Novo capítulo na relação com a UE não pode pôr em causa outras parcerias vantajosas para África
Na cerimónia de abertura da 6.ª Cimeira entre a União Europeia e a União Africana, houve palavras calorosas de amizade e promessas de cooperação. A Europa fala num novo paradigma no relacionamento entre os dois continentes. A África avisa que não deixará de olhar para outras geografias.
Ao dar as boas vindas aos chefes de Estado e governo da União Europeia e da União Africana presentes em Bruxelas, e declarar abertos os trabalhos da 6.ª cimeira entre os dois blocos, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, revelou a sua ambição de definir “um novo paradigma” para o relacionamento entre os dois continentes, “que partilham uma geografia, várias línguas, múltiplas ligações económicas e humanas” — e ainda uma história, “que nunca foi vivida da mesma maneira de um lado e do outro do Mediterrâneo”, reconheceu.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Ao dar as boas vindas aos chefes de Estado e governo da União Europeia e da União Africana presentes em Bruxelas, e declarar abertos os trabalhos da 6.ª cimeira entre os dois blocos, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, revelou a sua ambição de definir “um novo paradigma” para o relacionamento entre os dois continentes, “que partilham uma geografia, várias línguas, múltiplas ligações económicas e humanas” — e ainda uma história, “que nunca foi vivida da mesma maneira de um lado e do outro do Mediterrâneo”, reconheceu.
“Retiremos as lições do passado, e aproveitemos esta cimeira para selar a renovação da nossa relação estratégica e firmar um novo pacto, desenhando juntos um espaço comum de prosperidade, estabilidade, segurança e respeito mútuo”, apelou. Afinal, espicaçou, quando fecharam a data para a realização da cimeira, com um atraso dois anos por causa da pandemia, todos concordaram que não devia ser “business as usual”…
Para o Presidente do Senegal, Macky Sall, que acaba de assumir a presidência rotativa da União Africana, trata-se de abrir um novo capítulo. “Estamos aqui, com espírito de amizade e fidelidade à nossa parceria, conscientes que nos une uma cooperação antiga, intensa, diversificada e complexa, que urge renovar”, concordou, reclamando “um novo começo para uma parceria renovada”, que ofereça — a europeus e africanos — respostas e soluções para desafios como as alterações climáticas, os fluxos migratórios ou os “múltiplos impactos de uma crise sanitária inédita”.
Imediatamente a seguir, o presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat, veio lembrar que o continente está apostado no “desenvolvimento de uma diversidade de parcerias” — que, admitiu, “não têm a mesma história nem, talvez, a mesma amplitude da parceria com a Europa”. “Mas estas novas parcerias não são menos pertinentes e vantajosas para a África, e desse ponto de vista são dignas de respeito”, vincou, numa referência velada, mas que ninguém na plateia deixou de entender, ao investimento chinês em África.
O comentário foi ignorado, mas não deixou de ser sintomático da desconfiança e até do mal-estar de alguns dos líderes da UA relativamente à postura da UE, que para muitos deles “falhou” ao continente durante o processo de produção, exportação e distribuição de vacinas contra a covid-19. “Não estamos aqui para pedir mais doação de doses, mas para discutir a quebra das patentes. Para nós, o mais importante é produzir as nossas próprias vacinas”, resumiu o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, à entrada para a reunião.
Nos seus discursos, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o Presidente da França, Emmanuel Macron, sentiram necessidade de se justificar. “Mais de 50% das vacinas produzidas na Europa foram doadas ou exportadas”, observou Macron, que no entanto reconheceu que é preciso trabalhar para “criar uma autonomia em termos de produção” no continente. “A África representa 20% das necessidades [de vacinas], e produz apenas 1% das doses”, assinalou.
“Estamos a fazer progressos rápidos”, garantiu Von der Leyen, apontando para a abertura de duas unidades de produção no Senegal e no Ruanda, com o apoio da UE, e o estabelecimento de um novo centro de investigação da tecnologia de ARN mensageiro na África do Sul, em parceria com a Organização Mundial de Saúde.
Mas as dissonâncias iam para além da questão do licenciamento das vacinas e da isenção dos direitos de propriedade intelectual. No fim da cerimónia de abertura, enquanto os líderes aplaudiam o regresso da harmonia ao palco da cimeira, na voz do cantor senegalês Youssou N’Dour, os seus “sherpas” esforçavam-se nos bastidores para ultrapassar outras divergências quanto ao conteúdo, mas também a linguagem, da declaração política conjunta que será divulgada esta sexta-feira, e continuava por fechar. Ainda em negociação, além da questão das vacinas, estavam as referências às migrações, aos combustíveis fósseis ou aos direitos sexuais e reprodutivos.