É “muito cedo” para dizer se há disseminação comunitária da variante Ómicron em Portugal, diz Graça Freitas
Em entrevista ao PÚBLICO, a directora-geral da Saúde diz que pouco se sabe sobre a nova variante e o seu comportamento, mas garante que, para já, os casos estão circunscritos a um surto. Cafu Phete, médio sul-africano do Belenenses SAD que regressou recentemente da África do Sul, foi a ponta do novelo puxado nos últimos dias.
Ainda são muitas as incógnitas sobre a Ómicron — a nova variante do SARS-CoV-2 que foi identificada pela primeira vez na África do Sul — e outras tantas sobre os treze casos a ela ligados detectados até agora em Portugal. Mas apesar das dúvidas e da prematuridade da investigação epidemiológica, a directora-geral da Saúde garantiu, em entrevista ao PÚBLICO ao fim da tarde desta segunda-feira, que até à data as infecções estão circunscritas ao “local de trabalho” e que não se pode afirmar que há transmissão comunitária da variante.
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Ainda são muitas as incógnitas sobre a Ómicron — a nova variante do SARS-CoV-2 que foi identificada pela primeira vez na África do Sul — e outras tantas sobre os treze casos a ela ligados detectados até agora em Portugal. Mas apesar das dúvidas e da prematuridade da investigação epidemiológica, a directora-geral da Saúde garantiu, em entrevista ao PÚBLICO ao fim da tarde desta segunda-feira, que até à data as infecções estão circunscritas ao “local de trabalho” e que não se pode afirmar que há transmissão comunitária da variante.
Ainda não são conhecidas todas as ligações ao primeiro caso (que foi detectado numa pessoa que terá tido uma viagem recente à África do Sul), pelo que Graça Freitas não arriscou dizer se é possível que esta variante se venha a espalhar rapidamente pelo território nacional. “É impossível prever se haverá disseminação comunitária ou não, a investigação é muito precoce. Os casos identificados até agora foram detectados num contexto particular, num meio laboral, e é possível que se criem ligações, mas ainda não se pode dizer que há disseminação comunitária. O que há é um surto localizado”, disse a responsável da Direcção-Geral da Saúde.
Questionada sobre se esta variante poderá exigir que sejam tomadas outras medidas, Graça Freitas avançou que o que está a ser feito nesta altura tem um “carácter temporário” e não passam de “medidas de precaução”. “Não sabemos muitas coisas sobre esta variante, não sabemos exactamente como se propaga, com que velocidade, não sabemos a gravidade, não sabemos se vai ter capacidade de escapar às vacinas ou não. Há algumas incógnitas e quando as incógnitas são maiores, fazemos um reforço da investigação epidemiológica, mas não quer dizer que sejam medidas definitivas”, apontou.
O plano, para já, é alargar a rede de contactos dos casos positivos (começou-se pelos contactos mais próximos) e intensificar a testagem para impedir que se criem cadeias de transmissão e que haja propagação da nova variante e da doença, trabalho que está a cargo das autoridades de saúde regionais (Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo) e locais (agrupamentos de centros de saúde). Há um plano de testagem previsto de três testes: um que é feito na hora, para perceber se a pessoa está infectada, outro feito ao quinto dia e um terceiro realizado ao décimo dia.
"Temos mais informação do que tínhamos há dois dias"
A directora-geral da saúde assegurou ainda que Portugal tem capacidade para detectar novos casos desta estirpe uma vez que o país já foi capaz de iniciar este mesmo processo com outras variantes, como a Delta.
“Estamos a falar de um caso em que não sabemos se a variante se está a disseminar no mundo porque é mais transmissível ou se se está a disseminar porque as pessoas viajam e porque isto é um vírus respiratório. Pode haver aqui estes dois fenómenos, mas é cedo para sabermos se é mais rápida na transmissão do que a Delta. Há redes de vigilância em todo o mundo que farão esse trabalho. É uma variante de preocupação, mas que ainda está em observação. Qualquer conclusão será prematura”.
Graça Freitas não quis avançar mais detalhes sobre o suposto primeiro caso em Portugal já que a situação epidemiológica “está a ser novamente aprofundada e revista”. “Temos mais informação do que tínhamos há dois dias, não só sobre a nova variante, como sobre a evolução dos testes que têm sido feitos às pessoas. Vamos esperar mais uns dias que possamos tirar conclusões”.
Até agora, nenhum outro caso foi identificado dentro dos círculos sociais das treze pessoas que estão infectadas. Quer os jogadores quer os membros técnicos da equipa estavam vacinados contra a covid-19. As pessoas que estão infectadas estão a ter uma “evolução favorável” e algumas delas são mesmo assintomáticas, algo que a directora-geral classificou como “muito boa notícia” numa entrevista que deu à SIC Notícias na manhã desta segunda-feira. A pessoa que teve uma viagem recente à África do Sul é a única que já terá estado infectada com a covid-19 numa ocasião anterior, segundo disse a responsável da DGS.
Graça Freitas também não quis concretizar quantos contactos estão neste momento em isolamento profiláctico, mas avançou que há a possibilidade de pessoas do Belenenses SAD, do ambiente familiar e social destes 13 casos poderem ter de o fazer. “Serão algumas dezenas de pessoas. São treze casos e cada caso pode ter contactos em várias esferas e em vários níveis”, apontou a directora-geral.
E voltou a descartar qualquer responsabilização das autoridades de saúde na realização do jogo de sábado entre o Benfica e o Belenenses SAD, que terminou por causa da inferioridade numérica do Belenenses. “Neste caso particular dos eventos desportivos, não há intervenção das autoridades de saúde no encerramento, adiamento, o que for. As autoridades de saúde isolam casos e procedem à identificação de contactos. Depois, as entidades desportivas é que verificam se há condições para haver jogos ou não”, explicou.
Jogadores do Benfica já foram testados
A directora-geral disse ainda que as pessoas que estiveram em jogo não eram contactos de risco – caso contrário não teriam jogado. Apesar de este não ser o protocolo “habitual”, os jogadores do Benfica também já foram testados nesta segunda-feira por uma questão de precaução.
“Não há, à partida, indicação para isolamento excepto em alguma situação que tenha sido considerada como tal, porque estes jogadores foram contactos de contactos. Não foram contactos de casos positivos, tanto quanto se sabe até à data. É diferente ter contacto com um doente do que ter contacto com um contacto de um doente”, disse.
Sobre a necessidade de se acelerar a vacinação contra a covid-19 nos países onde a escassez de vacinas ainda é um problema, Graça Freitas referiu que Portugal tem feito muitas doações, nomeadamente aos países de língua oficial portuguesa, mas também afirmou que “todos os países deviam ter as mesmas oportunidades”.
“Somos dos países que mais tem colaborado nestas doações, quer directamente a países quer nos mecanismos europeus que existem para tal. Mas acho que todos os países deviam ter as mesmas oportunidades de se vacinar e que deviam aproveitar essas oportunidades porque a vacinação é o mecanismo mais potente para minimizar os efeitos do vírus na doença grave, internamento e morte. O que se desejaria é que todas as populações de todo o mundo estivessem vacinadas ou tivesse acesso a vacinas. O bem de um é o bem de todos nós. Ninguém está seguro enquanto todos não estivermos seguros”.
Dias de angústia no Belenenses SAD
Houve um nome que saltou rapidamente para a ribalta quando soaram os alarmes de covid-19 no plantel do Belenenses SAD: Cafu Phete, médio sul-africano que regressou recentemente do país de origem, onde foi detectada a mais recente variante do vírus. Foi ele a ponta do novelo puxado nos últimos dias, ainda que a triagem tenha sido feita antes e depois da viagem.
De acordo com o que o PÚBLICO apurou, Cafu Phete foi submetido a um teste ainda na África do Sul, antes de embarcar, com resultado negativo. E registou o mesmo desfecho à chegada a Lisboa, onde foi novamente testado. Face aos resultados, foi dado como apto para o treino com o restante plantel e jogou mesmo diante do Caldas, no dia 21, para a Taça de Portugal.
O dia-a-dia do Belenenses SAD correu normalmente até à passada sexta-feira. Pelas 15h30, um dos jogadores da equipa principal dirigiu-se ao departamento médico com queixas de vómitos e sintomas de febre. Dado o quadro clínico, foi feito um teste antigénio e o resultado foi positivo, colocando todo o universo do clube em alerta. Nesse mesmo dia, foi reunido todo o plantel e todos os elementos foram testados, tendo sido detectados outros 14 casos positivos, a maioria dos quais sem sintomatologia.
O jogo com o Benfica estava agendado para o dia seguinte e, salvaguardada desta onda de possível contágio, estava a equipa de sub23, que habitualmente trabalha num espaço distinto do da formação principal. O plano de contingência foi activado, a delegada regional de saúde contactada e a lista de contactos entregue por volta da meia-noite, para que fossem tomadas as medidas sanitárias devidas.
Já no sábado, por iniciativa do clube, foi feita uma ronda completa de testes PCR. Desta sequência resultaram várias confirmações de casos positivos (um dos quais o de Cafu Phete), tendo então sido retirados quatro elementos do regime de isolamento. Mas o quadro definitivo só seria integralmente divulgado às 19h13, a cerca de uma hora do início da partida. Foi nesta altura que, face aos elementos forçados pelas autoridades de saúde a cumprirem isolamento profiláctico, depois de cruzados os resultados dos testes PCR e antigénio, o Belenenses SAD concluiu que só teria nove jogadores disponíveis, dois dos quais guarda-redes.
Além da questão desportiva, a preocupação com a saúde dos futebolistas estendeu-se ao Benfica, que, pela voz do presidente, Rui Costa, fez saber que iria levar o caso muito a sério, até porque na sexta-feira, há um derby com o Sporting já agendado, relativo ao campeonato. Nesse sentido, os “encarnados” agilizaram mais uma ronda de testes, realizados ontem, sendo que, ao que foi possível apurar, não existirão casos positivos em nenhum dos cerca de 80 elementos testados, entre jogadores, equipa técnica e staff.
A Organização Mundial de Saúde (OMS), que já classificou a Ómicron como “variante de preocupação”, já recomendou aos seus estados-membros acções prioritárias que aumentem o nível de prontidão na resposta à nova variante, como alertas precoces e planos de mitigação nos sistemas de saúde. A nova estirpe já foi identificada em vários países, entre estes Espanha, Reino Unido, Bélgica, Canadá, Suécia, Austrália e Botswana.