Há uma nova versão da Ómicron que já circula em Portugal, mas não parece ser mais severa
Para já, não há provas de que a BA.2 seja mais virulenta ou que se espalhe mais rapidamente que a BA.1, mas parece ser mais difícil de rastrear. Em Portugal, esta linhagem parece estar a fazer cair o número de casos associados à Ómicron “original”, mas ainda não é possível saber o seu peso.
Há uma sublinhagem da Ómicron, variante do SARS-CoV-2 que é conhecida por ser altamente contagiosa, a espalhar-se na Ásia e da Europa e que pode estar a prolongar a actual vaga de casos em muitos países. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já recomendou às autoridades nacionais que comecem a investigá-la e a caracterizá-la para perceber se representa um perigo para os países já fustigados pela Ómicron.
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Há uma sublinhagem da Ómicron, variante do SARS-CoV-2 que é conhecida por ser altamente contagiosa, a espalhar-se na Ásia e da Europa e que pode estar a prolongar a actual vaga de casos em muitos países. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já recomendou às autoridades nacionais que comecem a investigá-la e a caracterizá-la para perceber se representa um perigo para os países já fustigados pela Ómicron.
Também Portugal já detectou casos desta linhagem que, em parte, parece estar a fazer cair o número de casos associados à Ómicron “original”, mas o Instituto Doutor Ricardo Jorge (Insa) diz que ainda não é possível saber o seu peso no número total de casos.
Conhecida como BA.2, esta linhagem é descendente da variante Ómicron, que a comunidade científica apelidou de BA.1 e que foi e continua a ser responsável pelo enorme crescimento de casos em todo o mundo desde o fim de 2021.
“A circulação da linhagem descendente BA.2, que difere da BA.1 em algumas das mutações, inclusive na proteína spike [proteína da espícula, em português], está a aumentar em muitos países”, escreveu a OMS na sua página nesta segunda-feira. “As investigações sobre as características da BA.2, incluindo as propriedades de fuga imunitária e virulência, devem ser uma prioridade.”
Em mais de 40 países
A BA.2 foi identificada pela primeira vez na Índia e na África do Sul no fim de Dezembro. É uma subvariante e acredita-se que tenha surgido de uma mutação da Ómicron, que também nasceu de uma mutação da variante Delta. Já foram identificadas outras linhagens, como a BA.3 ou BB.2, mas a BA.2 atraiu a atenção dos epidemiologistas devido ao aumento dramático de casos de pessoas que contraem a infecção associada a esta linhagem.
Em particular, ambas descendem da linhagem ancestral B.1.1.529 e apresentam um “excesso” de mutações na proteína spike (que é essencial para o vírus penetrar nas células humanas e infectar as pessoas), sendo que muitas destas mutações são partilhadas. Mas ao contrário da BA.1, a BA.2 não apresenta uma “falha” na detecção do gene S (SGTF), que é um dos critérios utilizados pelos laboratórios para identificar casos suspeitos da variante Ómicron e para os distinguir dos casos associados à Delta, por exemplo.
Para já, não há provas de que a BA.2 seja mais virulenta, que se espalhe mais rapidamente ou que possa escapar à imunidade melhor do que a BA.1, mas parece ser mais difícil de rastrear. “Sabemos que a Ómicron pode escapar mais facilmente à imunidade preexistente das vacinas e à exposição a outras variantes do vírus. O que ainda não sabemos é se a filha da Ómicron faz isso melhor ou pior do que a Ómicron. Essa é a questão em aberto”, disse ao The Washington Post James Musser, director do Centro de Doenças Infecciosas Humanas do Hospital Metodista de Houston, no Texas, EUA.
A linhagem já foi detectada em pelo menos 43 países, como a França, Suécia, Índia, Alemanha, Bélgica, Austrália, Estados Unidos, Singapura, no Reino Unido e Dinamarca, onde tem tido uma força particular.
Na Dinamarca, o número de casos diários de covid-19 começou a subir novamente, numa altura em que os dinamarqueses pensavam que já tinham atingido o pico da actual vaga causada pela Ómicron. “As autoridades dinamarquesas não têm explicação para este fenómeno, mas a situação está a ser monitorizada de perto.
No país, a linhagem foi responsável por 20% dos casos de covid-19 na última semana de 2021, percentagem que subiu para 45% na segunda semana de 2022 e para 65% na última semana. Pelo contrário, a proporção de casos associados à Ómicron está em queda. Anders Fomsgaard, investigador do instituto dinamarquês Statens Serum (SSI), disse que ainda não há uma boa explicação para o rápido crescimento da sublinhagem, acrescentando que está intrigado, mas não preocupado.
“Pode ser que seja mais resistente à imunidade da população, o que permite infectar mais. Ainda não sabemos”, afirmou, citado pela agência Reuters, acrescentando que existe a possibilidade de as pessoas infectadas com a BA.1 não ficarem imunes e acabarem por ficar doentes com BA.2 pouco depois. “É uma possibilidade e, nesse caso, devemos estar preparados para isso. Se isso acontecer, poderemos realmente assistir a dois picos desta vaga epidémica.”
A boa notícia é que as análises iniciais do SSI não mostraram diferenças entre a BA.2 e a BA.1 no que toca aos internamentos por covid-19. “Não estamos preocupados porque agora não vemos grandes diferenças na distribuição etária e no risco de hospitalização.”
Já a Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido (UKHSA, sigla em inglês) avançou esta semana que a BA.2 estava sob investigação no país, afirmando que poderia ter uma “vantagem de crescimento”. “É da natureza dos vírus evoluir e sofrer mutações, por isso é de se esperar que continuemos a assistir ao surgimento de novas variantes. A nossa contínua vigilância genómica permite detectá-las e avaliar se são importantes”, disse à Reuters Meera Chand, directora do departamento de incidentes da UKHSA.
O Reino Unido sequenciou 426 casos da BA.2 nos primeiros dias de Janeiro e a UKHSA disse que, embora houvesse incertezas sobre o significado das mudanças no genoma viral, a análise inicial sugeriu uma taxa de crescimento acrescida em comparação com a linhagem original da Ómicron.
OMS não distingue linhagens
A Organização Mundial da Saúde, que classificou a Ómicron como “variante de preocupação”, não distingue, para já, a sublinhagem BA.1 da BA.2, que está a ser estudada de perto pela comunidade científica. Ainda não há dados concretos sobre uma possível resistência às vacinas contra a covid-19 ou sobre se, ao contrário do que acontece com a Ómicron, esta linhagem poderá causar forma mais graves da doença.
O virologista Tom Peacock, da Imperial College London, explicou que as “observações muito iniciais feitas na Índia e na Dinamarca sugerem que não há diferenças drásticas na gravidade da linhagem em comparação com BA.1”: “Estes dados devem tornar-se mais concretos nas próximas semanas, mas é provável que existam diferenças mínimas na eficácia da vacina contra a BA.1 e a BA.2. Pessoalmente, não tenho certeza de que a BA.2 terá um impacto substancial na actual onda da Ómicron da pandemia.”
“Vários países estão muito próximos e alguns já passaram o pico da vaga associada à BA.1. Ficaria muito surpreendido se a BA.2 causasse uma segunda vaga nesta altura. Mesmo com uma transmissibilidade ligeiramente maior, poderá não causar uma mudança absoluta como aconteceu com a Delta e Ómicron. Em vez disso, este crescimento poderá ser mais lento e subtil”, explicou através do Twitter.
BA.1 diminui, BA.2 cresce
A variante Ómicron era responsável, no início de Janeiro, por 93% das infecções em Portugal, mas desde essa altura que se tem verificado um decréscimo da proporção de amostras positivas desta estirpe. Segundo o relatório de situação da diversidade genética do novo coronavírus em Portugal, do Insa, a variante atingiu a proporção estimada máxima (cerca de 93%) entre os dias 7 e 9 de Janeiro de 2022.
A linhagem BA.2 foi detectada pela primeira vez na passagem de 2021 para 2022. Embora o número de casos tenha aumentado (de 0,2% para 0,7%) entre 3 a 9 de Janeiro de 2022, a circulação comunitária terá sido reduzida nestas duas primeiras semanas de Janeiro, explica o Insa.
Em resposta escrita enviada ao PÚBLICO, o Insa explica que, em contraste com a linhagem BA.1, a BA.2 não tem uma determinada mutação na proteína spike, pelo que não apresenta “falha” na detecção do gene S com um dos kits de diagnósticos utilizados pelos laboratórios que fazem testes à covid-19.
“Desde os dias 7-9 de Janeiro de 2022, tem-se verificado um decréscimo da proporção de amostras positivas com a tal falha na detecção do gene S, concordante com o aumento de circulação de linhagens para as quais o gene S é detectado por aquele teste de PCR específico, como é o caso da variante Delta e da linhagem BA.2”, lê-se na resposta.
É ainda dito que a diminuição do número de casos da linhagem BA.1 pode dever-se, pelo menos parcialmente, a um aumento de circulação da linhagem BA.2 em Portugal. Ainda assim, os dados actuais não mostram “um aumento acentuado e consistente da linhagem BA.2 em Portugal”, ao contrário do que se tem observado noutros países, como na Dinamarca, Índia e Filipinas.
O PÚBLICO questionou o Insa sobre a proporção actual desta linhagem em Portugal, mas o instituto afirma que “os dados relativos à semana de 17 a 24 de Janeiro ainda não foram apurados, o que impede que se perceba o peso relativo da linhagem BA.2”.