Os dados e dúvidas sobre a covid-19 e a gravidez
Casos de contágio entre mãe e filho durante a gravidez ou parto são raros. O primeiro bebé de uma mãe infectada com SARS-CoV-2 em Portugal nasceu em Março de 2020, no Porto, e os testes realizados foram negativos. Esta quarta-feira nasceu Santiago, filho de uma mãe gravemente doente com covid-19. O primeiro teste realizado ao recém-nascido foi negativo.
Santiago nasceu esta quarta-feira no Hospital de S. João, no Porto, com 2420 gramas e encontra-se bem. A mãe, uma mulher de 35 anos com covid-19 grave e que não foi vacinada, está ligada ao dispositivo ECMO, no Serviço de Medicina Intensiva desse hospital. O parto foi feito por cesariana programada e um primeiro teste à covid-19 deu resultado negativo, mas será feito um segundo teste. O caso despertou o interesse sobre o que já sabemos da relação entre a gravidez e a infecção pelo SARS-CoV-2.
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Santiago nasceu esta quarta-feira no Hospital de S. João, no Porto, com 2420 gramas e encontra-se bem. A mãe, uma mulher de 35 anos com covid-19 grave e que não foi vacinada, está ligada ao dispositivo ECMO, no Serviço de Medicina Intensiva desse hospital. O parto foi feito por cesariana programada e um primeiro teste à covid-19 deu resultado negativo, mas será feito um segundo teste. O caso despertou o interesse sobre o que já sabemos da relação entre a gravidez e a infecção pelo SARS-CoV-2.
A transmissão do vírus ocorre no útero entre mãe e filho?
Numa publicação da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a covid-19 na gravidez e parto, actualizada a 30 de Agosto de 2021, os especialistas admitem que ainda não se sabe se uma mulher grávida com covid-19 pode transmitir o vírus ao seu feto ou bebé durante a gravidez ou o parto. “Até à data, o vírus activo não foi encontrado em amostras de líquido à volta do bebé no útero ou no leite materno”, acrescentam. Um estudo divulgado em Julho de 2020 concluía que as mães infectadas podem transmitir o SARS-CoV-2 aos filhos após detectarem a presença de anticorpos IgM contra o novo coronavírus em dois recém-nascidos em Itália. Assim, há alguns casos raros reportados de bebés que tiveram um resultado positivo logo após o parto, não sendo possível determinar com rigor o momento do contágio.
Que dados existem em Portugal sobre as grávidas infectadas e os seus recém-nascidos?
Em Portugal, o primeiro bebé de uma mãe infectada nasceu a 17 de Março de 2020, no Hospital de S. João, no Porto. Os testes ao recém-nascido revelaram que não tinha sido infectado pelo SARS-CoV-2, confirmando, nessa altura, que o risco de transmissão entre a mãe o bebé durante a gravidez e o parto é muito reduzido.
Especialistas da Unidade de Neonatologia do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca, na Amadora, divulgaram em 2021 os resultados de um estudo que quis “descrever as características e resultados clínicos das grávidas com SARS-CoV-2 e dos seus recém-nascidos”. Através da revisão de processos clínicos de grávidas com infecção por SARS-CoV-2 admitidas para o parto, e dos seus recém-nascidos, o estudo olhou para o período de Abril a Dezembro de 2020 naquele hospital da área metropolitana de Lisboa.
“De um total de 1755 nascimentos, 81 (4,6%) foram de mães positivas para SARS-CoV-2”, escreve-se nas conclusões, onde também se regista que “nenhum recém-nascido apresentou sintomas relacionados com a infecção por covid-19 e todos foram negativos por rt-PCR para SARS-CoV-2 ao nascimento e às 48 horas”. Os autores do artigo publicado na revista Acta Médica Portuguesa refere ainda que “no total, 85,2% dos recém-nascidos tiveram alta para o domicílio com a mãe” e concluem que “as grávidas com covid-19 apresentam características imunológicas semelhantes a grávidas saudáveis e ainda não é clara a transmissão vertical do SARS-CoV-2”. Este estudo, adiantam ainda, “corrobora resultados maternos e neonatais anteriores, incluindo a ausência de resultados adversos a curto prazo com alojamento conjunto e amamentação”.
Um outro estudo realizado pelo serviço de pediatria do Hospital Garcia de Orta mostrou que o alojamento conjunto de recém-nascidos com mães infectadas pelo SARS-CoV-2 e o aleitamento materno não trouxeram riscos acrescidos para os bebés de terem doença grave de covid-19. Dos 77 recém-nascidos de mães infectadas – partos realizados na unidade de Almada durante 2020 – que participaram no estudo, apenas quatro testaram positivo entre as primeiras 24 a 48 horas e nenhum precisou de cuidados especiais.
Uma mãe vacinada transmite anticorpos ao filho?
Em Março de 2021, já com a vacina a começar a correr mundo, foi notícia o caso de uma profissional de saúde norte-americana que deu à luz um bebé com anticorpos contra a covid-19. A mãe foi vacinada com a primeira dose da vacina da Moderna no fim de Janeiro, quando estava nas 36 semanas de gestação. Quando deu à luz, três semanas depois, as análises ao sangue do bebé, do sexo feminino, revelaram que já tinha anticorpos contra a doença. Na mesma altura, foi divulgado o resultado de um estudo norte-americano que concluiu que “mulheres grávidas e a amamentar imunizadas contra a covid-19 com as vacinas de ARN-mensageiro têm altos níveis de anticorpos que as protegem contra o vírus SARS-CoV-2”. Os investigadores destacavam que “as vacinas conferem imunidade aos recém-nascidos através do leite materno e da placenta, onde também se encontram anticorpos”.
Bebé pode receber anticorpos através da amamentação?
Um estudo português divulgado em 2021 terá sido o primeiro a detectar células imunitárias de memória específicas de vacinas contra a covid-19 em leite materno. Foi também o único estudo em que se observou que “certos anticorpos contra o coronavírus SARS-CoV-2 encontrados no leite de mães vacinadas são produzidos nas glândulas mamárias e não no sangue”. O artigo foi publicado na revista Cell Reports Medicine e liderado por imunologistas do Centro de Estudos de Doenças Crónicas (Cedoc) da Universidade Nova de Lisboa. O trabalho confirmou que o leite de mães vacinadas tinha anticorpos contra o coronavírus SARS-CoV-2 e identificou linfócitos T específicos da vacina (células imunitárias de memória), que podem ser transmitidos ao bebé e potencialmente dar-lhe uma protecção de longa duração contra o vírus.
As grávidas podem ser vacinadas?
Sim. Não existe nenhuma razão nem dado conhecido que desaconselhe a vacinação de mulheres grávidas. A inclusão deste grupo da população nos planos de vacinação foi um pouco atrasada, propositadamente, enquanto se esperava pelos resultados de estudos e dos ensaios das principais empresas produtoras de vacinas com mulheres grávidas. As vacinas demonstram ser seguras e eficazes e nenhuma das imunizações aprovadas usa o vírus vivo, que poderia eventualmente colocar alguns riscos. As mulheres devem procurar informação e conselho junto dos profissionais de saúde que as acompanham. As normas em vigor publicadas pela Direcção-Geral da Saúde referem que “as grávidas com 16 ou mais anos podem ser vacinadas contra a covid-19 a partir das 21 semanas de gestação, depois de fazerem a ecografia morfológica, e respeitando um intervalo de 14 dias da toma de qualquer outra vacina”.
As mulheres grávidas correm um maior risco?
Nada indica que as grávidas corram um maior risco de ser infectadas, mas alguns estudos têm indicado que pode existir um risco aumentado de desenvolver doença grave nestas mulheres, quando se compara com mulheres da mesma idade mas que não estavam grávidas. Aliás, já se sabe que as grávidas correm maiores riscos de ter doenças respiratórias infecciosas. Exige-se um maior esforço para fornecer oxigénio ao bebé enquanto, ao mesmo tempo, o útero cresce e empurra o diafragma para dar espaço ao feto.
Uma mulher grávida deve ter precauções especiais?
As medidas de protecção e precaução a tomar por uma mulher grávida para se proteger e proteger os que estão à sua volta e evitar ser infectada pelo vírus são as mesmas de qualquer outra pessoa. Em caso de algum sintoma, durante a gravidez ou após o parto, devem contactar um profissional de saúde.
Uma mulher grávida infectada deve fazer o parto por cesariana?
Não. A OMS mantém a sua posição de que as cesarianas só devem ser realizadas quando “medicamente justificadas”. “O modo de parto deve ser individualizado e baseado nas preferências de uma mulher, juntamente com as indicações obstétricas”, acrescenta-se.
Uma mulher infectada pode tocar no seu filho recém-nascido?
Mais uma vez, a OMS responde com um “sim”. “O contacto próximo e a amamentação precoce e exclusiva ajudam o bebé a prosperar”, justificam, confirmando que a mãe deve ser apoiada para “amamentar com segurança, com boa higiene respiratória”, bem como aconselhada a segurar o bebé em contacto com pele e a partilhar o quarto com o recém-nascido. Com o aviso: “Deve lavar as mãos antes e depois de tocar no seu bebé, e manter todas as superfícies limpas. As mães com sintomas de covid-19 são aconselhadas a usar uma máscara médica, durante qualquer contacto com o bebé.”