No seu último discurso, Medina deixa alertas contra o crescente “radicalismo e populismo”

A cerimónia do 5 de Outubro foi o último grande acto protocolar de Fernando Medina enquanto autarca de Lisboa, depois de ter perdido a sua reeleição para Carlos Moedas.

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No seu último discurso enquanto presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina deixou recados aos sucessores e fez uma leitura do estado da política nacional e dos valores republicanos e democráticos, que devem ser “renovados, actualizados e fortalecidos”. O autarca lisboeta cessante citou Raul Proença para apelar à pedagogia cívica e exercício do espírito crítico e assinalou que se atravessa “um tempo complexo e contraditório da história​”.

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No seu último discurso enquanto presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina deixou recados aos sucessores e fez uma leitura do estado da política nacional e dos valores republicanos e democráticos, que devem ser “renovados, actualizados e fortalecidos”. O autarca lisboeta cessante citou Raul Proença para apelar à pedagogia cívica e exercício do espírito crítico e assinalou que se atravessa “um tempo complexo e contraditório da história​”.

“Valores civilizacionais que nos habituámos a dar como garantidos e incontestados são hoje perigosamente, estridentemente, postos em causa nas democracias”, incluindo em Portugal, disse Fernando Medina, admitindo que, ainda que “muito minoritárias”, estas vozes “aproveitam e exploram as fragilidades que todos os sistemas políticos e todas as sociedades têm, não para corrigir e aperfeiçoar o que está mal, mas para procurarem enfraquecer a democracia nos seus fundamentos”, prosseguiu.

O autarca cessante lamentou a “projecção desproporcionada” que lhes é conferida na “sociedade do espectáculo” e deixou recados aos “democratas”.

“É nestes momentos cruciais que se exige aos democratas que tenham uma consciência clara do que está em causa e não cedam à chantagem demagógica e ao ‘ar do tempo'”, caindo na funesta armadilha de responder à radicalização e ao populismo com radicalização e populismo”, avisou Fernando Medina, sem se referir a qualquer partido. "Não há radicalismo nem populismo que sejam bons para a democracia. Ambos são, pelo contrário, o caminho para a desagregação colectiva”, avisou.

Logo a seguir, apelou à convergência entre os democratas, vincando ser “fundamental” que todos “saibam aquilo que os une além daquilo que legitimante os diferencia”.

Numa câmara que terá dez vereadores à esquerda (7 do PS, 2 da CDU e 1 do BE) e 7 vereadores à direita, Medina pediu que todos “tenham presente quais são os problemas reais” e que “o debate político se centre, com seriedade e consistência, nas grandes questões nacionais e não se transforme numa disputa de decibéis e manchetes para cuja conquista vale tudo”.

Traçando mais metas nacionais do que locais, Medina listou “a melhoria da qualidade da democracia e da participação política dos cidadãos, o défice de qualificações, o reforço da competitividade e da produtividade da economia, a modernização da sociedade, a redução da pobreza e das desigualdades, a redefinição actualizadora das políticas públicas, as reformas que reforcem o acesso a direitos fundamentais, como o direito à habitação, sobretudo nos centros urbanos, à saúde e à justiça, o envelhecimento, o lugar de Portugal na Europa e no Mundo” como prioridades para o país.

Resumidamente, “o exemplo de união que, em Lisboa e em todo o país” foi dado durante o combate à pandemia deve continuar, pois importa “recuperar o país e ajudar os que ficaram mais debilitados e fragilizados”.

Sem falar em carros (ou ciclovias), tema que marcou também a campanha autárquica em Lisboa, Medina assinalou também a sua preocupação com as alterações climáticas como “imperativo moral” de “mobilizar os cidadãos, vencendo hábitos instalados”. Nesta matéria, o "facilitismo, o adiamento e a demagogia são crimes” e por isso é um "o combate que nos deve unir e que não podemos interromper, adiar ou abrandar”.

Medina também recordou as palavras de Jorge Sampaio, em 2005, e insistiu na necessidade de “fazer frente às ameaças de regressão e retrocesso, construindo um futuro mais livre, mais próspero e mais justo”.

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Carlos Moedas deverá assumir o seu mandato a 18 de Outubro Nuno Ferreira Santos

O autarca despediu-se do cargo que desempenhou durante seis anos, “um tempo de grande plenitude pessoal e política”.

Carlos Moedas presente

“Não tenho muito a acrescentar, mas tenho a minha presença”, resumiu à chegada Carlos Moedas, presidente eleito da Câmara de Lisboa, assinalando a dignidade da transferência de poder de Fernando Medina.

No seu derradeiro acto protocolar enquanto presidente da Câmara de Lisboa, o autarca cessante recebeu o primeiro-ministro, António Costa, o Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

No ano passado, a cerimónia decorreu de forma restrita por causa da pandemia de covid-19. Esta terça-feira, a cerimónia regressa ao salão nobre do edifício dos Paços de Concelho e não ao ar livre, na Praça do Município, devido aos cuidados pandémicos.

A cerimónia arrancou às 11h, com a força em parada da GNR a prestar continência a Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente dirigiu-se para a varanda do salão nobre, onde, coadjuvado pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, procedeu ao ato solene do hastear da bandeira nacional, ao som do hino nacional executado pela Banda da Guarda Nacional Republicana.