e, com a ponta dos dedos, afago-lhe o rosto. Como é possível esta fotografia tocar-me ainda desta maneira?