Taliban recomeçam a emitir passaportes

Islamistas voltam a reafirmar que quem quiser e puder sair do Afeganistão poderá fazê-lo. Movimento promete uma vez mais o regresso das raparigas às escolas e universidades, agora depois das férias de Inverno.

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Activistas e jornalistas afegãs numa conferência de imprensa sobre violência de género, em Dezembro, em Cabul MAXIM SHIPENKOV/EPA

O Governo dos taliban anunciou, este sábado, que vai recomeçar a emitir passaportes no Afeganistão, cumprindo assim a promessa de permitir aos afegãos que o desejem, e que disponham de vistos válidos, deixarem o país. Muitos dos que sentem ameaçados pelos islamistas continuam sem conseguir sair, e agora há muitos mais que querem fugir da profunda crise económica que a ONU diz estar à beira de se transformar numa crise humanitária trágica.

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O Governo dos taliban anunciou, este sábado, que vai recomeçar a emitir passaportes no Afeganistão, cumprindo assim a promessa de permitir aos afegãos que o desejem, e que disponham de vistos válidos, deixarem o país. Muitos dos que sentem ameaçados pelos islamistas continuam sem conseguir sair, e agora há muitos mais que querem fugir da profunda crise económica que a ONU diz estar à beira de se transformar numa crise humanitária trágica.

“A emissão de passaportes começará amanhã em três regiões, incluindo Cabul”, disse à imprensa Alam Gul Haqqani, chefe do serviço de passaportes, um serviço encerrado desde a tomada do poder pelos taliban, a meio de Agosto, e brevemente reaberto em Outubro, quando o número de pedidos provocou problemas técnicos que o bloquearam. “Todos os problemas técnicos estão resolvidos, os aparelhos biométricos foram arranjados”, esclareceu Haqqani.

Num outro anúncio, os taliban voltaram a prometer que as estudantes vão poder voltar a todas as escolas e universidades do país — o movimento já anunciou várias vezes que as raparigas e jovens com mais de 12 anos poderiam voltar à escola, mas, na prática, isso aconteceu em muito poucos sítios. Um dos problemas será a falta de professoras: ao contrário do que aconteceu quando os taliban estiveram pela primeira vez no poder, entre 1996 e 2001, desta vez garantem que as raparigas poderão estudar (e dizem que as mulheres poderão trabalhar), mas desde que sejam ensinadas por professoras, nunca por homens.

Numa entrevista à agência Efe, o porta-voz do Ministério para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício, Mohammad Sadiq, afirmou que o Ministério da Educação garante que “as escolas e universidades para raparigas começarão após as férias de Inverno, e nas províncias onde o tempo está bom, mais cedo”. A meio de Setembro, os islamistas extinguiram o Ministério dos Assuntos da Mulher e substituíram-no pela pasta da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício, que já existira no seu primeiro regime.

Questionado sobre os direitos das mulheres, que, apesar das promessas continuam por assegurar, Sadiq disse que “o islão deu às mulheres educação e direitos laborais”, reforçando que o seu Governo quer “proporcionar um ambiente de trabalho seguro paras as mulheres” — o que, na interpretação radical dos taliban, costuma querer dizer longe dos olhos de homens.

Apesar dos muitos problemas que o Afeganistão continuava a enfrentar, os 20 anos de intervenção estrangeira permitiram um progresso considerável na educação feminina e na integração das mulheres na vida profissional e social.

Antes da tomada do poder pelos taliban, uma em cada cinco mulheres urbanas trabalhava e as mulheres representavam mais de um quinto dos trabalhadores na função pública e também no Parlamento. De acordo com a OMS e o Banco Mundial, dos nove milhões de afegãos a estudar, 3,5 milhões eram raparigas — em 2003, menos de 10% das meninas afegãs andavam na escola; em 2017, já eram 33%. Em algumas universidades, mais de metade dos estudantes eram raparigas. Actualmente, a maioria não voltou a trabalhar, por medo ou por indicação dos novos dirigentes, enquanto profissionais como jornalistas e juízas ou activistas dos direitos humanos têm sido perseguidas ou até mortas e muitas fugiram do país.

Ao mesmo tempo, todos os dias há manifestações de afegãs, principalmente na capital, Cabul, e os protestos começaram poucos dias depois da chegada dos taliban à cidade, numa prova de que muitas mulheres não estão dispostas a abdicar do que conseguiram nos últimos anos. Sem que as mulheres possam trabalhar livremente é a própria economia afegã que será incapaz de se reerguer, notam as activistas afegãs.