É preciso acabar com os preconceitos em relação ao ensino profissional
Será um grave erro persistir na ideia de encaminhar os alunos com notas mais baixas para a frequência dos cursos profissionais, como se fosse um “castigo”.
Muito há ainda a fazer para alterar a representação social do ensino profissional. Foi já percorrido um caminho favorável a esse novo olhar, mas há quem continue a percepcionar esta oferta formativa na óptica do velho paradigma que colocava o ensino regular versus o ensino profissional, como se este último fosse irregular ou de segundo plano.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Muito há ainda a fazer para alterar a representação social do ensino profissional. Foi já percorrido um caminho favorável a esse novo olhar, mas há quem continue a percepcionar esta oferta formativa na óptica do velho paradigma que colocava o ensino regular versus o ensino profissional, como se este último fosse irregular ou de segundo plano.
No passado, tivemos um problema com o ensino técnico, conotado com um ramo de ensino para pobres e alunos “fracos”. Demorámos mais de duas décadas a desfazer este anátema, graças à qualidade do trabalho produzido pelas escolas profissionais privadas e, ultimamente, graças ao investimento aplicado no desenvolvimento do ensino profissional em todas as escolas públicas.
O que a investigação nos demonstra é que, em relação ao ensino “clássico e humanista”, o ensino técnico e profissional apresentava uma génese estigmatizante, dadas as diferenças de conteúdos, os objectivos finais e os grupos sociais então frequentadores.
Como destaca Martins, Pardal e Dias (2005, p. 80), “esta correspondência entre necessidades do sistema económico e os conteúdos a transmitir aos alunos tendia a ser bastante linear e utilitarista excluindo-se a transmissão de saberes humanísticos que preparassem para a cidadania e muito menos para a formação de elites”. Na prática, o que se verificava era uma “frequência quase em exclusivo do ensino humanista pelas classes aristocrática e da alta burguesia, estando o ensino técnico e profissional adstrito às classes populares urbanas ou às classes rurais de maiores aspirações (…)”.
Será um grave erro persistir na ideia de encaminhar os alunos com notas mais baixas para a frequência dos cursos profissionais, como se fosse um “castigo” para eles; ou desvalorizar o ensino profissional e as profissões a que permite aceder classificando-as, à partida, como se fossem socialmente menos consideradas. Será um erro a pagar caro no futuro.
A este preconceito podemos associar a imagem de um certo “facilitismo”, que não corresponde, de todo, à realidade. A carga horária do ensino profissional é superior a três mil horas, nos três anos de frequência do curso.
Em 2018/19, encontravam-se inscritos no ensino profissional 115.981 alunos, em mais de mais de 6000 ofertas formativas. Só no território continental, cerca de 110 mil jovens frequentavam esses cursos, mais do que no início da década – um claro sinal de recuperação da reputação e de valorização social desta via de ensino. A formação em contexto de trabalho é vista como um dos factores de estímulo à empregabilidade. Segundo dados do Observatório de Estudantes à Saída do Secundário, cerca de 49,7% dos alunos do ensino profissional integraram o mercado de trabalho após terminarem os seus cursos.
A Comissão Europeia estima que cerca de metade dos futuros empregos irão requerer um “nível médio de qualificação”, o que reforça o papel que o ensino profissional desempenha neste caminho, visto que essa qualificação será alcançada através de uma formação profissionalizante.
Esta opção formativa dos jovens implica maiores níveis de exigência e responsabilidade no sistema educativo, o que reclama, entre outros aspectos, a assunção de uma cultura de avaliação global e continuada do sistema, abrangendo as escolas, os professores, os alunos, os funcionários, os empregadores e demais partes interessadas externas.
É neste contexto que se insere a necessidade de uma aposta na avaliação e na qualidade do ensino profissional, como forma de orientar as actuações pedagógicas, promover a excelência, distinguir as boas práticas e melhorar o modelo de gestão, a eficiência da organização e a eficácia na obtenção dos resultados, visando a criação de ambientes favoráveis à inovação.
Compreende-se, pois, que a certificação com o Selo de Qualidade EQAVET (acrónimo de European Quality Assurance Reference Framework for Vocational Education and Training) das escolas profissionais tenha por objectivo não só a análise de diagnóstico, que é encarada sobretudo com um sentido instrumental, mas e acima de tudo a identificação de oportunidades de correcção das anomalias detectadas e de uma afectação mais direccionada e eficaz dos recursos necessários à qualificação da educação em Portugal.
A certificação com o selo evidencia que o ensino ministrado nas escolas profissionais se encontra alinhado com as políticas europeias, nacionais, regionais e locais para a Educação e Formação Profissionais.
O Quadro de Referência Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e Formação Profissionais EQAVET foi concebido para melhorar o ensino e formação profissionais no espaço europeu, colocando à disposição das autoridades e dos operadores ferramentas comuns para a gestão da qualidade, promovendo a confiança mútua, a mobilidade de trabalhadores e de formandos e a aprendizagem ao longo da vida.
Este selo funciona como uma garantia de que o ensino ministrado é de qualidade, executando acções de melhoria resultantes da monitorização constante de indicadores como o abandono precoce, a conclusão do curso, a empregabilidade, o prosseguimento de estudos, etc.. É assim um instrumento fundamental para a gestão, baseado numa cultura de melhoria da qualidade e da responsabilidade ao nível do sistema e dos operadores de ensino e formação profissionais.
Compete às escolas profissionais submeter a avaliações externas o que de melhor fazem, garantindo desta forma o reconhecimento da qualidade do seu ensino e das suas boas práticas.