Camila, de “amante estouvada” a “rainha consorte” com a bênção de Isabel II
O príncipe Carlos aproveitou as celebrações do jubileu para agradecer à mãe o facto de ter declarado o seu “desejo sincero” de um dia Camila vir a ser conhecida como rainha consorte.
O dia 6 de Fevereiro ficou marcado pelo aniversário de 70 anos de reinado de Isabel II, mas houve um momento, ainda no dia anterior, que promete marcar a história futura: o facto de a monarca ter manifestado o “desejo sincero” de que Camila venha a ser conhecida como rainha consorte quando o filho assumir o trono. E Carlos, que esteve na homenagem prestada por líderes religiosos e mundiais, não deixou passar o acontecimento em branco, agradecendo à mãe as palavras do dia anterior.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O dia 6 de Fevereiro ficou marcado pelo aniversário de 70 anos de reinado de Isabel II, mas houve um momento, ainda no dia anterior, que promete marcar a história futura: o facto de a monarca ter manifestado o “desejo sincero” de que Camila venha a ser conhecida como rainha consorte quando o filho assumir o trono. E Carlos, que esteve na homenagem prestada por líderes religiosos e mundiais, não deixou passar o acontecimento em branco, agradecendo à mãe as palavras do dia anterior.
“Estamos profundamente conscientes da honra que o desejo da minha mãe representa”, disse Carlos, citado pela Reuters, sublinhando a importância que Camila tem para si e para a sua função: “À medida que temos procurado servir e apoiar juntos sua majestade e o povo das nossas comunidades, a minha querida mulher tem sido o meu apoio constante ao longo de todo o processo.”
A declaração de Isabel II é mais do que um voto de confiança em Camila (e, já agora, em Carlos). É um virar de página que altera muito da história da família, da relação dos duques da Cornualha e da forma como é encarada Camila, retratada durante anos como a amante estouvada, tendo sido vilipendiada pela imprensa tablóide aquando do fim do casamento de Carlos com a primeira mulher, a princesa Diana, que morreu num acidente de viação, em 1997.
Mais: o desejo põe de parte uma possível querela no atributo de um título a Camila. É que, se ficou claro quando os dois se casaram que a segunda mulher nunca viria a ser rainha, também Carlos não é conhecido por se resignar, o que significa que, após a morte da mãe, muito possivelmente tentaria alterar o acordado.
Carlos e Camila casaram em 2005, mas a relação começou bem antes — muito antes até de Carlos se unir à jovem Diana Spencer. Consta que os dois se conheceram em 1971, numa altura em que Camila estava separada do seu namorado de há uns anos, Andrew Parker-Bowles, que, por sua vez, era amigo de Carlos e por esses dias namorado da princesa Ana.
A divertida jovem, na altura com 24 anos, atraiu a atenção do príncipe quando fez uma piada sobre o facto de a sua bisavó ter tido um caso com Eduardo VII: “A minha bisavó era a amante do seu tataravô. Sinto que temos algo em comum.” A partir daí começaram a sair juntos e a assumirem-se como namorados.
Porém, para o resto da família real, Camila não preenchia os requisitos de uma candidata a sentar-se ao lado do futuro rei. E, quando Carlos parte numa missão com a Marinha, dá-se a cisão entre os dois, não se sabendo muito bem até hoje quem terá sido responsável: a rainha-mãe (1900-2002), que não suportava a ideia de ter uma mulher como Camila no seio da família; o tio-avô de Carlos, lorde Mountbatten, que via a neta como uma futura rainha (e uma afirmação do seu nome num lugar de destaque entre a monarquia); ou a própria Camila que, simplesmente, não se via amarrada sob tão apertado protocolo.
Independentemente do motivo, o certo é que, quando Carlos regressou, Camila já se tinha casado com Andrew Parker-Bowles. Quase dez anos depois, em 1981, numa cerimónia de conto de fadas, Carlos casa com Diana Spencer, que, além de pertencer a uma linhagem nobre, parecia ter tudo o que era preciso para ser moldada ao lugar de uma futura subserviente futura rainha.
No entanto, a história acabaria por ser diferente, e, em 1986, Carlos e Camila passaram a ter um caso extraconjugal, de acordo com a biografia autorizada do príncipe, o que viria a ser o início do fim dos casamentos de ambos. “Havia três neste casamento, era gente a mais”, disse Diana numa entrevista à BBC, em 1995, que se sabe hoje ter sido obtida por meios pouco ortodoxos.
Camila e Andrew Parker-Bowles divorciaram-se em 1995; Carlos e Diana, em 1996 (ainda que a separação dos dois fosse conhecida desde 1992). Na época os planos passavam por se juntarem e Carlos iniciou uma campanha a favor da amada, nomeadamente quando organizou a festa de aniversário dos seus 50 anos, em Julho de 1997.
Mas, pouco mais de um mês depois, a morte precoce de Diana e a adoração de que era alvo por parte dos britânicos goraram as intenções de Carlos, que se viu forçado a adiar a união com Camila.
Uma espera de 34 anos
O príncipe depressa percebeu que expor Camila enquanto o país chorava a morte de Diana não era o passo mais acertado e esperou sem revelar impaciência. Deixa, então, passar algum tempo para, progressivamente, voltar a a aparecer em público com Camila. Depois, faz saber que esta já foi apresentada aos filhos e, por fim, em 2003, o casal vai viver junto para Clarence House. Mas Camila continuava a ser tratada como a amante. Prova disso é o facto de, na época, o Palácio de Buckingham tornar público e claro que os aposentos de Camila não seriam decorados recorrendo a dinheiros públicos.
Até que, em 2005, Carlos conseguiu, por fim, ultrapassar os obstáculos que impediam o casamento: por um lado, obteve a bênção da mãe (consta que a morte da rainha-mãe, uma forte opositora à entrada de Camila na família, foi decisiva para este desenvolvimento) e, por outro, conseguiu garantir que não ia contra as leis da Igreja Anglicana. É que, apesar de se ter divorciado, aos olhos da religião, Carlos beneficiava do estatuto de viúvo após a morte da primeira mulher, abrindo-lhe caminho a um novo casamento. Claro que Camila continuava a ser divorciada. Porém, o príncipe de Gales resolveu o busílis em dois tempos: optou por uma cerimónia civil, tendo tido a bênção do então arcebispo da Cantuária, Rowan William.
Ainda assim, as imposições feitas para que Camila fosse aceite não foram brandas: primeiro, apesar de Carlos ser príncipe de Gales, Camila nunca viria a ser princesa de Gales (lugar que permanece vazio desde a morte de Diana); depois, quando Carlos viesse a ser rei, ao contrário do que sucedeu com todos os outros homens que ocuparam o trono, Camila nunca viria a ser rainha de Inglaterra, podendo almejar, no máximo, ao título de princesa consorte.
Discreta, Camila foi desempenhando um papel cada vez mais relevante, sendo hoje um dos membros da família real mais activos, sem ofuscar Carlos. E diz-se que a relação com a rainha e com os enteados, sobretudo com William, assim como com a mulher deste, Kate, tornou-se próxima.
Ao mesmo tempo, a memória de Diana foi-se desvanecendo e o país enlutado predispôs-se a abraçar uma nova referência. Também a imagem de Carlos se solidificou e hoje, mesmo com todas as ameaças que pairam sobre a monarquia, a ideia de a coroa passar directamente de Isabel II para William, como indicava a vontade popular quando o príncipe casou com Camila, parece já estar ultrapassada. Com a cereja no topo do bolo: se e quando ascender ao trono, Carlos terá, finalmente, uma rainha ao seu lado.