Microrganismos do mar profundo com potencial para recuperar ecossistemas contaminados
A equipa encontrou seis géneros de microrganismos degradadores de hidrocarbonetos quando os cultivou em meios enriquecidos em petróleo.
Cientistas do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (Ciimar) desvendara um conjunto de microrganismos do mar profundo capaz de degradar hidrocarbonetos de petróleo e com potencial para o desenvolvimento de soluções biotecnológicas para recuperar ecossistemas contaminados.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Cientistas do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (Ciimar) desvendara um conjunto de microrganismos do mar profundo capaz de degradar hidrocarbonetos de petróleo e com potencial para o desenvolvimento de soluções biotecnológicas para recuperar ecossistemas contaminados.
Em declarações à agência Lusa, Ana Paula Mucha, investigadora daquele centro da Universidade do Porto, explicou que a investigação recorreu a amostras de mar profundo, recolhidas durante a campanha oceanográfica, em Setembro de 2016, a bordo do navio oceanográfico da Marinha Portuguesa NRP Almirante Gago Coutinho.
Publicado na revista científica Microorganisms, o estudo visava perceber se seria possível produzir um “consórcio microbiano nativo” dos sedimentos de mar profundo com capacidade de biorremediação. “A biorremediação é a utilização de microrganismos para remediar eventos de poluição e recuperar ecossistemas que foram contaminados”, esclareceu a investigadora.
Com base nos microrganismos recolhidos da campanha oceanográfica, que levou a bordo uma equipa multidisciplinar de cientistas, os investigadores do grupo Biorremediação e Funcionamento de Ecossistemas fizeram em laboratório uma experiência de biorremediação, que durou cerca de 15 dias.
“Tínhamos curiosidade em perceber se naqueles sedimentos haveria a possibilidade de encontrarmos e cultivarmos microrganismos com capacidade de degradar petróleo”, disse, acrescentando que os microrganismos se revelaram “capazes de se alimentar do petróleo e limpar o ambiente contaminado”.
“Nesta experiência com sedimentos do mar profundo, obtivemos cerca de 30% de degradação de petróleo. É um caminho que queremos explorar e optimizar”, observou, notando que a abordagem passou também pela caracterização da comunidade microbiana existente nos sedimentos.
A viverem em ambientes “inóspitos” quanto à profundidade, luz, temperatura, pressão e outros factores, estes microrganismos “escondem tecnologias de grande importância para a biorremediação”, disse por sua vez à Lusa Maria Paola Tomasino, a primeira autora do estudo.
“Encontrámos bactérias com potencial de degradação de hidrocarbonetos, que aparecem numa longa cauda de organismos raros conhecida como ‘Biosfera Rara'”, disse a investigadora, esclarecendo que estes organismos, ainda que muito raros (com uma abundância inferior a 1%), representam no seu conjunto 96% do total da comunidade microbiana encontrada nos sedimentos do mar profundo. “Apesar de raros, este conjunto de organismos pode servir como banco de sementes depositados no sedimento marinho do mar profundo”, observou.
Se a estes organismos forem fornecidas as “condições favoráveis” para o seu crescimento, podem aumentar a sua abundância e tornar-se “activos” na resposta a perturbações ambientais como é a degradação de um derrame de petróleo.
“Encontrámos seis géneros de microrganismos degradadores de hidrocarbonetos quando cultivados em meios enriquecidos em petróleo. Estes resultados suportam a hipótese de que estes microrganismos com a capacidade de degradar hidrocarbonetos de petróleo estão adormecidos nos sedimentos do mar profundo e que só se tornam abundantes em resposta a uma contaminação com petróleo”, acrescentou Maria Paola Tomasino.
Os investigadores vão agora tentar produzir estes microrganismos em “maior escala”, de forma a terem quantidade suficiente para prosseguir com as experiências, bem como estudar o papel ecológico e o perfil funcional da biosfera rara do mar profundo.