Governo suspende revisão do subsídio de mobilidade para a Madeira

Lei aprovada por unanimidade em 2019 nunca chegou a sair do papel. Funchal fala em “incompetência”, “bloqueio” e “motivação política”.

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Daniel Rocha

Quase dois anos depois de ter sido aprovada na Assembleia da República, mas sem nunca ter sido aplicada, o Governo decidiu esta quarta-feira suspender a lei que em 2019 actualizou o Subsídio Social de Mobilidade (SSM), passando a vigorar o modelo anterior.

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Quase dois anos depois de ter sido aprovada na Assembleia da República, mas sem nunca ter sido aplicada, o Governo decidiu esta quarta-feira suspender a lei que em 2019 actualizou o Subsídio Social de Mobilidade (SSM), passando a vigorar o modelo anterior.

A decisão, tomada esta quarta-feira em Conselho de Ministros, foi bastante criticada na Madeira, que fala em “motivação política” e “incompetência” do executivo em implementar leis aprovadas na Assembleia da República.

“Este é um tema que tem merecido um desprezo continuado ao longo do tempo por parte de toda a equipa liderada por este primeiro-ministro e que encontra nesta temática, do subsídio de mobilidade, uma arma de arremesso para aprisionar os madeirenses”, protesta ao PÚBLICO o secretário regional do Turismo e Cultura, Eduardo Jesus, apontando a “completa incapacidade” do Governo da República para implementar legislação aprovada em São Bento.

No comunicado divulgado no final da reunião do Conselho de Ministros, o Governo justifica a aprovação do “decreto-lei que suspende a vigência da Lei n.º 105/2019, de 6 de Setembro”, e que ao mesmo tempo “repristina o Decreto-Lei n.º 134/2015, de 24 de Julho”, com a necessidade de “ultrapassar os constrangimentos que têm impedido a aplicação” do novo modelo de SSM para residentes e estudantes da Madeira.

Desta forma, os madeirenses que viajem de avião entre a Madeira e o continente ou para os Açores vão continuar a ter de pagar a totalidade da passagem, sendo depois reembolsados do valor pago acima dos 86 euros (no caso dos residentes) e 65 euros (no dos estudantes).

Já o novo modelo, agora suspenso e que nunca tinha saído efectivamente do papel, estabelecia que os passageiros pagassem uma tarifa fixa (86 euros para residentes e 65 euros para estudantes), cabendo depois ao Estado pagar o restante directamente às companhias aéreas.

“É importante que se tenha em linha de conta que a Assembleia da República votou esta lei. Foi aprovada e entrou em vigor, faltando da parte do Governo da República a respectiva regulamentação”, sublinha Eduardo Jesus, insistindo que o processo não avançou por incompetência de Lisboa e “vontade de bloquear” o que era uma vontade dos madeirenses.

O SSM foi estruturado em 2015, ainda no governo de Pedro Passos Coelho, com o objectivo de atenuar os custos de insularidade das duas regiões autónomas. No ano seguinte, o Funchal manifestou vontade de rever um modelo, que acabou por ter impacto no preço médio das passagens áreas. As viagens, principalmente em períodos de maior pressão, Natal, Verão e Páscoa, subiram para valores a rondar os 500 euros, o que significava que os passageiros tinham que adiantar o valor, e só depois da viagem eram reembolsados. Esta situação provocava grandes constrangimentos, principalmente no caso dos estudantes universitários, cujas famílias tinham que ter disponibilidade financeira para adiantar esses montantes.

A revisão do modelo foi aprovada em Julho de 2019 por unanimidade na Assembleia da República, depois de já ter recolhido igual unanimidade no parlamento madeirense, mas o Governo, alegando dificuldades em operacionalizar o sistema, nunca chegou a criar a regulamentação necessária para o diploma ser aplicado.

Um ano antes, o governo madeirense tinha já acordado com um conjunto de agências de viagens um modelo que permite aos madeirenses que frequentam estabelecimentos de ensino superior no continente e nos Açores pagarem apenas 65 euros por cada viagem de ida e volta a partir do Funchal. O protocolo abrange quatro viagens por ano, e serviu como argumento para mostrar que era possível fazer o sistema funcionar.

O decreto-lei aprovado pelo Conselho de Ministros mereceu parecer desfavorável de ambos os parlamentos regionais, mas não tem carácter vinculativo. Vai ser agora enviado para a Presidência da República, para apreciação.

Desde que entrou em vigor, a meio de 2015, Orçamento do Estado já assumiu cerca de 300 milhões de euros com o subsídio de mobilidade.