Padeiro lesado do BES faz queixa no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem contra Portugal
Perdeu as poupanças de uma vida, 100 mil euros, que juntou a amassar pão, queixa-se da demora da Justiça portuguesa e conta como o processo BES continua pendente no Tribunal Central de Instrução Criminal porque “não é possível disponibilizar estantes metálicas a fim de acondicionar o processo”.
Um padeiro de 61 anos, residente em Sobral de Monte Agraço, no distrito de Lisboa, que perdeu 100 mil euros em poupanças que depositou no BES, avançou com uma queixa contra Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH). Em causa, está a demora da justiça e o facto de considerar que é um lesado há demasiado tempo.
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Um padeiro de 61 anos, residente em Sobral de Monte Agraço, no distrito de Lisboa, que perdeu 100 mil euros em poupanças que depositou no BES, avançou com uma queixa contra Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH). Em causa, está a demora da justiça e o facto de considerar que é um lesado há demasiado tempo.
Na queixa, o padeiro conta como, em 2014, a conselho de um gerente do BES, com a promessa de um juro anual de 4,5%, tirou o dinheiro que tinha numa conta na Caixa Geral de Depósitos (CGD). E como, poucos meses depois, em Agosto do mesmo ano, o banco foi alvo de uma resolução e perdeu todas “as economias de uma vida de trabalho, canseiras e fadigas de milhares de noites de labuta a amassar o pão”.
O padeiro alega que está há demasiado tempo à espera que se faça justiça e que tentou reaver, sem sucesso, o seu dinheiro através de um processo cível contra o BES, Ricardo Salgado e outros, tendo esgotado todas as possibilidades de recurso. Daí que esteja agora a recorrer ao TEDH.
“Face ao tempo de vida que resta peço aos juízes de Estrasburgo que apreciem o caso em tempo útil pois em Portugal tudo se tornou inútil”, lê-se na queixa, que sublinha que “o caso BES tornou-se um monstro de papel que não serve os fins da Justiça”.
Acrescenta que foi “expropriado das economias de uma vida a amassar o pão, servido de bandeja aos ‘senhores’ do capital, que frequentam a Sardenha e viajam de helicóptero até à Comporta para almoçarem na paz do dinheiro escondido nas offshores”. Diz que está deprimido e que muitas vezes não tem dinheiro nem para “para abastecer de combustível os veículos que demandam a zona oeste a fornecer o pão”.
Enquanto padece alega que este processo do caso BES se arrasta desde 2014 e que “ainda ninguém está preso, ninguém responde em julgamento, ninguém assume as suas responsabilidades”. Compara este processo com o de “Dona Branca” nos anos 80. Maria Branca dos Santos era uma usurária que montou um esquema em pirâmide que colapsou.
“Em 1984, no tempo do papel selado, sem meios humanos nem computadores, o caso da ‘Dona Branca’ foi investigado, acusado e julgado em menos de dois anos e os arguidos condenados em tribunal de júri”, recorda, para a seguir explicar que o processo-crime do caso do BES continua pendente no Tribunal Central de Instrução Criminal porque “não é possível disponibilizar estantes metálicas a fim de acondicionar o processo”.
Este é um facto. Na semana passada, a revista Sábado dava conta que a administradora judicial de Lisboa informou o juiz Ivo Rosa, que ficou com a instrução do processo, não ser possível “disponibilizar estantes metálicas”, porque todas as que existem foram levadas para os Campus da Justiça. Foram recolhidas pela Direcção-Geral da Administração da Justiça, que irá proceder à montagem das mesmas no edifício B do Campus da Justiça que, em Janeiro, vai albergar o novo Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, após a extinção do Tribunal Central de Instrução Criminal.
E esta extinção é também explicada na queixa que o padeiro apresentou no TEDH: “O Estado português teve a gentileza de extinguir o Tribunal Central de Instrução Criminal como estrutura especializada a meio do ano judicial, perturbando tudo e todos e nem sequer cede umas estantes metálicas para acomodar ou acondicionar a montanha de papel inútil que o caso BES se tornou”.
O padeiro também diz ao TEDH por que razão este é o maior processo da justiça portuguesa: é “composto por 767 volumes, acusação com 3552 folhas, assinada por sete procuradores, 25 arguidos e 105 assistentes, 384 volumes de apensos bancários, apensos de buscas com 114 volumes, com 4 terabytes de informação, equivale a seis vezes e meia a dimensão do processo Marquês, 23 requerimentos de abertura de instrução num total de 4532 folhas em 20 volumes”.
Diz o padeiro que a previsão de “uma astróloga da zona de Torres Vedras é que talvez em 2030 o caso BES inicie o julgamento”. O BES aguarda agora o início da fase de instrução, em que Ivo Rosa vai ouvir os arguidos e as respectivas testemunhas, e só depois decide se pronuncia ou não os arguidos para julgamento.
Por isso, pede o padeiro que os juízes do TEDH sejam mais céleres e decidam mais depressa o seu caso.