A fechar um pequeno livro, a edição portuguesa de Últimos Escritos de Pier Paolo Pasolini, Alberto Moravia documenta a sua visita ao local onde Pasolini fora assassinado, num texto que parece um guião para a viagem de vespa de Nanni Moretti no fecho da primeira parte de Querido Diário (1995). O lugar inóspito em Ostia, ao largo da antiga cidade portuária e do parque arqueológico, preenchido por terrenos poeirentos e barracas cercadas a arame farpado, lembrou a Moravia uma periferia do Médio Oriente, um subúrbio africano ou asiático. Uma miséria e um desespero inscritos num lugar de onde emanava violência, traduzida num espancamento com uma tábua de madeira (colhida no local) e concluído com um atropelamento. Se o escritor se permite especular que o assassinato, devido à violência extrema, foi um acto de ódio autoinfligido, resultado de uma identificação do assassino com aquele homem e com aquele corpo, talvez seja de relevar a ideia, que abre o texto de Moravia, de que aquele acto de horror era antes uma expressão de uma ideia de Pasolini, de que a piedade, a piedade na relação religiosa com o real, teria soçobrado perante o avanço da cultura de consumismo e que podíamos antever aquele assassinato nos seus romances ou na sua primeira longa-metragem, Accattone (1961), adaptação do seu próprio romance Una Vita Violenta (1959), em que a narrativa realista da periferia de Roma no pós-guerra era protagonizada por jovens marginais e amorais mas tocados ainda pelo humanismo de quem persegue a redenção.
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A fechar um pequeno livro, a edição portuguesa de Últimos Escritos de Pier Paolo Pasolini, Alberto Moravia documenta a sua visita ao local onde Pasolini fora assassinado, num texto que parece um guião para a viagem de vespa de Nanni Moretti no fecho da primeira parte de Querido Diário (1995). O lugar inóspito em Ostia, ao largo da antiga cidade portuária e do parque arqueológico, preenchido por terrenos poeirentos e barracas cercadas a arame farpado, lembrou a Moravia uma periferia do Médio Oriente, um subúrbio africano ou asiático. Uma miséria e um desespero inscritos num lugar de onde emanava violência, traduzida num espancamento com uma tábua de madeira (colhida no local) e concluído com um atropelamento. Se o escritor se permite especular que o assassinato, devido à violência extrema, foi um acto de ódio autoinfligido, resultado de uma identificação do assassino com aquele homem e com aquele corpo, talvez seja de relevar a ideia, que abre o texto de Moravia, de que aquele acto de horror era antes uma expressão de uma ideia de Pasolini, de que a piedade, a piedade na relação religiosa com o real, teria soçobrado perante o avanço da cultura de consumismo e que podíamos antever aquele assassinato nos seus romances ou na sua primeira longa-metragem, Accattone (1961), adaptação do seu próprio romance Una Vita Violenta (1959), em que a narrativa realista da periferia de Roma no pós-guerra era protagonizada por jovens marginais e amorais mas tocados ainda pelo humanismo de quem persegue a redenção.