Há mesmo “à volta de 84 mil pessoas por ano” a sair do país?
Nos tempos da troika, a saída de portugueses do país chegou a ultrapassar os 134 mil emigrantes. Em 2020, o número desceu para menos de metade.
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A frase
“Temos uma emigração à volta de 84 mil pessoas por ano.”
Rui Rio, no frente-a-frente com o líder do PS, António Costa
O contexto
No único frente-a-frente entre António Costa e Rui Rio, realizado na quinta-feira, dia 13 de Janeiro, o líder do PSD estava a responder a uma pergunta sobre o aumento do Salário Mínimo Nacional e foi-se desviando do tema até chegar à questão da emigração. Depois de dizer que, em Portugal, a mediana dos salários é de 900 euros — “A segunda pior da União Europeia. Pior, só a Bulgária.” —, Rio acrescentou que é por isso que os portugueses estão a sair do país à razão de 84 mil por ano. “Estamos a nivelar por baixo. É o PS a empobrecer o país”, disse ainda.
Os factos
Uma consulta aos dados disponibilizados na página do Observatório da Emigração (que reproduz os números do Instituto Nacional de Estatística) sobre a estimativa das saídas totais de emigrantes portugueses mostra que nos anos da “geringonça” e desde 2019, a emigração tem sido de: 101.203 pessoas em 2015, 97.151 em 2016, 81.051 em 2017, 81.754 em 2018, 77.040 em 2019 e 68.209 em 2020. Não há ainda dados relativos a 2021.
Objectivamente, de acordo com os números mais recentes, já estão a sair de Portugal menos de 70 mil pessoas, por ano. Mas já saíram muitas mais: no passado recente, o recorde foi atingido em 2014, quando o número chegou a 134.624. Fazendo as contas ao primeiro Governo de António Costa (que tomou posse em Novembro de 2015), houve 90 mil saídas por ano em média entre 1 de Janeiro de 2015 e 31 de Dezembro de 2018, enquanto essa média baixou para 72 mil entre 1 de Janeiro de 2019 e 31 de Dezembro de 2020. Contudo, entre 2015 e 2020, a média dá exactamente 84.401 saídas.
Em resumo
Não é totalmente correcto dizer que a emigração anda à volta de 84 mil pessoas por ano, como referiu Rui Rio, mas a ideia de que os números continuam altos é real (em 2002 situava-se nos 27.358). No último ano de que há registo no INE (2020), houve 68.209 portugueses a sair do país, mas foi o primeiro ano de pandemia e de confinamentos e de restrições de fronteiras (o que possivelmente explica a descida em relação a 2019). O que o líder do PSD fez para chegar a 84 mil foi somar todas as saídas desde 2015 (ano da posse do Governo) e dividi-las pelo número de anos (seis). Mas nunca foi claro ao ponto de dizer que estava a falar na média. A expressão usada — “à volta de” — dá, por si só, a ideia de um valor aproximado, não necessariamente exacto.