Supremo da Inglaterra confirma que líder do Dubai espiou ex-mulher com o programa Pegasus
A vigilância ocorreu durante a luta pela custódia dos filhos do casal – numa ocasião terão sido descarregados 265 megabites de dados. Também foram seleccionados como alvos cinco pessoas do seu círculo, nomeadamente uma advogada e membro da Câmara dos Lordes.
O Supremo Tribunal da Inglaterra confirmou que o líder do Dubai e vice-primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos, o xeque Mohammed bin Rashid al-Maktoum, mandou espiar o telemóvel da ex-mulher, a princesa Haya bint al-Hussein da Jordânia, através do programa Pegasus da empresa israelita NSO. A vigilância, ocorrida em 2020, representa um “total abuso de poder” e “de confiança”, além de violar a lei penal do Reino Unido, notou um juiz.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O Supremo Tribunal da Inglaterra confirmou que o líder do Dubai e vice-primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos, o xeque Mohammed bin Rashid al-Maktoum, mandou espiar o telemóvel da ex-mulher, a princesa Haya bint al-Hussein da Jordânia, através do programa Pegasus da empresa israelita NSO. A vigilância, ocorrida em 2020, representa um “total abuso de poder” e “de confiança”, além de violar a lei penal do Reino Unido, notou um juiz.
O telemóvel de Haya foi vigiado onze vezes em Julho e Agosto do ano passado durante a luta pela custódia dos filhos do casal com a “autoridade expressa ou implícita” do xeque.
Numa dessas ocasiões, 265 megabites de dados foram descarregados – o equivalente a 24 horas de dados de gravação digital de voz ou a 500 fotografias. O acesso à informação ocorreu durante um período “particularmente agitado e financeiramente interessante nestes procedimentos, com o aumento das sessões relacionadas com as reivindicações financeiras da mãe para si e para os filhos”, contextualizou o juiz e presidente da divisão familiar do tribunal, Andrew McFarlane.
A batalha legal pela custódia estende-se desde 2019, quando Haya fugiu com os dois filhos para o Reino Unido, temendo pela sua segurança depois de uma filha do xeque ter tentado fugir do Dubai. Desde então, Haya “tem vivido com medo pela sua vida e pela segurança das crianças” devido a uma campanha de “intimidação”, disse a sua equipa legal.
Porém, mais cinco pessoas do círculo da princesa foram espiadas ou alvo de tentativas de vigilância, referiu o tribunal. Entre eles estão os dois advogados de Haya – uma delas é Fiona Shackleton, membro da Câmara dos Lordes – e dois dos seus seguranças. A sua identificação, no entanto, não significa que os seus aparelhos tenham sido espiados.
“Estas descobertas representam um total abuso de poder” e “de confiança”, disse McFarlane. O juiz reforçou a crítica ao emir, referindo-se à vigilância como “uma série de violações da lei penal interna [do Reino Unido]” e uma “interferência no processo deste tribunal e ao acesso da mãe à justiça”.
Acusações de espionagem
A decisão de McFarlane, divulgada esta quarta-feira, confirma parte da investigação levada a cabo por um consórcio internacional de órgãos de comunicação, da Amnistia Internacional e da Forbidden Stories, o chamado projecto Pegasus, que analisou a lista de milhares de números identificadas para serem potencialmente comprometidos pelo software com o mesmo nome, da NSO.
O programa espião, segundo a empresa israelita desenvolvido para fins militares, infiltra-se nos aparelhos sem ser necessária uma acção como carregar num link por parte do utilizador. Um dos números identificados foi o da princesa Latifa, que tentou fugir do Dubai em 2018, mas sem sucesso, receando-se que esteja detida. Al-Maktoum tem negado qualquer conhecimento sobre a espionagem realizada com o recurso ao programa Pegasus da NSO.
Contudo, o especialista em tecnologia William Marczak, investigador no Citizen Lab da Universidade de Toronto, apoiou no seu depoimento a decisão do tribunal: concluiu não ter dúvidas sobre a infiltração do Pegasus nos smartphones por um único operador.
O julgamento salientou ainda que “as acusações de espionagem foram apresentadas perante o tribunal num momento em que já tinham surgido graves relevações contra o pai”, nomeadamente sobre as acusações de rapto e cativeiro de duas filhas, Latifa e Shamsa.
Num outro julgamento de McFarlane, foi revelada uma tentativa por parte de agentes do emir de adquirir uma propriedade ao lado da residência de Haya. Em resposta, o juiz ordenou a criação de uma zona de exclusão de 100 metros em torno da sua propriedade e um perímetro aéreo de exclusão de cerca de 305 metros para proteger a princesa do xeque e dos seus agentes.