Os bacharéis não foram extintos!

A Ordem dos Engenheiros Técnicos é a única Ordem da área da Engenharia que admite os titulares de todos os graus académicos em Engenharia (bacharéis, licenciados, mestres ou doutores).

Foto
Autor do artigo | Pedro Brás, presidente do Conselho da Profissão da Ordem dos Engenheiros Técnicos (OET)

No entanto, existe um problema com os bacharéis que é muito urgente resolver. 

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

No entanto, existe um problema com os bacharéis que é muito urgente resolver. 

E que problema é esse?

​​Em 2005, com o processo de Bolonha, foram alteradas as designações dos graus académicos no Ensino Superior, deixando de ser conferidos os graus então existentes (bacharel, licenciado, mestre e doutor), e foram criados três novos graus (que se passaram a designar de licenciado, mestre e doutor).

A percepção da maioria das pessoas é que o grau de bacharel foi extinto, mas isso não é verdade. O que aconteceu em 2006 foi que, tanto ao nível dos objectivos como da duração, o primeiro ciclo do ensino superior que se denominava bacharelato passou a denominar-se licenciatura. Mas o grau não foi extinto.

Se olharmos para o “espírito de Bolonha”, que propõe a organização do Espaço Europeu de Ensino Superior em três ciclos de estudos, percebemos que o grau que esta transformação eliminou não terá sido o de Bacharel. E para fins profissionais nunca foi feita a equiparação entre os graus pré e pós-Bolonha. É este o problema!

O processo de Bolonha foi transformador porque alterou um paradigma centrado na transmissão de conhecimentos, centrando-o no desenvolvimento de competências. E não está demonstrado que um bacharelato proporcione menos competências do que uma licenciatura pós-Bolonha. 

Na OET, do ponto de vista da profissão, Bacharel ou Licenciado pós-Bolonha têm as mesmas competências e podem praticar os mesmos actos de engenharia. E nós temos a convicção de que mais de 80% dos actos de engenharia podem ser realizados por um titular do 1º ciclo (seja ele Bacharel ou Licenciado).

E porque é que isso é um problema?

Para os Bacharéis, o problema é ser exigido o grau académico de Licenciado na carreira de técnico superior na «Lei geral do trabalho em funções públicas», no «Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado» e nas «Entidades Públicas Empresariais», o que cria injustiças tremendas. 

Em primeiro lugar, um Bacharel é liminarmente excluído do acesso à carreira de técnico superior na função pública (a menos que já lá esteja) porque não tem o grau de licenciado. 

Em segundo lugar, um bacharel que esteja na carreira de Técnico Superior da Função Pública nunca poderá aceder a um cargo dirigente nos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, porque os concursos continuam a requerer “licenciados”. 

No entanto, um licenciado pós-Bolonha pode aceder a qualquer um dos cargos, mesmo que seja recém-licenciado. 

A resposta mais frequente quando colocamos esta questão é: «Não é possível atribuir um grau académico administrativamente. Voltem à escola e façam a licenciatura». E, assim, milhares de bacharéis voltaram à escola para obterem um grau académico equivalente ao que já possuíam, só porque essa equiparação para fins profissionais não foi feita. 

A OET até incentiva o regresso à escola (um pilar da reforma de Bolonha) para melhorar competências e capacidades. Mas o que eu pergunto é: porque é que uma pessoa detentora do 1º ciclo do ensino superior (que à data se chamava de «bacharelato») tem que voltar à escola para obter um 1º ciclo do ensino superior (que hoje se denomina de «licenciatura»)? 

Será que as competências que agora se adquirem nas licenciaturas pós-Bolonha são superiores às que as que se adquiriam nos bacharelatos? Não são.

A voltarem à escola, que seja para realizarem um mestrado ou um doutoramento, nunca para obterem um grau equivalente ao que já possuem.

Eu acho isto um absurdo e é inaceitável o que está a ser feito aos bacharéis. Como é possível que, passados 47 anos sobre o 25 de Abril, ainda persista uma certa percepção de que os bacharéis são “pessoas menores”?

Este é um problema que só ocorre com os bacharéis. Mesmo que alguns tentem “aproveitar a boleia”, a questão para os outros graus não se coloca de forma tão premente como para os bacharéis. Este é o problema que temos que resolver urgentemente. 

Então, como resolver esse problema?

A equiparação dos graus, tout court, seria provavelmente incomportável para o Orçamento do Estado. Mas era o que deveria ser feito.

Aquilo que propomos é a clarificação de que o bacharelato é igual à licenciatura pós-Bolonha nos concursos de ingresso na carreira de Técnico Superior, e nos concursos de acesso a cargos dirigentes da Função Pública. 

É só alterar a Lei e, em vez de se requerer como habilitação mínima de acesso a “Licenciatura”, deveria ser requerido o “1º ciclo do ensino superior” (que abrange bacharelato e licenciatura pós-Bolonha). E depois que seja o mérito das candidaturas a determinar quem ganha os concursos. 

É tão simples!

Esta proposta, que não custa 1 cêntimo ao Orçamento do Estado, elimina as injustiças com que os bacharéis são confrontados. 

É que o bacharelato deixou de ser conferido em 2006, mas os bacharéis não foram extintos! São pessoas. Estão vivas, a trabalhar, e a ser lesadas há 15 anos!...


A opinião emitida neste artigo é da exclusiva e inteira responsabilidade do seu autor.