Metade das vagas para médico de família em Lisboa e Vale do Tejo ficaram por ocupar

A nível nacional, foram preenchidas 160 das 235 vagas abertas, o que permitirá dar médico de família a “300 mil” pessoas, segundo o Ministério da Saúde. A partir de agora, as administrações regionais de saúde vão poder abrir concursos para preencher as vagas que não foram ocupadas.

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Rui Gaudencio

Os concursos sucedem-se mas o problema mantém-se: quase um terço das vagas abertas no segundo concurso anual para recrutamento de novos médicos de família ficou por ocupar, mas na região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT), de longe a mais carenciada, o resultado foi ainda pior - metade dos postos de trabalho não tiveram candidatos.

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Os concursos sucedem-se mas o problema mantém-se: quase um terço das vagas abertas no segundo concurso anual para recrutamento de novos médicos de família ficou por ocupar, mas na região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT), de longe a mais carenciada, o resultado foi ainda pior - metade dos postos de trabalho não tiveram candidatos.

O Ministério da Saúde (MS) anunciou esta terça-feira que, do total de 235 vagas disponibilizadas no concurso da segunda época de 2021 em todo o país, foram ocupadas 160, o que permitirá dar médico de família a cerca de “300 mil” pessoas.

Para conseguir recrutar para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) o maior número possível de profissionais, o ministério lembra que disponibilizou um número de vagas superior ao total de médicos que concluem a especialidade em cada época, como tem sido prática nos últimos concursos. Mas isso não tem sido suficiente para atrair médicos em número suficiente para colmatar as necessidades que se agravaram durante a pandemia - no final do ano passado, havia mais de 1,1 milhões de utentes sem médico de família, cerca de dois terços dos quais (783 mil) na região de Lisboa e Vale do Tejo.

Para contornar este problema, o MS sublinha que, pela primeira vez, e com autorização superior, as administrações regionais de saúde poderão agora abrir novos concursos para preencher as vagas que não foram escolhidas e que as unidades locais de saúde terão luz verde para recrutar profissionais.

Todos os anos há dois concursos para recrutar recém-especialistas. No primeiro de 2021, o maior, um terço das vagas ficou por ocupar. Neste segundo, o resultado repete-se. Mas o Ministério da Saúde nota que, na segunda época de 2021, concluíram a especialidade de medicina geral e familiar apenas 91 médicos e que, apesar disso, foi possível “atrair” 160 para o SNS, “o maior número de médicos recrutados” nas segundas épocas de contratação.

"Foi-se buscar ao privado 69 médicos"

“Foi uma grande vitória. Só havia 91 recém-especialistas e foi possível recrutar 160. Ou seja, foi-se buscar ao privado 69 médicos”, acentua João Rodrigues, coordenador para a área de cuidados de saúde primários do Grupo de Apoio Técnico à Implementação das Políticas de Saúde, que foi criado no ano passado.

Mas o Sindicato Independente dos Médicos adiantou esta quarta-feira que houve 241 candidatos para as 235 vagas e que, portanto, “81 médicos que concorrem ao concurso optaram por não escolher qualquer vaga”. “A estes acrescem ainda os médicos que denunciarão os contratos durante o período experimental face às condições de trabalho com que serão confrontados em várias instituições do Serviço Nacional de Saúde”.

O resultado deste concurso acabou por ter impacto sobretudo na região Norte - onde em Dezembro passado faltava apenas dar cobertura a 2,7% da população inscrita. O Norte foi a região que disponibilizou mais vagas (98) e apenas cinco não foram ocupadas. Em LVT, onde um quinto da população não tem médico de família, foram preenchidas 32 das 66 vagas. Já no Alentejo só dois médicos se candidataram aos 16 postos de trabalho colocados a concurso e, no Centro, 18 das 45 vagas ficaram desertas, enquanto no Algarve ficaram por preencher quatro.

Para atrair os jovens médicos de família para as regiões mais carenciadas “é preciso melhorar as condições de trabalho, requalificar equipamentos e instalações, e oferecer perspectivas de futuro”, elenca o presidente da Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiares (USF), André Biscaia. Muitos médicos “preferem arranjar soluções temporárias - como trabalhar à tarefa, fazer urgências, ir para o sector privado ou emigrar - do que ficar em locais em condições muito precárias, com uma pressão enorme porque há milhares de pessoas sem médico de família”, como acontece em Lisboa e Vale do Tejo, acrescenta.

Entre os motivos que justificam a falta de interesse de muitos recém-especialistas em ir para LVT está a “não abertura de novas unidades de saúde familiar [USF] modelo B”, onde os médicos de família recebem “cerca de seis mil euros por mês”, muito mais do que os que trabalham nas outras unidades dos centros de saúde, defende o presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos, Alexandre Valentim Lourenço. Nas USF modelo B os médicos, enfermeiros e secretários têm autonomia administrativa e uma remuneração mais elevada em função do cumprimento de uma série de indicadores.

“Também já sabemos há anos que há mais [internos da especialidade de medicina geral e familiar] em formação no Norte do que no Sul porque no Norte os centros de saúde têm mais especialistas e, por isso, mais capacidade formativa”, acentua, lembrando que, quando acabam a especialidade, muitos já têm família constituída e filhos e não querem ir para o Sul, onde têm que alugar casa. “Enquanto não abrirem mais USF modelo B no Sul não há condições para fomentar a mobilidade”, conclui.

Os dados adiantados ao PÚBLICO indicam que a região Norte continua, de facto, a ser aquela que forma mais especialistas em medicina geral e familiar - foram 37 nesta segunda época, contra 27 em LVT e 21 no Centro. No Alentejo formaram-se quatro e no Algarve, dois.