Pandora Papers: Transparência Internacional diz que se deve acabar com cultura de offshores
Investigação revela que 35 líderes mundiais e mais de 330 políticos e funcionários públicos, de 91 países e territórios, esconderam fortunas de milhares de milhões de dólares para não pagarem impostos.
A Transparência Internacional Portugal considerou uma “feliz coincidência” que a investigação sobre paraísos fiscais Pandora Papers tenha sido divulgada poucos dias depois da fuga da justiça do antigo presidente do BPP João Rendeiro, “que tinha offshores em seu nome”.
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A Transparência Internacional Portugal considerou uma “feliz coincidência” que a investigação sobre paraísos fiscais Pandora Papers tenha sido divulgada poucos dias depois da fuga da justiça do antigo presidente do BPP João Rendeiro, “que tinha offshores em seu nome”.
“É uma feliz coincidência que os Pandora Papers tenham rebentado poucos dias depois de sabermos, por exemplo, que João Rendeiro fugiu da justiça e que era sabido que tinha offshores em seu nome. Isto prova que a questão dos offshores continua a ser preocupante, e que permite a criminosos e a corruptos conseguirem esconder os seus activos, e, quando precisam, fazerem uso disso para se protegerem e para manterem os seus estilos de vida como se nada fosse”, afirmou a presidente da direção daquela associação, Susana Coroado, em declarações à Lusa.
O Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla em inglês) publicou este domingo uma nova investigação, chamada Pandora Papers, na qual revela que 35 líderes mundiais (actuais e antigos) e mais de 330 políticos e funcionários públicos, de 91 países e territórios, esconderam fortunas de milhares de milhões de dólares para não pagarem impostos.
Segundo o jornal Expresso, que faz parte do consórcio, há três portugueses envolvidos: os antigos ministros Nuno Morais Sarmento e Manuel Pinho e o advogado e antigo deputado socialista Vitalino Canas.
Em relação aos três portugueses envolvidos, Susana Coroado escusou-se a tecer comentários, salientando que “cada história dos três políticos portugueses é diferente”, e, “se calhar, nos próximos dias irá saber-se mais pormenores sobre isso”.
A pesquisa efectuada pelo Expresso revela que Nuno Morais Sarmento, actualmente vice-presidente do PSD, foi o beneficiário de uma companhia offshore registada nas Ilhas Virgens Britânicas que serviu para comprar uma escola de mergulho e um hotel em Moçambique; Vitalino Canas teve uma procuração passada para actuar em nome de uma companhia, também registada nas Ilhas Virgens Britânicas, para abrir contas em Macau; e Manuel Pinho era o beneficiário de três companhias offshore e transferiu o seu dinheiro para uma delas quando quis comprar um apartamento em Nova Iorque.
Os três portugueses na lista dos Pandora Papers prestaram esclarecimentos ao Expresso. Morais Sarmento justifica o acesso a uma companhia offshore com as “limitações” aos estrangeiros existentes na altura em Moçambique, Manuel Pinho diz não ter “nenhum rendimento por declarar às autoridades fiscais seja de onde for” e Vitalino Canas assegura que o caso referido se insere na prática de advocacia “nos termos da lei portuguesa”.
Offshores não devem servir como “bonecas russas"
A presidente da direção da Transparência Internacional Portugal salientou que “é preciso melhorar os registos de beneficiários efectivos, para que as offshores não sirvam como bonecas russas que vão escondendo a identidade dos seus verdadeiros titulares”.
“É preciso que todos os países comecem a ter registos e que eles comecem a funcionar. Portugal tem, mas não funciona bem”, afirmou.
Além disso, sublinhou, “é preciso também fazer uma pressão maior sobre os intermediários”.
A responsável recordou que “as offshores não são possíveis se não existirem intermediários como contabilistas, advogados, etc, que as criam”.
“Todos estes escândalos têm provado isso mesmo, porque são informações que têm vindo a público precisamente através dessas empresas de intermediação que são revelados”, disse.
Para Susana Coroado, “é fundamental que os reguladores e que as autoridades nacionais exerçam pressão sobre os intermediários e que se acabe com esta cultura de criar e este branqueamento na comunicação e junto da opinião pública, que repete constantemente que ter uma offshore não é ilegal”.
“Se é verdade que ter uma offshore não é ilegal, aquilo que temos visto é que têm mais prejuízos do que benefícios para o interesse público, porque costumam estar sempre associadas a evasão fiscal, a branqueamento de capitais, ocultação de riqueza. É preciso combatê-las de forma dura e eficaz”, defendeu.
Entre os nomes referidos na investigação Pandora Papers, estão o rei Abdallah II da Jordânia, o primeiro-ministro da República Checa, Andrej Babis, e o Presidente do Equador, Guillermo Lasso, revela a investigação, publicada em órgãos de informação como The Washington Post, BBC e The Guardian.
A investigação revela ainda novos detalhes sobre importantes doadores estrangeiros do Partido Conservador do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, e detalha actividades financeiras questionáveis do “ministro oficioso de propaganda” do Presidente russo, Vladimir Putin.
O círculo próximo do primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan, é denunciado por ter escondido milhões de dólares em empresas e entidades externas.
Também o Presidente queniano, Uhuru Kenyatta, e seis membros da sua família são denunciados por deterem, em segredo, pelo menos 11 empresas no estrangeiro, uma das quais avaliada em 30 milhões de dólares.
O ICIJ diz ter baseado a sua investigação numa “fuga sem precedentes”, envolvendo cerca de dois milhões de documentos, trabalhados por 600 jornalistas, a “maior parceria da história do jornalismo”.