O próximo Governo tem de dar mais pedalada ao uso da bicicleta nas cidades

FPCUB e Mubi, duas associações dedicadas à mobilidade em bicicleta, entregaram propostas aos partidos, numa tentativa de influenciar os programas eleitorais. O próximo governo vai ter de fazer muito mais, alertam.

Foto
É preciso aumentar a rede de ciclovias mas o investimento deve ser alargado a outras áreas, defendem as associações Nuno Ferreira Santos

A Federação portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB) e a Mubi - Associação para a Mobilidade Urbana em Bicicleta, acreditam que não há ponto de retorno no caminho para o incremento do peso da mobilidade activa (quer a pé, quer de bicicleta) no quotidiano das cidades portuguesas. Mas conscientes da lentidão com que tem sido posta em prática a Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Ciclável (ENMAC), pedem mais pedalada ao Governo que aí vem. Ambas entregaram propostas aos partidos que vão a votos a 30 de Janeiro, e o líder da federação, José Manuel Caetano, deixa um aviso: “Isto não pode ficar na gaveta”.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A Federação portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB) e a Mubi - Associação para a Mobilidade Urbana em Bicicleta, acreditam que não há ponto de retorno no caminho para o incremento do peso da mobilidade activa (quer a pé, quer de bicicleta) no quotidiano das cidades portuguesas. Mas conscientes da lentidão com que tem sido posta em prática a Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Ciclável (ENMAC), pedem mais pedalada ao Governo que aí vem. Ambas entregaram propostas aos partidos que vão a votos a 30 de Janeiro, e o líder da federação, José Manuel Caetano, deixa um aviso: “Isto não pode ficar na gaveta”.

Quem ler os dois documentos vai encontrar propostas no sentido de uma aposta em serviços de bicicletas partilhadas, de mais estacionamento seguro na via pública, de mais educação para o uso da bicicleta nas escolas, de mais apoios fiscais a um veículo que continua a ser tratado, neste aspecto, como se não fosse um veículo mas um simples objecto de lazer. E sim, claro, mais ciclovias e vias com acalmia de tráfego onde os vários modos possam conviver, em cidades onde a articulação entre o andar a pé ou usar o velocípede e, a seguir, entrar num transporte público, deveria ser cada vez mais fácil. Estes são pontos comuns às duas organizações.

Uma enorme mudança cultural

Há muitas mais medidas nos documentos entregues pela FPCUB e pela Mubi, mas acima de tudo há uma ideia também partilhada que Rui Igreja, dirigente desta última, resume desta forma: “Isto é uma enorme mudança cultural. Se temos de, até 2030, atingir a média de utilização da bicicleta da Europa, temos de pôr várias medidas em prática o quanto antes, porque a transformação é sempre lenta”. Para José Manuel Caetano “qualquer político inteligente e de boa vontade, da nova geração, aproveita estas ideias que estão no documento e que têm estado na gaveta”.

Na verdade, pouco do que as duas entidades defendem, do ponto de vista prático, é novo, porque a ENMAC, aprovada há dois anos e meio, bebeu muito dos seus contributos. O que exigem é que não se percam de vista os objectivos inscritos na estratégia, e se aloquem os meios para a fazer cumprir. A FPCUB, propõe que se continue a ter como meta, desta vez para 2023, que 5% das deslocações sejam realizadas em bicicleta. Para cumprir a ambição de ter 10%, ou seja, mais 500 mil portugueses a usar bicicleta quotidianamente, em 2030, a Mubi pede que 20% do Orçamento despendido em transportes seja alocado para esta forma de mobilidade.

Ambas as associações já fizeram chegar os documentos aos partidos, na tentativa de influenciar os respectivos programas. E ambas enquadram o que defendem nas transformações que a crise climática está a impor ao mundo, às cidades e, dentro destas, à mobilidade dos seus habitantes. Desde os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, ao Pacto Ecológico Europeu, e à portuguesa Lei de Bases do Clima, não há enquadramento estratégico ou de política que não coloque a bicicleta no centro das soluções para redução de emissões associadas à vida urbana. Por isso, insiste Rui Igreja, “é preciso passar do discurso político” - onde isto já está bem presente, considera - “para a prática”.

Liderar pelo exemplo

Só com medidas que mexam com o urbanismo (construam-se bicicletários nos prédios de habitação, pede a FPCUB​), na educação, nos benefícios fiscais, nas condições infra-estruturais e na própria possibilidade de participação das comunidades no debate sobre as redes de percursos a construir é que essa mudança cultural se produzirá. “Uma pessoa pobre sonha é em ter um carro”, assinala José Manuel Caetano. E, neste campo, Rui Igreja acrescenta o quão importante seria que o país tivesse decisores e mais figuras públicas que aparecessem a usar a bicicleta quotidianamente. Sem isto, lamenta, as pessoas sentirão que a classe política lhes quer impor algo que não usa, e a mudança vai ser muito lenta.

Em todo o caso, um e outro acreditam que, com maior ou menor vontade política, a ENMAC vai ser acelerada por via de todo o enquadramento internacional. Na agenda urbana, a Comissão Europeia “vai favorecer os investimentos em municípios que tenham planos de mobilidade urbana sustentável”, recorda Rui Igreja. Mas nem a Mubi nem a FPCUB​ pretendem que Portugal siga nesta prova de fundo, a caminho da neutralidade carbónica na mobilidade urbana, longe do pelotão, junto ao carro-vassoura. “Por todo o mundo, e na Europa, a pandemia acelerou as políticas em favor da bicicleta. Se não fizermos mais por ela, a discrepância vai aumentar”, alerta Rui Igreja.