Ventura elegeu onze amigos para ir “atrás de Costa”

“Acabado de sair da missa”, Ventura chegou com um tom cauteloso e saiu em tom eufórico. Chega elegeu 12 deputados. Mas “hoje, para a direita, não é um dia positivo”.

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O Chega, de André Ventura, conseguiu ser a terceira força política Reuters/STRINGER

O que têm em comum os 12 deputados eleitos pelo Chega nas eleições legislativas antecipadas deste domingo? Uns são pouco religiosos, outros são muitíssimo. Não é isso que os une ao presidente, André Ventura. Têm histórias, percursos e profissões diferentes. Têm entre os 23 e os 72 anos. São do norte e do sul. Têm em comum outra coisa: os novos deputados — eleitos numa noite vitoriosa para o novo partido de extrema-direita — são amigos próximos e fiéis do líder.

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O que têm em comum os 12 deputados eleitos pelo Chega nas eleições legislativas antecipadas deste domingo? Uns são pouco religiosos, outros são muitíssimo. Não é isso que os une ao presidente, André Ventura. Têm histórias, percursos e profissões diferentes. Têm entre os 23 e os 72 anos. São do norte e do sul. Têm em comum outra coisa: os novos deputados — eleitos numa noite vitoriosa para o novo partido de extrema-direita — são amigos próximos e fiéis do líder.

Os futuros deputados do Chega são pessoas que “não fazem frente a André Ventura”, que “concordam com tudo o que ele diz”, que “batem sempre palmas”, que “não levantam ondas”, que “aceitam tudo o que o líder propõe”, disseram ao PÚBLICO vários militantes do Chega, alguns próximos da direcção nacional, e todos activos e empenhados na vida do Chega.

Ventura deixará de estar sozinho na Assembleia da República e terá ao seu lado, na bancada do Chega, mais 11 deputados: Pedro Santos Frazão (Santarém), Rui Afonso e Diogo Pacheco de Amorim (Porto), Pedro Pinto (Faro), Jorge Valssasina Galveias (Aveiro), Rui Paulo Sousa, Rita Matias e Pedro Pessanha (Lisboa), Filipe Melo (Braga), Bruno Nunes (Setúbal) e Gabriel Mithá Ribeiro (Leiria).

Eufórico, Ventura desceu à sala do Marriott Hotel, em Lisboa, onde o partido montou a noite eleitoral, e terminou o seu discurso, já perto da meia-noite, no habitual estilo messiânico: “A partir de agora, o Parlamento não será mais aquela oposição fofinha ao PS e a António Costa. E não será um deputado! Serão 10 ou 12 ou 14 em 230! Assumimos o papel que a História nos confiou de aceitar devolver a dignidade a este país.” E, a seguir: “Eu sei que o povo português nunca me iria falhar, porque sofreram tempo de mais. Que sova lhes demos esta noite!”.

À hora a que Ventura falava, o Chega tinha 7% dos votos e 382 mil votos já contados. “Fica a mensagem: a direita não soube estar à altura das suas responsabilidades. A dita direita passou o tempo todo a dizer que não fazia acordos com o Chega, que não queria o Chega, que com o Chega nada e o resultado está aí. António Costa: eu vou atrás de ti agora!”.

O Chega aumentou muito o resultado em relação às últimas legislativas, mas ficou, mesmo assim, abaixo das suas próprias previsões e mais próximo do resultado previsto pelas últimas sondagens.

Em Dezembro, quando entregou as listas de candidatos às eleições pelo círculo de Lisboa, Ventura disse: “Estamos a apontar para um resultado entre 20 e 25 deputados na Assembleia da República” e “o Chega vai ultrapassar os 10% dos votos”.

Numa das últimas sondagens antes das eleições, feita pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica para o PÚBLICO, RTP e Antena 1, o Chega ficara com 6% da intenção de votos e com a perspectiva de eleger entre cinco e nove deputados.

No seu discurso deste domingo, Ventura disse que vai trabalhar para a “construção de uma grande alternativa de direita para substituir o PS no poder” e voltou a caracterizar o Chega como “uma verdadeira força anti sistema”. “Devemos esta vitória ao nosso trabalho e às centenas de milhares de portugueses que, apesar de todos os dias receberem mentiras dos outros partidos — que vinha aí o fascismo, que vinha aí a extrema-direita — não se deixou enganar”, disse Ventura, antes de ir cumprimentar, um a um, os cerca de 50 militantes que foram ao Marriott.

À medida que os novos deputados eleitos iam chegando, os militantes gritaram e agitaram as bandeiras de Portugal e do partido. A única mulher da futura bancada foi recebida por Ricky, cantor, empresário de som e mestre-de-cerimónias da noite, com particular entusiasmo. “Rita Matias! Rita Matias! Rita deputaaa...daaaa!”, grita ao microfone. “Grande Rita Matias! Chega! Chega!”, referindo-se à filha de Manuel Matias, assessor parlamentar de Ventura, e olhada como futura líder da Juventude do Chega. “O abraço fraterno de pai e filha! Não quero cá choradeiras, quero alegria! Viva o Chega!”. “Por favor tomem os vossos lugares, o senhor André está quase a descer!”, grita Ricky do palco. “E, como se diz no norte, até os comemos!”

A noite evolui lenta e numa sala quase vazia, com a actriz Maria Vieira a tentar animar o pequeno grupo de militantes. A certa altura, deu um grito: “Quatro já cá estão!”. Um minuto depois, já eram cinco, um súbito acelerar de ritmo que marcou o resto da noite. “Chega!”, gritou a actriz, sempre activa nos congressos do partido e sempre acompanhada pelo marido e pelo cão, e ela própria nas listas de candidatos, em número 9 por Lisboa.

“Acabado de sair da missa”, Ventura chegou ao Marriott às 20h30, com um tom cauteloso e duas notícias: a “boa notícia” do crescimento do seu partido e a “má notícia” de que Costa iria continuar a ser primeiro-ministro de Portugal. Fez uns cálculos cautelosos e desapareceu durante as três horas seguintes. Antes, deixou a marca da sua frustração: “Hoje, para a direita, não é um dia positivo.”