Malta, onde a cultura ofusca a praia
O leitor Mário Menezes partilha a sua experiência no arquipélago do Mediterrâneo, onde até encontrou o Popeye.
Ao fim de 594 dias voltei a viajar de avião!
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Pouco conhecimento tinha de Malta e encontrá-la no mapa não era fácil. Tinha-a como um destino de praia. Errado! Esta pequena nação tem uma História grandiosa e um património cultural gigantesco e as praias até são o seu parente pobre. É um arquipélago com várias ilhas, sendo habitadas as de Malta, Gozo e Comino. Situa-se numa posição estratégica no meio do mar Mediterrâneo, numa encruzilhada de rotas aéreas e marítimas, com interesses económicos e militares, pelo que ao longo dos anos foi alvo de várias disputas territoriais e fustigada por guerras.
A sua História remonta ao Neolítico. Mas tarde os fenícios foram os primeiros a ocupá-la. Posteriormente os gregos, os cartagineses e os romanos, que implantaram o Cristianismo. Vieram depois os bizantinos e os árabes, que influenciaram a cultura e a língua. Depois os sicilianos, que restauraram o Cristianismo, que se mantém até hoje. Em seguida, os aragoneses, que a cederam à Ordem de Malta, os Cavaleiros de São João, que governaram. Napoleão Bonaparte também conquistou Malta. Por último, os britânicos, que ali permaneceram até 1964. Actualmente é um país independente, faz parte da União Europeia e do euro.
Malta é também chamada de “Hollywood da Europa”. Os estúdios em Kalkara, as ruas, os monumentos, as falésias e as praias foram cenários de grandes obras da 7.ª arte e também de famosas séries.
É um país seguro e em franco desenvolvimento, a avaliar pelo parque imobiliário. Banca, casinos e jogos online são algumas das actividades económicas, além do turismo. Os preços atractivos, comparativamente a outros destinos europeus, as praias, o clima quente e pouco chuvoso e os voos low-cost, são o impulsionador.
Oferta hoteleira para todas as bolsas, transportes públicos de qualidade, autocarros modernos com wi-fi que nos levam facilmente a todo o lado. Vida nocturna agitada com discotecas de moda, bares e pubs que, à boa maneira britânica, servem refeições e pequenos almoços.
Não sou apreciador, mas o coelho é rei, com mais de 100 pratos, e a carne de cavalo também está presente. Adorei o pastizzi e o qassatat, dois típicos folhados, recheados com queijo ricota, legumes ou frango, o bragjoli, um guisado de bifes enrolados e recheados, e também o polvo maltês, que por lá se chama qarnita. Pratos cozinhados com muitos aromas exóticos, notando-se a influência árabe. Fish and chips, comida turca , pizzas e especialidades sicilianas também abundam. A marca de cerveja mais famosa é Cisk e existem vinhos malteses.
La Valetta, a pequena capital, está englobada num aglomerado urbano constituído por outras cidades, onde normalmente os visitantes ficam alojados, que servem de passagem e também são de visita obrigatória. As suas muralhas e edifícios sobressaem ao longe. O Forte de St. Elmo serviu de cenário a diversas produções cinematográficas. As celas da infame prisão de Sagmalcilar de O Expresso da Meia Noite podem ser observadas do alto. O seu Museu da Guerra exibe artefactos relacionados com as Guerras Mundiais, onde Malta teve papel preponderante.
As ruas e ruelas de La Valetta, com as suas típicas varandas, possuem um património arquitectónico riquíssimo. A cidade banhada pelo mar é um museu a céu aberto. Das igrejas, Malta tem uma por cada dia do ano, a cúpula da Igreja Carmelita sobressai na paisagem, mas o maior destaque é a Concatedral de São João, construída pelos Cavaleiros de São João entre 1573 e 1578. Discreta por fora, mas o seu interior é totalmente decorado. As paredes e os tectos com pinturas, as capelas e até mesmo o chão da nave em que estão enterrados cavaleiros importantes, que é composto por lápides de mármore com diferentes inscrições em latim. No interior estão guardadas duas obras emblemáticas de Caravaggio: A Decapitação de São João Baptista e São Jerónimo Escrevendo.
Do aglomerado urbano, cujas vistas desde as muralhas são exuberantes, destacam-se as “Três cidades” (Senglea, Birgu e Cospicua), acessíveis de ferry, em tudo semelhantes a La Valetta, onde se encontra o Forte St. Ângelo. Floriana com a sua marina. Gżira, onde se localiza a ilha Manoel, com o Forte Manoel. E Sliema, também acessível de ferry, em tempos uma vila de pescadores, hoje é uma cidade onde os prédios de andares de luxo e vista para o mar Mediterrâneo dominam a zona marginal. A elevada densidade populacional, a grande concentração de bares, restaurantes, lojas e hotéis, tornam-na o local mais apelativo para o turista ficar alojado. As zonas balneares de Sliema são servidas por um passeio marítimo, que nos conduz às baías de St Julian, de St. George e de Spinola. E mais longe fica Paceville, onde a vida nocturna é a mais intensa!
Uma visita a Malta não fica completa sem uma ida ao seu interior: a Mdina, a “cidade do silêncio” devido à tranquilidade das suas ruas, ao Museu de Aviação, em Ta’ Qali, com um hangar dedicado à Batalha de Malta da II Guerra Mundial, junto ao complexo desportivo que engloba o modernizado Estádio Nacional. Às ilhas de Gozo, à sua capital Victoria, com a sua Citadella amuralhada que nos proporciona vistas sobre quase todo o arquipélago, e Comino, para mergulhar nas águas cristalinas da lagoa Azul eternizadas por Brooke Shields. Para “miúdos” da minha geração, a Popeye Village fará as suas delícias. A cidade de “Sweethaven” tal como em criança a vimos no cinema. Ao encontrarmos na rua os nossos heróis, Popeye, Olívia Palito e o Brutus, regredimos 40 anos nas nossas vidas. Regressamos a casa mais velhos, mas também mais felizes!
Mário Menezes
Autor de alguns textos em Amantes de Viagens