Exmª Srª presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia
Além do subfinanciamento, a FCT tem criado entraves burocráticos e regras ad hoc que objetivamente limitam o número de candidaturas e tornam o acesso a financiamento enviesado para certos grupos.
Professora doutora Helena Pereira,
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Professora doutora Helena Pereira,
A resposta do nosso país à covid-19 mostra como a ciência e tecnologia (C&T) são determinantes nas melhores escolhas e estratégias para a combater ou mitigar os seus impactos negativos. Em tempo recorde, a ciência mobilizou-se e revelou-se indispensável na luta contra a pandemia. Nunca foi tão evidente para os cidadãos a importância de colocar a investigação e a inovação, bem como as instituições que as promovem, no centro das prioridades sociais.
No entanto, Portugal continua a enfrentar desafios estruturais amplamente diagnosticados, apesar de esforços consideráveis por parte da comunidade científica na apresentação de propostas concretas para os resolver, incluindo através de cartas abertas assinadas por milhares de investigadores e documentos preparados em conjunto com empresários.
Reconhecemos um esforço recente para organizar concursos regulares e assim aumentar a previsibilidade da ciência. Todavia, se as taxas de sucesso forem muito baixas, ter financiamento continua a ser imprevisível. Este foi o caso dos dois últimos concursos basilares de financiamento do sistema científico nacional, os Projetos em Todos os Domínios Científicos (PTDC) e o Concurso Estímulo ao Emprego Científico Individual (CEEC), promovidos pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). As duas últimas edições destes concursos tiveram taxas de sucesso muitíssimos baixas (1) não porque a qualidade das propostas fosse má (candidaturas com avaliações científicas excelentes ficaram sem financiamento), mas porque o financiamento é cronicamente insuficiente.
Além do subfinanciamento, a FCT tem criado entraves burocráticos e regras ad hoc que objetivamente limitam o número de candidaturas e tornam o acesso a financiamento enviesado para certos grupos. Uma destas regras consistiu na obrigatoriedade de que cada candidatura PTDC garanta a dedicação de dois doutorados em exclusividade, quer na sua versão normal (IC&DT) quer nos Projetos Exploratórios (PeX), que só podem pedir até um quinto do financiamento máximo. Esta imposição vai contra a independência e liberdade científica, dado que exige partilha formal de ideias e propostas com colegas mesmo quando estas não foram efetivamente produto duma colaboração. Esta imposição impede também a realização de candidaturas independentes de grupos que tenham apenas o seu coordenador como doutorado e prejudica desproporcionalmente grupos de investigação mais pequenos e investigadores mais juniores, que se veem limitados na sua já tão difícil progressão.
Assim, vimos solicitar que no concurso PTDC de 2022:
1. Exista um reforço do financiamento para, pelo menos, 100 milhões de euros;
2. O orçamento alocado aos PeX não ultrapasse 20% do financiamento total;
3. Seja eliminada a exigência de dois investigadores responsáveis (IR) nos Projetos Exploratórios, sendo esta exigência contrária ao próprio princípio destes projetos de promover ideias novas;
4. Termine a obrigatoriedade de os projetos IC&DT terem dois IR exclusivos, podendo pelo menos os co-IR participar em mais do que uma candidatura.
Apesar de insuficientes para resolver os enormes problemas estruturais que o sistema científico nacional enfrenta, esta medidas corrigem uma injustiça fundamental, e sinalizam um compromisso efetivo com o financiamento da ciência em Portugal.
(1) No concurso PTDC-2021, dos 4870 projetos propostos, apenas 551 foram apoiados, o que implica que pelo menos 8638 investigadores doutorados, bem como todos os alunos por eles orientados, tenham ficado sem financiamento da FCT, neste concurso. No caso dos projetos IC&DT, apenas 6% recebeu financiamento o que corresponde a menos de um terço das candidaturas com pontuação superior a 8 (num máximo de 9).
Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico
Rita Abranches (ITQB-NOVA); Margarida Amaral (FC-ULisboa); Cecília Arraiano (ITQB-NOVA); Patrícia Beldade (FC-ULisboa); Orfeu Bertolami (FC-UPorto); Mónica Bettencourt-Dias (IGC); Adelino Canário (UAlgarve); José Luís Cardoso (ICS-ULisboa); Inês Cardoso Pereira (ITQB-NOVA); Marina Costa Lobo (ICS-ULisboa); António Costa Pinto (ICS-ULisboa); Sérgio Filipe (FCT-NOVA); Elvira Fortunato (FCT-NOVA); Mariana Gomes de Pinho (ITQB-NOVA); João Gonçalves (iMED-ULisboa); Joana Gonçalves de Sá (LIP); Isabel Gordo (IGC); Federico Herrera (FC-ULisboa); António Jacinto (NMS-NOVA); Luísa Lopes (IMM); Pedro Magalhães (ICS-ULisboa); Helder Maiato (I3S-UPorto); Lígia Martins (ITQB-NOVA); Rui Moreira (FF-ULisboa); Maria Mota (IMM); Ana Nunes de Almeida (ICS-ULisboa); Arlindo Oliveira, (IST-ULisboa); Margarida Oliveira (ITQB-NOVA); Raquel Oliveira (IGC); Joana Palha (ICVS-UMinho); Josefa Pandeirada (UAveiro); Susana Peralta (NOVA-SBE); Ana Petronilho (ITQB-NOVA); João Ramalho-Santos (CNC-UCoimbra); Carlos Ribeiro (Fundação Champalimaud); Carlos Salema (IST-ULisboa); Maria Santos (FF-ULisboa); Cláudio Soares (ITQB-NOVA); José Manuel Sobral (ICS-ULisboa); João Carlos Sousa, (ICVS-UMinho); Nuno Sousa (EMed-UMinho); Élio Sucena (IGC); Teresa Summavielle (I3S-UPorto); Claudio Sunkel (I3S-UPorto); Henrique Veiga Fernandes (Fundação Champalimaud); Karina Xavier (IGC).