“As mulheres afegãs não se esconderão, não teremos medo”, dizem, das redes sociais para o mundo

Nas redes sociais, as mulheres afegãs não ficam em silêncio, e escrevem, de Cabul para o mundo. “Nunca reconheceremos este presidente, nunca reconheceremos este ‘governo’. Nunca nos sujeitaremos ao regime terrorista.”

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Mulher afegã queima uma burqa, num protesto em frente à sede da ONU, em Barcelona EPA/Quique Garcia

Na manhã seguinte, Aisha acordou com gritos e disparos à porta de casa. “O caos acabou de começar”, escreveu, na madrugada de 16 de Agosto, a partir de Cabul. Com a cidade dominada pelos taliban, Aisha Khurram, de 22 anos, teme não poder terminar os estudos em Relações Internacionais. “Alguns professores despediram-se das suas alunas enquanto todos eram retirados da Universidade de Cabul”, relatou, no Twitter. “Sinto-me dormente. A nossa história ainda não acabou. Os afegãos não merecem isto.”

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Na manhã seguinte, Aisha acordou com gritos e disparos à porta de casa. “O caos acabou de começar”, escreveu, na madrugada de 16 de Agosto, a partir de Cabul. Com a cidade dominada pelos taliban, Aisha Khurram, de 22 anos, teme não poder terminar os estudos em Relações Internacionais. “Alguns professores despediram-se das suas alunas enquanto todos eram retirados da Universidade de Cabul”, relatou, no Twitter. “Sinto-me dormente. A nossa história ainda não acabou. Os afegãos não merecem isto.”

Após a tomada do poder pelos taliban, é possível imaginar um recuo na lei para a eliminação de violência contra mulheres no Afeganistão. Podem ser impedidas de estudar, trabalhar, sair de casa sem burqa (véu completo com uma pequena rede na zona dos olhos) ou sem um acompanhante masculino. Em caso de incumprimento das regras, os castigos podem tornar-se brutais, como acontecia durante o antigo Emirado Islâmico do Afeganistão​, entre 1996 e 2001.

Numa entrevista à televisão estatal, Enamullah Samangani, membro da comissão cultural do grupo, afirmou que “no quadro da lei islâmica”, os taliban estão “preparados para garantir que as mulheres possam estudar e trabalhar”. Contudo, não é claro o que consideram estar de acordo com a sharia (lei islâmica), e o que significa um novo “regime islâmico”.

Na terça-feira, 17 de Agosto, as afegãs mostraram-se sem medo de resistir aos taliban, organizaram uma manifestação na capital e reuniram-se na rua com cartazes que pediam que não “eliminassem as mulheres” da vida pública. “O trabalho, a educação e a participação política são direitos de todas as mulheres”, diziam, segundo traduz, no Twitter, o correspondente da NBC News, Richard Engel. 

Em oposição aos “fundamentalistas”, a Associação Revolucionária de Mulheres do Afeganistão assegura: não voltarão a usar burqa, num gesto de resistência. Na Internet, tornam-se virais as publicações de mulheres afegãs que rejeitam o governo dos taliban. Não aceitam ficar em silêncio, e pedem que o mundo que assiste também não fique. 

Sahraa Karimi, 35 anos, cineasta

“É de manhã. A manhã é mais escura que a noite. Uma manhã de desespero, num mundo de dor”, escreveu a cineasta afegã Sahraa Karimi no Twitter, na madrugada de 16 de Agosto, após os taliban entrarem em Cabul. Sahraa, de 35 anos, diz ter ficado paralisada ao perceber quão facilmente o mundo pode recuar. “Pessoas deste grande mundo, por favor não fiquem em silêncio, eles vieram para nos matar.”

Fatima Naimi, 20 anos, estudante

Nas redes sociais, multiplicam-se as mensagens de apelo ao não-reconhecimento dos taliban como um poder legítimo. “Nunca reconheceremos este presidente, nunca reconheceremos este ‘governo’, nunca reconheceremos esta bandeira. Nunca nos sujeitaremos ao regime terrorista”, promete Fatima Naimi, de 20 anos, estudante de Política e Relações Internacionais, em Londres.

Zarlasht Halaimzai, 39 anos, fundadora da Refugee Trauma Initiative

A infância de Zarlasht Halaimzai foi passada na guerra, em Cabul. Aos 11 anos, foi forçada a deixar a sua casa, e só quatro anos depois encontrou estabilidade para recomeçar a própria vida, no Reino Unido. Três décadas mais tarde, assiste ao regresso do caos à cidade natal. “Ainda não consegui falar sobre o Afeganistão porque estou num estado de trauma. Sinto o meu corpo tremer e contrair para tentar dar resposta ao perigo. Mas o perigo está a quilómetros de onde estou.”

Heela Najibullah, 45 anos, investigadora na área de migrações e conflitos

“Tornámo-nos desenraizados, deslocados, migrantes, requerentes de asilo, refugiados, ilegais, feridos, dormentes, traumatizados, mas continuamos a lutar pela sobrevivência com todas as nossas forças.” As palavras de resistência são de Heela Najibullah, que, aos 14 anos, abandonou o país onde nasceu, presidido pelo pai, Mohammad Najibullah. Najibullah foi afastado do poder em 1992, e assassinado pelos taliban em 1996, quando tomaram Cabul pela primeira vez.

Muska Dastageer, professora de Ciência Política

Muska Dastageer, professora universitária em Cabul, tenta descrever o medo: sente-o como um pássaro negro que se senta dentro do peito. Quando abre as asas, torna-se impossível respirar. “Os afegãos estão fartos de ser vítimas. As mulheres afegãs não se esconderão, não teremos medo. O mundo inteiro olha para o Afeganistão, para Cabul, para os taliban e para o que eles fazem.”