Uma chávena de chá na Taprobana
Sri Lanka e as memórias da Taprobana, de Ceilão e de muito chá pela leitora Julieta Henriques.
O Sri Lanka, a antiga Taprobana cantada por Camões e mais tarde chamada de Ceilão, é um país insular, em forma de lágrima largada no oceano Índico.
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O Sri Lanka, a antiga Taprobana cantada por Camões e mais tarde chamada de Ceilão, é um país insular, em forma de lágrima largada no oceano Índico.
Muito do encanto desta ilha assenta na variedade de ecossistemas que o seu clima e orografia proporcionam, remetendo-nos para o postal paradisíaco das praias imensas, de areias finas bordejadas por palmeiras esguias, banhadas pelas transparentes e quentes águas do oceano, ou para o da densa floresta tropical revestindo um impressionante maciço montanhoso, fértil em quedas de água. Por todos os atractivos naturais e pela multiculturalidade do seu povo - caloroso como poucos -, o Sri Lanka faz jus ao seu nome que, em sânscrito, significa ilha resplandecente.
Desde que, em 1890, o escocês Thomas Lipton comprou na ilha as suas primeiras plantações de chá, o Sri Lanka revolucionaria industrialmente esta cultura, ajudando a tornar universal e acessível o seu consumo, desde logo pela forma da sua embalagem em saquetas. É na grande altitude do interior montanhoso da ilha, no território conhecido por Hill Country, onde não chega o calor que, inclementemente, atinge as zonas do litoral, que se encontra o clima adequado para o cultivo da planta. Uma temperatura que permite o crescimento bastante lento da camellia sinensis, arbusto cujo produto final apresenta um aroma que, embora suave, é simultaneamente intenso e inigualável.
Viajámos até lá, ao encontro de Nuwara Eliya, uma pequena cidade na parte mais elevada da ilha, a 1900 metros de altitude, em torno da qual se concentram as vastíssimas plantações. Para atingirmos o topo da montanha, seguimos por uma estrada que a serpenteia contorcendo-se sobre colinas e mais colinas revestidas por um verde lustroso, que tudo domina. Os métodos de cultivo, de produção e apanha das folhas, são ainda bastante tradicionais. A colheita é feita unicamente por mulheres, de etnia tamil, que apanham folha a folha com a pinça natural, certeira e bem treinada feita com os seus dedos polegar e indicador. Um trabalho árduo. Com uma pontaria adquirida por anos e anos de trabalho, vão lançando as tenras folhas para um grande cesto que transportam às costas.
De visita a qualquer das muitas fábricas da região é possível observar todo o processo de fabrico, desde a secagem das folhas até à embalagem final, pronta para exportar para todos os cantos do mundo. Este apreciado “ouro líquido” produzido no Sri Lanka tem variantes consoante o grau de fermentação a que as folhas são sujeitas, daí resultando as qualidades de chá preto, verde ou branco, este último bastante mais raro e delicado, com um custo final também ele mais “delicado” a justificar a distinção que recebe de “néctar dos deuses”.
Na minha viagem à aromática terra do chá, a subida a Lipton's Seat culminou obrigatória. Um lugar tranquilo, num topo de uma montanha onde, alegadamente, sir Lipton gostava de descansar o olhar pelas verdes plantações. A sua figura esculpida em bronze, em pose confortavelmente recostada num banco, eterniza a sua memória e o seu empreendimento. Aí mesmo me despedi do Sri Lanka. O ar estava morno e o sol já a declinar. Pela perna da calça “bronzeada” de sir Lipton, uma lagartixa verde agarrava os últimos raios de sol.
Julieta Henriques