Armando Vara à saída da cadeia: “Estive a cumprir uma pena por crimes que não cometi”
Antigo governante beneficiou de perdão motivado pela pandemia cuja manutenção tem sido alvo de controvérsia. Continua a declarar-se inocente.
Libertado esta segunda-feira da cadeia de Évora depois de ter cumprido metade da pena a que foi condenado no processo Face Oculta, o antigo ministro socialista e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos Armando Vara continua a declarar-se inocente.
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Libertado esta segunda-feira da cadeia de Évora depois de ter cumprido metade da pena a que foi condenado no processo Face Oculta, o antigo ministro socialista e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos Armando Vara continua a declarar-se inocente.
“Estive a cumprir uma pena de dois anos e nove meses por crimes que não cometi”, afirmou à saída do estabelecimento prisional. Para ficar em liberdade, o antigo governante beneficiou do perdão dado aos reclusos a quem já só faltam dois anos para o cumprimento total da pena, ao abrigo do combate à pandemia de covid-19. O facto de esta lei ainda se manter em vigor apesar de a esmagadora maioria dos reclusos estar vacinada tem gerado controvérsia.
Recordando que até agora os tribunais sempre lhe negaram saídas precárias especiais ou a antecipação da liberdade condicional, alegando que “ninguém compreenderia que, tendo eu sido condenado por crimes cometidos no exercício de funções públicas, viesse a não cumprir uma pena agravada”, Armando Vara encara este desfecho como uma espécie de prova da sua inocência: “Como fica provado pelo despacho de libertação nunca cometi nenhum crime no exercício de funções públicas nem aquilo de que era acusado foi por causa das funções que exercia. É caso para dizer que a justiça cumpriu simplesmente a lei”. E conclui dizendo que se sente “completamente ilibado”.
Armando Vara estava preso desde 16 de Janeiro de 2019, depois de ter sido condenado por tráfico de influência a cinco anos de prisão no âmbito do processo Face Oculta. Ficou provado que recebeu 25 mil euros do sucateiro Manuel Godinho, o principal arguido no caso, em troca do favorecimento das suas empresas.
“Era preciso convencer a opinião pública de que eu tinha cometido crimes muito graves. Porque só crimes muito graves é que levariam a que uma pena não superior a cinco anos não tivesse sido suspensa”, observou esta segunda-feira o antigo governante, à porta do tribunal. “Estou livre, acabou. Agora não quero falar mais desses assuntos”. Mas deixa uma promessa: “Vou escrever sobre isso, como é evidente. O que está neste processo são coisas absurdas, inventadas”.
Os seus problemas com a justiça não findam, no entanto, aqui. O antigo ministro socialista foi sentenciado, em Julho passado, por lavagem de dinheiro na Operação Marquês a uma pena efectiva de dois anos de prisão. Na altura, o seu advogado, Tiago Rodrigues Bastos, disse que ponderava recorrer da sentença, por considerar que ela “está cheia de moralismo, mas não respeita o direito”.
Em causa neste processo estão rendimentos de 535 mil euros que Armando Vara fez circular entre a Suíça, as Seychelles, Chipre e a Irlanda, com a ajuda do gestor de fortunas Michel Canals, e que disse sempre terem origem licita, embora tenha assumido em tribunal uma fuga aos impostos que sabia que um dia teria de resolver.
Os juízes acreditarem na origem lícita deste dinheiro – que não será, afinal, proveniente nem de corrupção nem de tráfico de droga, por exemplo – mas consideraram muito elevado o grau de culpa do arguido, até pelas funções que desempenhou ao longo da vida, quer como governante, primeiro, quer depois como administrador da CGD e, mais tarde, do BCP. “Exerceu as mais altas funções e ganhava num ano aquilo que a maioria dos cidadãos não ganha em mais de uma década de trabalho”, observou o magistrado que presidiu ao colectivo, Rui Coelho,