Papa regressa a Lesbos, cinco anos depois: “Pouco mudou”
Francisco criticou aqueles que usam a crise dos refugiados na Europa para fins de propaganda política e apelou ao fim do que chamou de “naufrágio de civilizações”.
O Mediterrâneo continua a ser um “cemitério sombrio sem lápides”, disse este domingo o Papa Francisco, numa curta visita a Lesbos, a ilha grega que nos últimos anos tem sido um dos pontos cruciais da crise humanitária dos refugiados que tentam chegar à Europa.
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O Mediterrâneo continua a ser um “cemitério sombrio sem lápides”, disse este domingo o Papa Francisco, numa curta visita a Lesbos, a ilha grega que nos últimos anos tem sido um dos pontos cruciais da crise humanitária dos refugiados que tentam chegar à Europa.
O chefe da Igreja Católica tinha estado em Lesbos há cinco anos, quando levou para Itália 12 refugiados sírios e condenou a falta de solidariedade europeia face aos milhares que tentam atravessar o mar Mediterrâneo todos os meses, muitos dos quais acabam por morrer em naufrágios. “Pouco mudou” desde então, lamentou Francisco.
“Estou aqui para olhar para as vossas caras e para os vossos olhos. Olhos cheios de medo e expectativa, olhos que viram a violência e a pobreza, olhos raiados por demasiadas lágrimas”, disse o Papa durante uma visita ao campo de Mavrovouni, onde estão actualmente 2300 pessoas albergadas, segundo a Reuters.
Estas instalações vieram substituir o campo de Moria, que foi destruído num incêndio no ano passado e era conhecido pela sua permanente sobrelotação e pelas péssimas condições.
A crise dos refugiados tem ocupado um lugar central no discurso do Papa, que não se furta em criticar as decisões políticas que restringem o acesso de milhares de pessoas à União Europeia. “Estamos numa era de muros e arame farpado”, lamentou Francisco, que considerou “perturbadoras” as propostas de alguns líderes europeus de usarem fundos comunitários para financiar a construção de barreiras físicas para travar a migração irregular.
Em Lesbos, o Papa foi recebido de forma calorosa e parou para cumprimentar e conversar com famílias de migrantes e requerentes de asilo. “Amamos-te!” foi um dos gritos mais ouvidos pela multidão que o acompanhou, sobretudo muitas crianças.
A congolesa Enice Kiaku, que deu à luz uma criança já no campo, há cerca de dois anos, disse que a presença de Francisco a faz sentir “abençoada”. “Temos muitos problemas aqui, como refugiados, e muito sofrimento”, afirmou, citada pela Associated Press.
Francisco também apontou o dedo aos que usam os receios das populações para “instilar o medo dos outros” para fins políticos. Os que o fazem, disse o Papa, “falham em falar com igual veemência” sobre a exploração dos pobres, as guerras ou a indústria armamentista.
“As causas remotas [das migrações] devem ser atacadas, não as pessoas pobres que pagam as consequências e são usadas para propaganda política”, afirmou.
“Não deixemos que o mare nostrum [nosso mar] seja transformado num desolado mare mortuum [mar de morte]”, afirmou o sumo pontífice. “Não deixemos que este local de encontro se torne num teatro de conflito. Não deixemos que este ‘mar de memórias’ se transforme num ‘mar de esquecimento’. Por favor, paremos este naufrágio de civilizações”, pediu.
Francisco incluiu a passagem por Lesbos na viagem que fez ao Chipre e à Grécia nos últimos dias. Em Atenas, no sábado, o Papa já tinha abordado a crise dos refugiados na Europa. “Se antes os contrastes ideológicos impediam a construção de pontes entre o Leste e o Oeste do continente, hoje a questão migratória também abriu brechas entre o Sul e o Norte”, afirmou. Desde o início do ano, morreram a tentar atravessar o Mediterrâneo cerca de 1600 pessoas, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações.