França quer fazer cimeira para discutir estratégia da UE para o Indo-Pacífico
A definição da estratégia de defesa europeia será um dos pontos fortes do programa francês, que inclui a realização de uma cimeira UE-África.
Tentar encaminhar a União Europeia (UE) para definir uma estratégia para a região do Indo-Pacífico será uma das apostas da presidência francesa do Conselho da União Europeia, que se inicia em Janeiro, e deverá ser o foco de uma cimeira europeia que poderá realizar-se em Fevereiro, apurou o PÚBLICO.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Tentar encaminhar a União Europeia (UE) para definir uma estratégia para a região do Indo-Pacífico será uma das apostas da presidência francesa do Conselho da União Europeia, que se inicia em Janeiro, e deverá ser o foco de uma cimeira europeia que poderá realizar-se em Fevereiro, apurou o PÚBLICO.
A região do Indo-Pacífico é prioritária para os interesses norte-americanos, mas os países da UE não se têm conseguido alinhar para traçar uma estratégia de parceria com os Estados Unidos naquela região. É também uma zona onde a Europa tem interesses comerciais e estratégicos, e um ponto quente da situação geopolítica – por exemplo por causa de Taiwan, um território a cuja independência a China gostaria de pôr fim.
Se os Estados Unidos puseram esta região no topo das suas prioridades, para a Europa tem continuado a parecer um pouco distante de mais. Mas a falta de definição europeia em relação a este palco geopolítico faz com que os EUA não pensem na UE como um aliado natural para intervir no Indo-Pacífico, dizem fontes diplomáticas europeias.
França sofreu na pele o que isso pode representar quando, já neste mês de Setembro, se viu no papel de elo mais fraco, ao ser anunciada a nova parceria AUKUS, entre a Austrália, Reino Unido e Estados Unidos. O anúncio desta nova aliança levou a Austrália a deixar cair um contrato que tinha firmado em 2016 com a empresa francesa Naval Group, no valor de 31 mil milhões de euros, para a renovação da sua frota de submarinos. No âmbito do AUKUS, os parceiros da Austrália vão dotar o país de submarinos nucleares.
Durante a presidência francesa da União Europeia, a partir de 1 de Janeiro de 2022, Paris quer investir em garantir que a UE se torne o aliado forte desejado pelos EUA, reforçando as capacidades de defesa europeias. Num teatro de operações em que os EUA se envolvam, por exemplo no Indo-Pacífico, qual será o papel da Europa? Washington precisa de ter clareza sobre isso.
Daí que outro ponto forte previsto da presidência francesa da UE seja a realização de uma cimeira sobre a defesa. Os ministros da Defesa da UE concordaram já que a crise no Afeganistão, por exemplo demonstrou a necessidade de reforçar a capacidade e disponibilidade para agir de forma coordenada – a força de intervenção rápida europeia anda em discussão há bastante tempo, sem que tenha avançado. O episódio do AUKUS veio reforçar a urgência da definição de uma resposta coordenada de defesa da UE. França, apurou o PÚBLICO, quer tornar clara para os seus parceiros europeus que é a própria definição da relação transatlântica que está em jogo.
Um dos aspectos difíceis de resolver para que haja um posicionamento europeu relativamente à região do Indo-Pacífico é a relação dos países da UE com a China. A União Europeia considera que a China é um parceiro mas também um rival sistémico, o que cria ambiguidade e permite que diferentes países tenham diferentes relações com Pequim. A China tira proveito de todos estes matizes diplomáticos e comerciais, na falta de uma resposta coordenada europeia.
A presidência francesa da UE tem marco inamovível quase a meio – as eleições presidenciais francesas, que têm a primeira volta a 10 de Abril e a segunda a 24 de Abril, a meio da presidência. Por isso, Paris vai tentar concentrar o máximo da agenda antes do escrutínio.
Isso é o que deverá acontecer com a cimeira UE-África que está prevista. Esta deveria já ter-se realizado em 2020, mas foi adiada por causa da pandemia.
Na agenda estão temas como a segurança no Sahel – a França terminou em Junho o fim da operação Barkhane, que mantinha 5100 soldados franceses nos países conhecidos como G5 (Burkina Faso, Chade, Mali, Mauritânia e Níger) para lutar contra grupos jihadistas. O fim da missão militar não pôs no entanto fim ao envolvimento de França na região, e, entretanto, em Julho foi criada a missão europeia Takuba, em que participam nove países (incluindo Portugal) e tem França como país coordenador.
A situação sobretudo no Mali continuou a complicar-se – houve um golpe de Estado militar em Maio – e o actual Governo fala em contratar os serviços da empresa de mercenários russos Wagner para se proteger de avanços de grupos jihadistas, justificando-se com o fim da missão militar francesa. Contra esta empresa há, no entanto, múltiplas acusações de abusos e violações dos direitos humanos.
A jornalista viajou a convite do Ministério da Europa e dos Negócios Estrangeiros de França