Na terra a que fores ter, come como vires comer (ou talvez não)
As terras onde vamos ter, para as habitar ou temporariamente, como peregrinos ou turistas, são espaços de encanto que podemos conhecer também pela alimentação. A identidade alimentar local é uma das bases da cultura local e a cultura faz-se também de alimento. Fluxos vivos que acompanham os tempos.
Conhecer um local pelo que comem as pessoas que lá habitam é um dos modos mais autênticos de o conhecer. Pelo modo como as pessoas comem, podemos descobrir ingredientes desconhecidos, quer porque são realmente específicos e únicos daquele lugar, quer porque ali o usam como alimento.
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Conhecer um local pelo que comem as pessoas que lá habitam é um dos modos mais autênticos de o conhecer. Pelo modo como as pessoas comem, podemos descobrir ingredientes desconhecidos, quer porque são realmente específicos e únicos daquele lugar, quer porque ali o usam como alimento.
Por detrás dos modos de conservar, preparar e combinar apreendemos a resiliência e pela cozinha deciframos a história, criatividade e a arte, a cultura: respiramos a identidade.
Pelo modo como as pessoas de um local comem, reconhecemos a mobilidade, o mapa dos que por ali passaram e os outros locais que aquelas pessoas habitaram. As influências e as sobrevivências, as características dos solos e o clima. Os acessos e as vizinhanças.
Ir à procura do mercado local e das feiras, ir à lota, ao talho, às pequenas mercearias, padarias e aos restaurantes. Olhar as paisagens e identificar nelas os elementos alimentares. Procurar as ruas residenciais e identificar os odores. Todos estes são pontos turísticos imprescindíveis para conhecer aquilo que, e como, comem as pessoas das terras onde vamos ter. Depois, provar e saborear. Pedir todos os pratos típicos e tradicionais. Comprar as variedades únicas de fruta, feijão ou cereal, o peixe, a carne e o pão. Ir à procura dos doces, das receitas antigas e de quem as guarda como tesouros e todas as semanas se aventura na alquimia da sua cozinha mais ou menos industrial, para que do papel a receita continue a passar para a mesa. Delícias para marcar os sentidos e incrustar na memória os sabores que tornam cada uma das terras onde chegamos distintas.
As terras onde vamos ter, para as habitar ou temporariamente, como peregrinos ou turistas, são espaços de encanto que podemos conhecer também pela alimentação. A identidade alimentar local é uma das bases da cultura local e a cultura faz-se também de alimento. Fluxos vivos que acompanham os tempos.
Nestes tempos que vivemos é um tesouro raro encontrar terras onde as pessoas comam com identidade, terras onde a oferta alimentar e turística se baseie naquilo que seria o distintivo dos seus sabores. São tesouros as terras cujos mercados ainda são mercados e neles estão os produtores que ainda produzem alimento nas mesmas terras da terra onde o vendem. As rendas dos mercados expulsam muitas vezes os produtores para o seu exterior, para as ruas e para a beira das estradas. Neles ficam os revendedores, transformando o mercado num lugar onde é preciso decifrar os produtos efectivamente locais. Para não falar nas terras que transformam mercados noutros centros culturais ou de outras ofertas alimentares.
É um tesouro chegar a uma terra onde nas cartas dos restaurantes se encontre pratos tradicionais com ingredientes também eles tradicionais, que sirvam à mesa o espaço real onde estão, que ofereçam a possibilidade de provar o que é único das cozinhas das famílias daquele lugar.
E um tesouro maior é chegar a uma terra onde as suas iguarias gastronómicas, doces, vínicas e/ou de matéria-prima se encontram no seu estado genuíno. Doces típicos, pães e broas, vinhos e enchidos sem aditivação e sem as adaptações hiper industrializadas.
Se à terra onde fores ter, os espaços, paisagens e medidas políticas te permitirem conhecer a alimentação típica desse lugar, encontraste um tesouro e, aí, come como vires comer.