As perguntas pop-up de Basir Mahmood no Porto/Post/Doc

O artista paquistanês galardoado com o Prémio Paulo Cunha e Silva propõe uma instalação para perguntar onde está o cinema. Um de oito horas para ver no Passos Manuel esta quinta-feira.

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Espaço de Cinema para o Ar Entrar e Circular — ora aqui está um título que faz pensar, sobretudo quando sobreposto ao que descreve: uma sequência de seis curtas-metragens assinadas por Basir Mahmood (n. 1985), artista paquistanês, exibidas em loop de entrada gratuita ao longo de oito horas na sala do Passos Manuel, quinta-feira, 25, a partir das 16h, no âmbito do Porto/Post/Doc. E fica lançada a questão: porque é que é preciso criar um espaço de cinema para mostrar filmes? Ou para mostrar estes filmes? 

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Espaço de Cinema para o Ar Entrar e Circular — ora aqui está um título que faz pensar, sobretudo quando sobreposto ao que descreve: uma sequência de seis curtas-metragens assinadas por Basir Mahmood (n. 1985), artista paquistanês, exibidas em loop de entrada gratuita ao longo de oito horas na sala do Passos Manuel, quinta-feira, 25, a partir das 16h, no âmbito do Porto/Post/Doc. E fica lançada a questão: porque é que é preciso criar um espaço de cinema para mostrar filmes? Ou para mostrar estes filmes? 

A questão é premente nestes nossos tempos em que as fronteiras se diluíram ao ponto de haver grande cinema que não chega ao grande ecrã e coisas que nem cinema é a ocupar as salas. Não se pode dizer que Basir Mahmood ajude — mas o artista não é um facilitador de auto-ajuda, antes um “agente provocador” que tem um estranho fascínio pela história do cinema paquistanês e um prazer quase perverso em perscrutar os intervalos “entre” eventos. All Voices Are Mine (2018) não faz outra coisa que não seja registar mo(vi)mentos intercalares, Manmade (2010) contrapõe os movimentos de um homem a vestir-se ao retrato final dele vestido, Power Between Weak (2014) são retratos da tensão de olhares e julgamentos em quietude. E coisas tão banais como vestir uma camisa ou descascar uma banana ganham um outro poder pela atenção concentrada que a câmara dá a estes rostos, a estas mãos. 

É claríssimo que muitos destes filmes, com as suas estruturas programáticas e abstractas, onde é preciso a “folha de sala” ou a etiqueta descritiva para revelar a real extensão do pensamento do artista e o alcance simbólico, não são obras narrativas, nem correspondem à ideia que muita gente faz de um “filme”. Muitos deles têm inclusive qualquer coisa de expositivo no modo como se organizam, como se fossem pensados para estarem suspensos numa parede. Alguns funcionam perversamente segundo uma lógica de ocultar o seu centro vital — acontece em Death, More than Once (2020) e Sunsets, everyday (2020) onde o processo de repetição de uma acção, mostrada de ângulos diferentes, deixa sempre de fora o que realmente está a ser feito. O objecto da filmagem torna-se não o acto em si, que nos é ocultado, mas aqueles que o praticam, e o modo como o praticam. Ao fazê-lo, Mahmood pergunta-nos não apenas como vemos o que nos mostra mas, sobretudo, o que (não) vemos no que nos mostra. 

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cortesia porto/post/doc

Espectador activo

Ao criar este espaço de cinema pop-up para os exibir, Mahmood transfere o acto contemplativo, desacelerado, que a visão num ambiente museológico implica para o espaço activo de uma sala onde habitualmente se pede aos espectadores que se deixem levar pela narrativa. Não é um embate ou uma colisão  o museu e o cinema implicam sempre um espectador activo  mas antes uma experiência repleta de curiosidade e questionamento: vamos ver o que daqui sai.

Tudo isto, confesse-se, faz mais sentido em abstracto do que na prática. É muito difícil para um público ocidental apreender todo o contexto (social, cultural, político) que se esconde por trás destes filmes, cuja abstracção  fria, cerebral  corre o risco de derrapar na curiosidade exótica que continua a ser uma das maneiras por “defeito” de ver o que nos vem da Ásia. Mesmo que Mahmood seja um artista “ocidentalizado”, com um pé no Paquistão e outro na Holanda, e que chegue ao Porto/Post/Doc aureolado de ter sido em 2020 um dos finalistas e vencedores do Prémio Paulo Cunha e Silva para jovens artistas em ascensão, Espaço de Cinema para o Ar Entrar e Circular não escapa às limitações do que se propõe fazer — mas talvez também não o quisesse. 

O que esta peculiar instalação — ainda por cima feita num espaço multifacetado como o Passos Manuel, que é cinema, bar, discoteca — nos diz é que são mais interessantes as perguntas que Basir Mahmood faz do que as respostas que nos propõe com os seus filmes. E isso já é qualquer coisa.