Quando é que acaba a pandemia?

O isolamento não beneficia em nada o indivíduo (só o prejudica), e numa sociedade tão individualista leva a um conflito de interesses, motivo pelo qual muita gente prefere não fazer testes.

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"Não sou contra a ideia de vacinar o mundo, só a acho irrealista e bastante hipócrita" Reuters/JOSIANE KOUAGHEU

Quando é que acaba a pandemia? Estamos há dois anos a tentar responder a esta pergunta. Ainda não temos uma data, mas podemos construir uma fórmula para responder. É honesto enunciar três premissas introdutórias: 1) ninguém sabe esta resposta, 2) só olhando para trás teremos a certeza, 3) estamos dependentes da imprevisibilidade de novas variantes. Também podemos ter a certeza que a pandemia não acabará por decreto de nenhum presidente, monarca ou ditador. O vírus não parece estar muito preocupado com políticas, culturas ou religiões.

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Quando é que acaba a pandemia? Estamos há dois anos a tentar responder a esta pergunta. Ainda não temos uma data, mas podemos construir uma fórmula para responder. É honesto enunciar três premissas introdutórias: 1) ninguém sabe esta resposta, 2) só olhando para trás teremos a certeza, 3) estamos dependentes da imprevisibilidade de novas variantes. Também podemos ter a certeza que a pandemia não acabará por decreto de nenhum presidente, monarca ou ditador. O vírus não parece estar muito preocupado com políticas, culturas ou religiões.

Sendo a pandemia um fenómeno global, o seu fim também terá de ser global. Muito se tem falado sobre a necessidade de vacinar o mundo, o que a mim me parece absolutamente irrealista, tendo em conta os problemas do mundo real dos países em questão: guerras, fome, ausência de água e electricidade, escassez grotesca de profissionais de saúde, outros problemas de saúde bem mais graves, sem esquecer que também nos países mais pobres há e haverá crenças no mundo fantástico da ignorância que leva à negação dos benefícios das vacinas. Sinto-me um pouco isolado neste raciocínio, pelo que é bem provável que esteja errado. Eu não sou contra a ideia de vacinar o mundo, só a acho irrealista e bastante hipócrita.

No início achávamos possível erradicar o SARS-CoV2, tendo em conta a história de outras epidemias por coronavírus (o SARS e o MERS), mas neste momento é bem evidente que é impossível, tendo em conta o enorme reservatório em humanos e animais onde o vírus se encontra. Acreditámos mais tarde que poderíamos eliminar o risco, tendo apenas alguns surtos aqui ou ali, mas o facto de a imunidade se desvanecer com o tempo, e a Ómicron ter particular facilidade em infectar pessoas já imunizadas afastaram esta possibilidade.

Então quando é que acaba? Qual é a meta atingir? Talvez não seja algo facilmente mensurável do ponto de vista técnico, mas eu diria que o sentimento de normalidade só será conseguido com o fim dos isolamentos. Relembrando a terminologia: temos o isolamento dos casos positivos, e as quarentenas (ou isolamento profiláctico) dos contactos de risco. As quarentenas estão em vias de extinção, um pouco por todo o mundo; estão cada vez mais simplificadas ou a desaparecer para vacinados, crianças, trabalhadores de saúde. Por isso, acredita-se que a tendência será o seu desaparecimento.

Portanto, o próximo passo é saber quando acabará o isolamento dos casos positivos, e, quando isto for possível, é bem provável que seja o fim da pandemia. O isolamento não beneficia em nada o indivíduo (só o prejudica), e numa sociedade tão individualista leva a um conflito de interesses, motivo pelo qual muita gente prefere não se testar. O isolamento serve um propósito apenas para a sociedade – ao diminuir o número de infecções, diminui o número de hospitalizações, e mitiga a pressão sobre os serviços de saúde. Prevenir/diminuir as infecções é útil, essencialmente por duas razões: 1) ganhar tempo para que mais pessoas se vacinem, e 2) evitar a sobrecarga dos hospitais. E este sempre foi o epicentro da questão: qual o grau de normalidade em que conseguimos viver sem que os hospitais e centros de saúde percam a capacidade de manter o bom atendimento aos doentes?

É possível que os isolamentos passem de obrigatórios por lei a aconselháveis, ficando à interpretação do bom senso de cada um, tal como gostamos mais de viver. Pode haver também períodos de transição, em que em determinadas alturas ou zonas geográficas os isolamentos sejam desnecessários, e noutras andemos para trás – o tal fenómeno on/off ou ioiô, como aconteceu para outras medidas. Este é o próximo passo a ser equacionado, quando o surto Ómicron estiver em clara efervescência, mas só a realidade dos hospitais pode ditar o timing certo.

O fim da pandemia requer uma análise rigorosa de muitos diferentes saberes da ciência, e, pese embora a percepção de normalidade seja algo de muito subjectivo e sentimental, o fim dos isolamentos, com a sociedade e a economia plenamente abertas, será o marco mais importante a conquistar.

Eu espero, sinto e acredito que seja para breve. Mas aquilo que cada um espera, sente e acredita não serve para nada no campo da ciência.